Brasil propõe aliança com a Argentina para dar força aos lácteos

14/10/2010 10:58

Em vez de buscar conter a inundação do mercado pelo soro e pelo leite em pó argentinos, que vêm agravando o déficit na balança comercial do setor, agora quer se associar ao país vizinho para organizar exportações conjuntas. Os líderes brasileiros decidiram adotar a nova postura três semanas atrás e, no último dia 7, reuniram-se em Buenos Aires com representantes do Centro da Indústria Leiteira da Argentina para definir linhas de ação. Na prática, será necessário criar um banco de oferta, com informações sobre os produtos disponíveis, e realizar negociações conjuntas com os importadores.

Aproximação – Se o acordo vai funcionar, só a prática vai dizer. Por enquanto, o que muda é que o país se aproxima da concorrência. O principal argumento do presidente da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva de Leite e Derivados do Brasil, Rodrigo Alvim, é que, juntos, Brasil e Argentina são responsáveis por 7% da produção mundial desse alimento – algo em torno de 40 bilhões de litros ao ano. No começo das discussões, o setor ficou com um pé atrás. No entanto, com a possibilidade de financiar projetos de exportação com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do Banco de La Nación, reunidos em um fundo a ser instituído nos próximos meses, a resistência foi quebrada. Agora o clima é de otimismo.

Industrialização – Entre julho de 2009 e junho deste ano, o Brasil industrializou 20,42 milhões de litros de leite, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Mas o potencial do rebanho nacional seria muito maior. A produção por vaca, atualmente na média de 1,27 mil litros ao ano, poderia passar de 5 mil, dizem os especialistas. Porém, é na Argentina que a produção está aumentando. A captação subiu 8% só em agosto, conforme os dados oficiais.

Déficit – O Brasil enfrenta, pelo segundo ano consecutivo, déficit na balança comercial dos lácteos. Em 2010 a situação é pior que em 2009. A importação de janeiro a setembro foi US$ 99 milhões superior à exportação – valor comparado ao déficit dos 12 meses do ano anterior. O volume de lácteos importados até diminuiu, caiu de 106 mil (2009) para 79 mil toneladas (2010) nos primeiros nove meses de cada ano. Porém, o valor dos alimentos estrangeiros que entraram no país é maior, passou de US$ 205 milhões para US$ 215 milhões, respectivamente. O recuo está relacionado ao real forte ante o dólar. O quadro da balança comercial se agravou porque as exportações recuaram de 54 mil para 43 mil toneladas, ou de US$ 130 milhões para US$ 117 milhões, na mesma base de comparação.

Paraná – O Paraná, que planejava ampliar mercado com vendas ao exterior em 2008, não consegue sair do chão. No primeiro semestre, as exportações foram de apenas 953 mil quilos ou R$ US$ 3,8 milhões, conforme estudo do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).

Custo – Os produtores do país vizinho têm custo menor e os brasileiros só têm condições de competir quando há impostos excessivos na concorrência, diz a analista Sílvia Digiovani, agrônoma que atua na Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep). “Com essa política cambial, não tem condição de o produtor brasileiro competir em preço com o argentino de igual para igual. Só temos alguma chance porque eles pagam mais para o governo”, avalia.

Cota – Por enquanto, a principal arma que o Brasil tem usado para evitar a quebra do setor leiteiro é a imposição de cota para a importação de leite em pó da Argentina. O limite de 3 mil toneladas ao mês, definido em 2009, teve prazo estendido neste ano. “O leite argentino atinge o mercado do Sul do Brasil, principalmente o do Rio Grande do Sul”, afirma Bruno Luck, assessor técnico para o setor do leite na Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Ele diz que a importação de produtos como doce de leite e queijos finos é bem menos representativa.

Acordo deve ser concluído apenas em 2011

A exportação conjunta de produtos lácteos de Brasil e Argentina deve começar no segundo semestre de 2011. A estimativa foi feita pela coordenadora geral de Desenvolvimento de Programas de Apoio às Exportações do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), Cândida Cervieri, após reunião entre representantes do setor, na semana passada, em Buenos Aires.O presidente da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva de Leite e Derivados, Rodrigo Alvim, relata que a parceria está sendo alinhavada desde agosto e que o grupo voltará a se reunir para discutir a proposta de cooperação na segunda quinzena de novembro em Brasília.

Processo – “Criar uma plataforma de exportação é um processo melindroso. É importante não ter pressa, fazer tudo de forma certa para não precisar alterar depois. Mas demos um passo importante na semana passada. Geralmente essas reuniões ocorrem para tentar regular, travar ou moralizar mercados. Mas nessa a conversa foi amena, focada na convergência de interesses e avaliando mercados e oportunidades. Acho que foi uma ótima reunião”, avalia Alvim.

Somar esforços – Segundo ele, brasileiros e argentinos estão convencidos que somar esforços é a melhor maneira para ganhar eficiência e romper barreiras em um mercado tão protegido como o dos lácteos. “A Argentina tem mercado mais consolidado para o queijo. O Brasil, para o leite em pó e o leite condensado”, cita Cândida.

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