Estádios vazios, gol ‘mais perdido do mundo’ e calor assombram o Qatar

03/12/2010 12:16

Vencedor da disputa para ser sede da Copa do Mundo de 2022, o Qatar ocupa a 113ª posição no ranking da Fifa. Mas não é apenas a pouca tradição no futebol que chama a atenção do futuro anfitrião da competição. Estádios vazios na maioria das partidas da liga nacional, lances bizarros do time olímpico, o forte calor que vai castigar o local no período do Mundial e até mesmo a tentativa de naturalizar brasileiros para defender as cores da seleção nacional chamam a atenção do país.

Na última quinta-feira(02), em Zurique, na Suíça, o Qatar foi escolhido pela Fifa para receber o Mundial de 2022. E é justamente o pouco interesse dos torcedores nas partidas locais que gerou uma preocupação do comitê organizador. Apesar disso, na opinião do técnico Caio Júnior, comandante do atual tricampeão nacional Al Gharafa, o público de uma Copa é diferente do torcedor do dia a dia do país.

– O público de uma Copa é diferente. Muitos torcedores chegam de outros países para assistir ao Mundial e é isso que vai acontecer aqui no Qatar. Teremos os torcedores locais, mas o país irá receber muitos turistas de Copa – afirmou o treinador, que chegou ao país em julho de 2009.

Como a Fifa determina que os estádios tenham capacidade entre 40 mil e 80 mil torcedores, o comitê organizador do Qatar sugeriu uma construção em módulos. Assim, a proposta é que, depois da Copa, algumas arenas tenham suas capacidades reduzidas para se adequarem às demandas locais. O projeto prevê ainda que os módulos sejam utilizados em outros países.

O presidente do comitê organizador, o sheik Mohammed bin Hamad Al-Thani, comentou o projeto inovador do Qatar para a construção das arenas que serão utilizadas no Mundial.

– Nada de elefantes brancos. Os módulos poderão ser aproveitados até por outros países depois do Mundial – afirmou o sheik.

Mas o futuro dos estádios não é a única preocupação dos organizadores do Mundial. A qualidade técnica dos jogadores do país também mete medo nos dirigentes. Há duas semanas, o atacante Khalfan Fahad, da seleção olímpica, protagozinou um dos lances mais bizarros dos últimos tempos. Após passar pelo goleiro do Uzbequistão, em partida válida pelos Jogos da Ásia, o jogador conseguiu acertar a trave dos rivais já dentro da pequena área. O lance virou motivo de chacota em várias partes do mundo e até mesmo no Qatar.

– Esse lance foi comentado de uma forma curiosa, com ironia. Aposto que também foi feito no Brasil. Foi uma situação anormal e levamos com muito bom humor – disse Caio Júnior.

Em 2004, a federação local tentou iniciar uma estratégia polêmica para reforçar a seleção: convidar jogadores de outros países para se naturalizarem e defender o Qatar. Um dos alvos foi o brasileiro Aílton, atacante que se destacava no futebol alemão (Werder Bremen e Schalke). Everson e Dedê também foram cotados. Porém, a ideia esbarrou nas leis da Fifa, que exigem que o atleta atue há pelo menos cinco anos no país. Recentemente, um outro brasileiro acabou defendendo a seleção do Qatar: o meia Fábio Montezine, que chegou à liga nacional em 2005 e atualmente defende o Al Rayyan (time treinado por Paulo Autuori).

Na 113ª posição do ranking da Fifa, a seleção do Qatar empatou em 1 a 1 com a Arábia Saudita em sua última partida realizada, em 28 novembro. Dez dias antes, um dia depois de organizar o amistoso entre Brasil e Argentina em Doha (vitória dos hermanos por 1 a 0), o Qatar perdeu em casa por 1 a 0 para o fraco Haiti.

Outro ponto que assusta a Fifa é o forte calor que vai castigar o país durante a Copa do Mundo. Em junho e julho, meses do Mundial, a temperatura no país gira em torno de 50 graus. Os estádios e os campos de treinamento, de acordo com o comitê organizador do Qatar, serão climatizados. Os termômetros nos locais não passarão de 23 graus.

– A tecnologia para climatizar os estádios já existe. Durante a inspeção da Fifa, eles foram em um campo de treinamento que já contava com o sistema de refrigeração, alimentado por energia solar. A temperatura padrão que locais são mantidos beiram os 23 graus, mas podem chegar até 19 graus – afirmou Luciana Ceccato Farah, que mora no Qatar há cinco anos e ingressou no comitê organizador por falar português.

Segundo Caio Júnior, durante o Mundial, dificilmente os torcedores vão conseguir circular normalmente pela cidade por conta do forte calor. É justamente por isso que o governo do Qatar está iniciando a construção do metrô, que terá uma parte subterrânea e outra pela superfície. A ideia é que os fãs façam o percurso hotel-estádio pelo transporte público sem deixar de transitar por um local climatizado (confira no final da matéria o mapa do projeto do metrô).

– Os visitantes não vão circular pelas ruas. Ele vai sair do hotel, entrar no metrô e chegar ao estádio. A volta será a mesma coisa. A ideia dos organizadores é essa – afirmou o treinador.

Na opinião de Caio Júnior, um outro ponto precisa ser estudado pelos organizadores do evento para o sucesso do Mundial.

– A questão de espaço me preocupa. É um país pequeno, que vai receber uma grande quantidade de pessoas. A Copa aqui vai ser num espaço como como o de Curitiba ou de Belo Horizonte. O Mundial será praticamente todo disputado em apenas uma cidade. Realmente não consigo imaginar como isso será controlado, como será o trânsito por aqui – disse.

E por último, a liberação de bebidas alcóolicas em um país árabe também esbarra na religião. Para alguns, elas não serão liberadas. Mas, segundo um membro do comitê organizador, os estrangeiros já estão podendo consumir normalmente no país. Anteriormente, apenas em hotéis e locais específicos a venda estava liberada.

Para vencer a disputa para ser sede da Copa de 2022, o Qatar venceu a Austrália, os Estados Unidos, a Coréia do Sul e o Japão. Para Zico, embaixador da campanha nipônica, a escolha ocorreu pelo poder de investimento do país do Oriente Médio.

– A escolha do Qatar foi pelo poderio econômico. É um país que não tem tradição no futebol. Os Estados Unidos organizaram uma bela Copa e tem feitos boas campanhas nos Mundiais. O Japão e a Coréia, que tem feito boas participações em Mundiais, e até mesmo a Austrália levaria vantagem sobre o Qatar – disse Zico.

Agora, resta saber se nos próximos 12 anos, o Qatar conseguirá melhorar a qualidade técnica de sua seleção ou realizar todos os projetos que desenvolveu para receber a Copa. Dinheiro para cumprir a missão não falta. Mãos à obra.

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