06/12/2015 14:29
– Ordem! Ordem! Meu caro senhor, vou lhe pedir que nos poupe de detalhes sórdidos
– Eu vou pedir que o senhor repita essa última afirmação. Mas vou pedir que o senhor o faça em voz bem alta para que todos possam ouvir.
– A pessoa citada já começava o dia consumindo glúten e lactose.
– Um momento. O senhor tem certeza de que era logo cedo?
– A pessoa citada acordava e já caía de boca num pãozinho com manteiga, num café com leite e…
– O senhor tem certeza de que não era margarina e de que o leite não era da nova geração sem lactose?
– Manteiga gorda e com sal. Leite tipo A, integral, extraído de vacas leiteiras. Vacas gordas e leiteiras que soltam peidos devastadores o dia todo. E ele mergulhava aquele pão lambuzado dentro do café com leite e aquelas rodelas de gordura se formavam…
– Tumulto, gritaria, uma senhora desmaia.
– Ordem! Ordem, por favor! Meu caro senhor, eu vou lhe pedir que nos poupe dos detalhes sórdidos. Acredito que todos já estamos convencidos e os fatos e as fotos provam que o senhor realmente conviveu ao lado de um facínora, um sujeito de hábitos hediondos… podemos dar uma olhada na selfie que o meliante tirou na frente de um risoto preparado no interior de um enorme queijo parmigiano reggiano?
– A foto é projetada na sala do grande júri. E, mais uma vez, desmaios sucedem-se e gritos de protesto e fúria.
– Apedrejem o pulha!
– E se o senhor me permite acrescentar, com esse risoto a pessoa citada detonou uma garrafa de vinho e se o senhor continuar permitindo que eu conte tudo, antes do risoto e do vinho ele fez uma degustação de embutidos. Salame, presunto, culatello, mortadela…
– Basta! Eu vou voltar a insistir que o senhor talvez esteja se deixando levar por uma forte emoção. O senhor sentia raiva desse ser?
– Muita. Principalmente porque o palhaço… desculpa, mas eu não consigo me conter.
– Adiante.
– O palhaço confessava-se feliz, sorria enquanto cometia essas atrocidades.
– Que coisa insana! Eu pergunto como é que alguém, em sã consciência, pode fatiar um salame, colocar dentro de um pão lotado de glúten, levá-lo até a boca e… sorrir. Onde nós vamos parar?
– Espero que essas pessoas sejam retiradas do convívio social.
– Pois você pode acreditar que estamos trabalhando para isso.
por Marcio Alemão em Carta Capital