A agropecuária nas agruras da economia

08/01/2016 16:45

Há que se usar o tom dos analistas de catástrofe, em seu convencionalismo interesseiro; daí ser impossível não incluir o ramo da agropecuária nos problemas do Brasil

Os agronegócios, mesmo o setor primário dentro dele, a agropecuária, quando tratado em perspectiva para um período mais longo, como agora com o ano de 2016, só vale com o desempenho dos grãos “visto assim do alto”.

Quando é assim, usar a lupa só nos levará a encontrarmos as mesmas mazelas perpetuadas em séculos.

Vale dizer: há que se usar o tom neurastênico dos analistas das folhas e telas cotidianas, em seu convencionalismo interesseiro. Daí ser impossível não incluir o setor nas atuais agruras das economia e política brasileiras.

Peguemos o que mais reverbera nessa fase “brrrrrrrr, mas que nervoso estou”.

Há duas safras tem-se conhecimento de que a produção norte-americana de grãos se recuperou e fez os estoques finais aumentarem. Foi quando começou a queda nos preços de soja, milho e trigo. Era o óbvio.

O que faz, então, o analista de catástrofes? Recua 36 meses, até dezembro de 2012, pega o pico dos preços altos com estoques à beira da escassez e diz que as cotações caíram 37,4%, 47,5% e 38,6%, respectivamente.

Pois bem, deixa de citar que, nos últimos 36 meses a relação dólar-real, praticamente, dobrou, 100% a favor das verdinhas.

Além do que, se avançarmos dois anos no recuo, e tomarmos os últimos 12 meses, veremos quedas menores. Na mesma sequência, 15%, 12% e 21%. Então, o grosso da queda já passou e alguns sinais mostram potencial reequilíbrio.

“Bem, pois é, sei não … A China, parece, perdeu o apetite”.

A China pode ser, os chineses não, gordos que estão até para padrões norte-americanos. O Estado chinês passa por momento de ajustes estruturais para se adequar a taxas de crescimento mais modestas, que não podiam continuar em dois dígitos. Até porque a situação da economia global não mais permitia.

Essa não é tarefa fácil em país com tamanha população e complexos sistemas políticos e sociais para os bons (?) moldes ocidentais.

Vejam vocês: a preocupação veio com o primeiro, repito, o primeiro pregão de negociação de contratos futuros de grãos de 2016, na Bolsa de Chicago. Na sequência, fica-se sabendo que, “porém, o país importou mais soja que em 2014”. Isso é que é perda de apetite. Paranaguá, Santos e a balança comercial brasileira estão bem a par do assunto.

“Bem, pois é, sei não … O custo dos insumos invalida o efeito do câmbio”.

Porcaria nenhuma! Em que grau?

Fertilizantes químicos e agrotóxicos, em reais, não dobraram de preços nos últimos três anos. Mantêm-se em níveis pouco mais altos, efeitos da queda na demanda mundial. No planeta, somente o “Bananão” (alô, Ivan Lessa, saudades) continua usando mais do que precisa e dando de ombros para tecnologias naturais, orgânicas, de baixos custos, não dolarizadas, e que permitem redução no uso dos agroquímicos.

As propaladas quedas na demanda, em 2015, de 10% nos fertilizantes químicos e de 25% nos agrotóxicos, poderão até serem benéficas e servir de bom exemplo a renitentes agricultores.

Escrevam aí: terão usado menos, gastado menos e produzido o mesmo ou mais. Alguns fabricantes notarão isso e “quem foi a Portugal perdeu o lugar”, embora Portugal seja uma das regiões mais lindas da Europa.

“Bem, pois é, sei não … Parece que a safra de grãos não vai ser tudo isso. O clima em algumas regiões prejudicou”.

Ô gente chata! Por … caria nenhuma! Entre cereais, oleaginosas e leguminosas (não pensem que esses produtos só servem para exportação, vocês também comem isso, e bastante), segundo o IBGE, o Brasil produziu, em 2015, 210 milhões de toneladas, 8% acima de 2014.

Mesmo com toda a ‘merdaiada’, prognóstico do IBGE feito no mês passado mostra que chegaremos a nível parecido. Resta esperar, na próxima semana, o levantamento da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) para conferir.

Há um alarde, correto, sobre seca prolongada em regiões de Mato Grosso, que prejudicaram bastante aqueles que apostam em plantar mais cedo (setembro e início de outubro). Essa é uma aposta, eles sabem do risco que correm e, geralmente, quando percebem que o truque não dará certo, plantam de novo. Risco é rico, risco também pode ser pobre.

Se valer a pena, volto mais aparelhado ao tema. Se não, pego a lupa.

 

por Rui Daher em Carta Capital
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