02/03/2016 11:15
Senadores chantageiam governo para impor agenda ultraconservadora. Dilma, incapaz de reagir à crise, tenta apenas salvar próprio mandato — e cede. Tarda a surgir alternativa.
Cena 1: o presidencialismo de coalizão
A votação no Senado da PL do pré-sal revelou, em toda crueza, o nível atual do poder presidencial. A presidente está literalmente refém de chantagem política.
Com o enfraquecimento do poder presidencial, três dos mais notórios operadores do Senado – Renan Calheiros, Romero Jucá e José Serra – se uniram para recriar o “centrão” – o grande balcão de negócios que, em alguns momentos de vácuo político no país, é constituído para barganhar favores com presidentes fracos.
O pote de ouro mais disputado é o da flexibilização do sistema de partilha no pré-sal. O recuo de Dilma Rousseff na última hora deveu-se a ameaças explícitas de Renan e Jucá de engrossarem o coro do impeachment.
Com isso conseguiram aprovar no Senado o Projeto de Lei de Serra que não mais obriga a Petrobras a ser operadora de todos os poços, com participação de 30%.
A reação do presidente da Câmara Eduardo Cunha foi imediata, despudorada como todos seus atos públicos, escancarando o leilão: garantiu que irá sepultar a PL do Senado e oferecer aos patrocinadores da mudança o cálice de ouro: a revogação total do sistema de partilha.
Já se chegou a um nível tal que se abre mão até do pudor.
Cena 2: as ações contra Eduardo Cunha
Amanha, dificilmente o STF (Supremo Tribunal Federal) decidirá pelo afastamento de Eduardo Cunha da presidência da Câmara. Apesar da enorme capivara de Cunha, trata-se de medida extrema contra o presidente de outro poder. Segundo avaliações internas do STF, até agora o Procurador Geral da República não logrou apresentar evidências sólidas sobre as interferências de Cunha nas investigações, valendo-se de suas prerrogativas de presidente da Câmara.
É um quadro complicado no qual os negócios políticos adquiriram uma desfaçatez própria da decadência moral que caracteriza os fins de ciclo.
Cena 3: entre a irresponsabilidade de Aécio e a abulia de Dilma
Tem-se uma presidente politicamente manietada, refém do pior fisiologismo do Congresso e incapaz de uma reação. Em posição confortável, os líderes do “centrão” garantirão o mandato de Dilma.
A alternativa a ela é um dos políticos mais medíocres das últimas legislaturas, Aécio Neves, de uma ignorância absurda sobre qualquer tema contemporâneo.
Fica-se, então, nesse dilema político: ou um candidato cuja única palavra de ordem é o discurso do confronto, ou uma presidente cedendo as coroas da corte para não perder o cargo e incapaz de reagir à crise.
Cena 4: a rebelião das corporações
Para completar o mapa, corporações relevantes, como a Polícia Federal, tornaram-se poder dentro Estado, graças ao desempenho de José Eduardo Cardozo, provavelmente o mais fraco Ministro da Justiça da história, não apenas pela falta de autoridade, mas por não ter cumprido nenhuma de suas atribuições em relação aos grandes temas da pasta.
Diz-se que das grandes crises saem as grandes soluções. Até agora nenhuma apareceu no horizonte político. No protagonismo, apenas velhas raposas instruídas na arte da chantagem.
Por Luis Nassif no Blog Luis Nassif OnLine