Análise – Problemas fiscais independem do resultado do impeachment

15/04/2016 15:27

Com ou sem impeachment, resultado fiscal do Brasil seguirá comprometido. Queda na arrecadação e obstáculos no Congresso permanecerão mesmo em eventual mudança na Presidência.

Alguns indicadores econômicos mostraram melhora no último mês, conforme o processo de impeachment ganhou força – o que é visto com otimismo pelo mercado. No entanto, as projeções para o resultado primário fiscal sofreram maior deterioração nas apostas do boletim Focus, do BC (Banco Central).

No início de março, a mediana do relatório de mercado do BC apontava déficit fiscal de 1,30% neste ano e de 0,50% em 2017. No levantamento mais recente, as estimativas pioraram para déficit de 1,60% em 2016 e de 1,10% no próximo ano.

A explicação para isso é que, se a presidente Dilma Rousseff não conseguiu avanços importantes neste campo até agora, dificilmente conseguirá evoluir se continuar no governo. Tampouco a tarefa será mais fácil se cair nas mãos do vice Michel Temer.

“Mesmo que seja uma nova equipe, um novo governo, ainda haverá uma grande dificuldade em reverter a queda da arrecadação e em passar medidas estruturais no Congresso. Aprovar novas medidas não será tarefa fácil”, afirma Bruno Lavieri, economista da 4E Consultoria.

Para Bernard Gonin, analista macroeconômico da Rio Gestão de Recursos, um eventual governo Temer não conseguiria maioria no Congresso. “Não vejo uma recuperação no fiscal. Será um governo não eleito popularmente e com dificuldade de passar medidas fiscais”, explica.

A questão fiscal é tão crítica, aponta Fábio Klein, economista da Tendências Consultoria, que retomar os superávits implica em reformas estruturais que dificilmente serão aprovadas sob a batuta de qualquer presidente neste momento.

“Em linhas gerais, não tem muita mágica. O fiscal é uma situação bastante crítica para qualquer governo que assuma”, diz Klein.

Articulação difícil

A Tendências Consultoria avalia que a polarização política atual limita o poder de agenda da eventual administração Temer. Para a consultoria, as medidas necessárias para colocar a economia nos eixos passam por restrições a direitos, gerando custos para segmentos específicos e um governo com déficit de legitimidade tem menor força na gestão.

A relação entre PMDB e PSDB é central nesse quesito, embora o processo de impeachment una os partidos em certa medida. “Essa euforia inicial, contudo, não deve ser suficiente para manter uma agenda reformista sob transição”, afirma a Tendências, em relatório.

De acordo com a consultoria, há “chances relevantes” de tensão entre os partidos em decorrência da divisão interna entre as legendas e da crise de legitimidade decorrente da Lava Jato.

Na semana passada, em evento em São Paulo, o ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco destacou que as turbulências políticas não cessarão com uma eventual interrupção do mandato de Dilma Rousseff.

“Talvez o mercado esteja subestimando as condições que o PSDB imporia para fazer parte desse governo. No caso do Itamar Franco [vice que assumiu o lugar de Fernando Collor], foi muito natural que a coalizão que apoiou o impeachment o apoiasse. Agora não sei se é a mesma condição”, disse.

Franco destacou que diversos partidos terão “pedidos a fazer” e que o desenrolar do governo dependerá das decisões que Temer, uma vez na Presidência, tome. “A negociação política não será simples”, afirma. “A conversa será parecida com a de hoje: com Congresso fragmentado e maioria meio rala”, destaca.

PIB limitado

O baixo desempenho da economia também contribui para a dificuldade na obtenção de superávits primários. Bruno Lavieri, da 4E Consultoria, explica que a entrada de Temer na Presidência traria otimismo para a confiança do consumidor e de empresários, mas efeitos no desempenho econômico e na arrecadação devem demorar um pouco mais.

“Isso deve dar um pequeno fôlego, mas não é nada que reverterá o ponto em que a economia se encontra”, diz Lavieri, lembrando que parte do déficit é devido à queda na arrecadação de impostos, por sua vez, decorrente da recessão.

O Boletim Focus mais recente estima queda de 3,77% no PIB (Produto Interno Bruto) deste ano e ligeiro crescimento de 0,30% em 2017.

Da Redação com informações de Weruska Goeking, especialista de mercado