Opinião – A judicialização da política na tripartição dos poderes

10/06/2016 12:17

”É inegável a possibilidade dessa “intromissão” outorgada ao Poder Judiciário desde a concepção da Carta Magna de 1988. E isto, vem acontecendo.”

O ativismo judicial tem colocado o Poder Judiciário para dar soluções sociais que deveriam ser de compromisso do poder político. No livro “O Espírito das Leis”, de Montesquieu, a teoria tripartite dos poderes ficou, em tese, sacramentada. Nesta obra, o autor atribui ao Estado, a partição em três esferas de poder: da elaboração das leis (Legislativo), da execução das tarefas (Executivo) e a da aplicação do direito (Judiciário).

O sistema de freios e contrapesos, sugerido pelo autor, é fundamental para estabelecer autonomia e limites a cada poder. Com isto, cria-se a ideia de que só o poder controla o poder. Subdividir as funções do Estado, tem amparo no temor de que o poder não se concentre nas mãos de apenas um órgão, o que poderia dar ensejo à trágicos fins.

Nosso País assiste o fenômeno da judicialização da política, atitudes proativas do Poder Judiciário, interferindo de maneira significativa nos feitos dos demais poderes constituídos, regulando-os, reformando-os e até, punindo-os. O colapso da saúde, segurança, educação e demais serviços públicos é algo inquestionável. Os institutos políticos precisam ser revistos, reinventados.

Inaptos para o atendimento aos desejos sociais, os poderes políticos, agremiações partidárias e demais componentes da força estatal precisam reconhecer a necessidade de reestruturação total do sistema. Porém, dizer que a atividade jurisdicional está fazendo o que os poderes políticos deveriam é, no mínimo, acenar com uma anomalia da tripartição e da própria democracia instituída.

É inegável a possibilidade dessa “intromissão” outorgada ao Poder Judiciário desde a concepção da Carta Magna de 1988. E isto, vem acontecendo. Os defensores da judicialização política dizem que o Judiciário atua onde o Executivo e o Legislativo são ineficientes ou ultrapassam seus limites. Porém, a possibilidade orçamentária, Leis de Responsabilidade Fiscal e de Improbidade Administrativa, deixam os representantes políticos receosos em suas atitudes. Temem processos, julgamentos e condenações. Instala-se o medo e uma crise de credibilidade, de confiança em nossa classe política e nas instituições constituídas.

Além disso, o ativismo judicial tem impacto brutal na questão orçamentária do Estado. Não são raras as decisões da justiça que demandam milhões de reais para seu cumprimento. Por consequência, um inicial planejamento orçamentário político fica comprometido diante de uma sucumbência de grande vulto monetário. Como planejar financeiramente um órgão, com o risco de um contencioso bloquear montantes consideráveis de sua verba?

Têm-se, de um lado, a ineficácia dos poderes políticos, alavancada pelo engessamento legal ou falta de compromisso dos seus representantes, de outro, temos o Poder Judiciário ativo, julgando com base na lei pela lei, insensível ao não considerar as dificuldades e limitações dos poderes políticos. O modelo, como está posto, é de desgaste. Perdem todos. No insucesso de um, naufragarão todos, Executivo, Legislativo e Judiciário.

Longe da pressão popular, as acusações e decisões judiciais merecem ter, no mínimo, bom senso. Fazer, realizar e arriscar-se em prol de projetos e programas para o alcance do desejado pela população, não tem sido tarefa fácil. Necessário o entendimento fático das pressões à que todos os poderes estão submetidos. A Lei, “fria” e estática não tem, por si só, condições de aferir a “alta temperatura” a que se submetem os que se enveredam na vida política e o Judiciário precisa estar atento a isso. Afinal, teria o Estado propósito diverso daquele desejado pela população?

 

Por Anderson Santos é advogado, jornalista, mestre em Direito Político e Econômico
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