23/08/2016 10:14
”A regra de financiamento nas eleições de 2016 favorece candidatos milionários e partidos sem vida orgânica. Não há tradição de doação de pessoas físicas no Brasil.”
A democracia é uma conquista inalienável. A liberdade, um valor universal. A primazia da sociedade sobre o Estado, o estabelecimento de controles sociais e a construção de instituições republicanas constituíram base sólida para a discussão coletiva dos problemas da sociedade e suas soluções. Não sei você, mas eu não gostaria de viver em Cuba, na Venezuela, na Coreia do Norte ou na Turquia. A democracia carrega virtudes e defeitos e é um processo permanente de aprendizado.
Um aspecto negligenciado no Brasil é o do financiamento. O funcionamento das instituições democráticas, dos partidos políticos, das candidaturas, das eleições tem um preço. Para que a competição democrática seja legítima e justa, é preciso reduzir custos, democratizar o acesso ao financiamento e garantir transparência total e controle social. A redução de custos pode se dar com a restrição de determinados instrumentos de campanha. Nesta eleição, por exemplo, foram proibidos cavaletes e minioutdoors, como no passado foram proibidos showmícios. Mas a verdadeira redução de custos só se dará com a mudança do sistema político e eleitoral. O voto nominal proporcional em território aberto é caríssimo. Algum tipo de regionalização do voto se faz necessário, com a redução do território de ação política dos candidatos a deputados. Ou a coletivização do processo, por meio das listas partidárias. O pior dos mundos é o sistema atual.
Hoje as eleições parlamentares têm pouco a ver com méritos e desempenho. Fui eleito pela revista “Veja” o melhor deputado de 2014 na luta pela modernização do país. Fui considerado pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) um dos cem “cabeças” do Congresso Nacional. Confesso que isso tem baixíssimo impacto eleitoral e é irrelevante no enfrentamento do poderio econômico.
Os custos também podem ser reduzidos com a racionalização do quadro partidário, por meio de diretrizes como a cláusula de barreira e o fim das coligações proporcionais.
A nova regra de financiamento para as eleições de 2016 favorece candidatos milionários e partidos sem vida orgânica. Não há tradição de doação de pessoas físicas no Brasil. Isso não suprirá o vácuo deixado pela proibição das doações empresariais. Ademais, a Lava Jato e o ambiente derivado lançaram uma névoa de interrogações que obscurece a diferença entre doações legais legítimas e propina fruto de corrupção.
O futuro sistema de financiamento da democracia brasileira terá que ser institucionalizado, com regras claras, universais e garantidoras da maior equalização possível das oportunidades, neutralizando a força do poder econômico. Por outro lado, é preciso dar transparência total aos fluxos financeiros envolvidos na sustentação da vida democrática.
Fora isso, a política não encontrará solo fértil para a discussão de ideias e programas, e a editoria política continuará se confundindo muito com o noticiário policial.
Por Marcus Pestana