Era Trump – Banco Central do EUA faz seu primeiro aumento na taxa de juros

16/03/2017 00:02

A moeda americana encarece 0,25% nos Estados Unidos, enquanto continua zero na Europa. Aumenta a discrepância entre as políticas dos grandes bancos centrais

O Federal Reserve cumpriu as expectativas e anunciou um aumento de 0,25% na taxa de juros, deixando o preço do dinheiro nos Estados Unidos dentro de um intervalo entre 0,75% e 1% e envia uma mensagem importante: a força que a primeira economia do mundo ganhou credibilidade. Este é o primeiro aumento da taxa na era Trump e aprofunda a divergência em relação à política monetária do Banco Central Europeu, uma defasagem que preocupa algumas organizações como a OCDE por conta das turbulências financeiras que pode provocar.

O aumento da taxa de juros desta quarta-feira foi o terceiro em 15 meses, o que significa que acelera o caminho para a normalização monetária, ou seja, ao ponto em que o preço do dinheiro se afasta de zero, no qual passou seis anos. O grande ponto de inflexão aconteceu em dezembro de 2016, quando o Fed ousou fazer o primeiro aumento em 10 anos depois da grande derrocada financeira. Não voltou a fazê-lo até dezembro do ano passado devido à incerteza global, mas neste ano são esperados mais dois aumentos. 14 dos 17 membros do comitê do Fed acreditam que o preço do dinheiro terminará o ano em 1,5% e que em 2018 ultrapassará os 2%.

Não houve surpresas ou agitação nos mercados nesta quarta-feira, como se a vida dos bancos centrais tivesse voltado a ser aborrecida e crise financeira fosse, realmente, apenas uma lembrança ruim. A decisão era dada como certa há semanas pelos analistas: acompanha os números da chamada economia real — o último dado sobre criação de emprego, de fevereiro, foi muito consistente — e as incertezas financeiras diminuíram. O que ainda continua presente são outras preocupações: como o dólar forte pode diminuir o ímpeto da economia norte-americana e até que ponto a atual discrepância entre as políticas monetárias dos grandes bancos centrais implica num risco global.

Enquanto a Europa mantém a máquina do dinheiro a todo vapor, o Fed está retrocedendo gradualmente há 14 meses. Na semana passada, o Banco Central Europeu (BCE) decidiu manter as taxas no nível mínimo histórico de 0%, patamar em vigor há um ano e acompanhadas de um plano de compra maciça de dívida para estimular o crédito, o investimento e o consumo. O organismo sediado em Frankfurt deu sinais de que as coisas funcionavam e que não haveria mais munição.

ENCONTRO COM TRUMP

Janet Yellen e Donald Trump já estiveram cara a cara. O presidente dos Estados Unidos começou com o pé errado com a chefe do Federal Reserve, a quem durante a campanha eleitoral acusou de impulsionar uma política monetária que buscava favorecer Barack Obama. Depois deixou de criticar os estímulos. “Apresentaram-nos, tivemos um breve encontro, pelo qual agradeço”, se limitou a dizer Yellen nesta quarta-feira, perguntada na coletiva de imprensa sobre se já conhecia o mandatário. Seu mandato termina no dia 1 de fevereiro de 2018 e Trump deverá decidir neste verão se a renovará no cargo, algo que não se espera. Também o número dois do Fed, Stanley Fischer, termina seu mandato.

Mas a atual defasagem entre os dois lados do Atlântico (que na primeira parte da crise aconteceu ao contrário, o arsenal de estímulos monetários norte-americanos chocou-se com a tímida política europeia) preocupa organismos como a OCDE, a organização de países mais industrializados do mundo, que há alguns dias alertou sobre as “vulnerabilidades financeiras e uma possível volatilidade do mercado financeiro causada por diferenças nas taxas de juros”.

O dólar forte como lastro

O senão da elevação da taxa de juros para os Estados Unidos é que ela acontece com um dólar já fortalecido em relação à maior parte das moedas, o que torna as exportações mais caras. Embora a taxa estivesse baixa, o dólar forte agiu como contrapeso e segurou a inflação (o Fed espera taxas de 1,9% e 2% para este ano e o próximo, respectivamente). Agora o preço do dinheiro sobe e pode aumentar a apreciação do dólar.

Em todo caso, é o sinal mais inequívoco de que a economia norte-americana finalmente acredita em seu próprio dinamismo, embora o crescimento continue sendo lento — um tímido 1,6% em 2016 —, está ganhando um pouco de força. Ainda é preciso constatar o efeito final da política econômica de Trump, cujas grandes promessas giram em torno de um corte nos impostos, um aumento nos gastos em infraestruturas e uma diminuição da regulação. Como candidato, o presidente prometeu alcançar uma taxa de crescimento de 4% ao longo de seu mandato, o que quase duplica a previsão do Fed para este ano e o próximo (2,1%).

 

Por Amanda Mars  no Brasil El País