Opinião – Organização revelada

13/06/2017 15:09

”Em Brasília perderam-se de vista o interesse nacional, o sentimento de respeito e de decência, o compromisso com o desenvolvimento, a necessidade de eliminar a miséria assombrosa.”

Para termos um vislumbre da organização criminosa velada pelas siglas partidárias que se apropriam da riqueza do país, é imperdível a leitura da entrevista à revista “Época” (Globo) do execrado Joesley Batista.

Se nem tudo que ele revela pode ser aceito como verdade, e se podemos desconfiar de interesses pessoais, as afirmações se encaixam na sequência de desastres e escândalos que levaram o Brasil ao fracasso, com quatro anos de abismal recessão e tristeza.

Ele, um dos mais eloquentes representantes dos “insaciáveis” – como insaciáveis foram Eike Batista e Marcelo Odebrecht – adulterou o sistema republicano numa cleptocracia perversa, e, assim, do alto de sua experiência, emitiu frases que não deixam indiferente nem o mais curtido delinquente deste Brasil.

A frieza de Joesley, que não gasta uma palavra a mais nem uma a menos para descrever os torpes bastidores de Brasília, pinta o conchavo dos poderes que asfixiou o país. Mostra como as leis, de alguns anos pra cá, assim como a fiscalização exercida pelo Congresso Nacional, criaram paradas obrigatórias para surrupiar as caravanas.

Transcrevo aqui, não por prazer, algumas revelações de Joesley, que se encontra no beco cuja saída será entregar os crimes consumados para aliviar sua pena.

“Há político que acredita que o simples cargo, que ele está ocupando, já o habilita a você ficar devendo favores a ele, e (ainda) pedir algo a você de maneira que seja quase uma obrigação você fazer os favores”.

Continua: “É o grupo deles (do Eduardo Cunha e companhia). Quem não está preso está hoje no Planalto. Essa turma é muito perigosa. Não pode brigar com eles. Nunca tive coragem de brigar com eles. Por outro lado, se você baixar a guarda, eles não têm limites. Então, meu convívio com eles foi sempre os mantendo a meia distância: nem deixando eles aproximarem demais, nem deixando eles longe demais, para não armar alguma coisa contra mim. A realidade é que esse grupo é o de mais difícil convívio que já tive na minha vida. Daquele que nunca tive coragem de romper, mas também morria de medo de me abraçar com ele”.

Avançando: “O mais relevante foi quando Eduardo tomou a Câmara. Aí virou CPI para cá, achaque para lá. Tinha de tudo. Eduardo sempre deixava claro que o fortalecimento dele era o fortalecimento do grupo da Câmara (PMDB e aliados) e do próprio Michel. Aquele grupo tem o estilo de entrar na sua vida sem ser convidado”.

Sobre o líder do esquema: “O Eduardo, quando já era presidente da Câmara, um dia me disse assim: ‘Joesley, eles estão querendo abrir uma CPI contra a JBS para investigar o BNDES. É o seguinte: você me dá R$ 5 milhões que eu acabo com a CPI’. Falei: ‘Eduardo, pode abrir, não tem problema’. ‘Como não tem problema? Investigar o BNDES, vocês’. Falei: ‘Não, não tem problema’. ‘Você está louco?’ Depois de tanto insistir: ‘É sério que não tem problema?’. Eu: ‘É sério’. Ele: ‘Não vai te prejudicar em nada?’. ‘Não, Eduardo’. Ele imediatamente falou assim: ‘Seu concorrente me paga R$ 5 milhões para abrir essa CPI. Se não vai te prejudicar, se não tem problema… Eu acho que eles me dão os R$ 5 milhões’. ‘Uai, Eduardo, vai na sua consciência. Faz o que você achar melhor’”. Conclui: “Esse é o Eduardo (Cunha). Não paguei e não abriu. Não sei se ele foi atrás. Esse é o exemplo mais bem-acabado da lógica dessa organização criminosa”.

Essa descrição calha bastante com o resultado dos desastres mais recentes.

Em Brasília perderam-se de vista o interesse nacional, o sentimento de respeito e de decência, o compromisso com o desenvolvimento, a necessidade de eliminar a miséria assombrosa. Mais que estadistas e representantes populares, o Brasil parece ter sido dominado por aves de rapina, psicopatas que se arrogam o poder de fazer e desfazer em benefício próprio, completamente dissociados do dever com a nação.

E como disse Napoleão ao chegar à ilha de Santa Helena: “O ser humano não tem amigos. Somente os tem os seus sucessos”.

 

Por Vittório Mediole

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