Opinião – Acreditar no futuro do Brasil é um sentimento difícil de ser explicado

13/03/2018 13:56

”Sei que muita água já rolou e ainda rolará por debaixo dessa frágil ponte que é a democracia, mas será ela que nos levará a uma saída menos tenebrosa.”

Sou um ingênuo, Sandra. Irremediavelmente. Uma das razões dessa ingenuidade talvez esteja na incrível e inexplicável atração que sempre alimentei pelos decaídos. Se dividirem o universo em “virtuosos” e “pecadores”, por favor, jamais me procure na primeira leva.

Além do mais, prezada amiga, reconheço que acredito, piamente, em nosso país. Talvez seja ele o meu único vício – a droga que me levou a essa difícil e inexplicável dependência. Talvez seja por isso que nunca me distancio da política e, obviamente, do fato político. Mas, às vezes, sobretudo às vésperas destas linhas difíceis e doídas, pergunto-me: por que, então, meto o bico em coisa tão complicada? Mas existe, enfim, alguém que de fato entende dessa coisa complicada, que envolve o que há de mais indecifrável no mundo – o frágil ser humano?

A mesma crença talvez ocorra com você, que abraçou a política muito jovem, desembarcou de um partido que antes prometia tudo ao povo, mas, há anos, deixou de ser candidata a cargo eletivo. Você, porém, jamais se distanciou do interesse público. Apenas mudou de lado no balcão. E é de gente assim que precisamos na vida pública. Por tudo isso, tenho certeza de que ambos acreditamos em nosso país. Ouso dizer que, mesmo depois de conhecermos um bocado de coisas na política – boas e ruins –, ainda assim, permanecemos ingênuos. Não será a incapacidade do presidente Michel Temer de enxergar o que seja um gesto altivo que nos abalará. Ele, como todo passante, brevemente passará.

A meu ver, as mazelas, nas quais sempre viveu nosso país, que hoje são mais sentidas do que ontem, devem servir de lição, não de desânimo. O mundo sempre foi assim, Sandra, e, com as últimas descobertas tecnológicas, as coisas pioraram. Como se explica, por exemplo, esta incrível barbárie, no Rio de Janeiro (mas não é só lá): de 2013 para cá, ocorreram 21.258 mortes violentas! Veja bem: uma morte a cada duas horas! No início da semana, numa simples briga de trânsito, na zona Oeste do Rio, um homem atirou no carro onde se achava uma família e matou uma criança de 6 anos! “É de chorar e se desesperar, mas choro e desespero não resolvem”, como diz Ana Maria Machado.

É verdade que, hoje, na política brasileira (e mundial), não existe mais altivez, mas já a vivenciamos em passado recente. Temos exemplos na história, no Brasil e no mundo. O exagero tomou conta de todos nós. Tudo, num átimo, vira notícia (ou deboche) nas redes sociais, que influenciam os veículos tradicionais de comunicação social, que, por sua vez, influenciam o procurador geral da República e, de quebra, juízes do nosso Supremo Tribunal Federal – nossa mais alta Corte. Parece que ninguém pensa com espírito público. Ou não se sabe o que é isso? E ninguém reflete por um só segundo. É preciso viver como se a vida fosse terminar amanhã, no fim de mais uma tarde fria.

Termino estas linhas afirmando que sou de fato um ingênuo. Acredito que o futuro de nosso país está na consolidação do regime democrático, única alternativa de governo viável. Vale dizer: está nas mãos dos eleitores, em nossas mãos. E, mesmo depois de assistir, durante horas, ao triste espetáculo promovido pelos integrantes da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), transmitido ao vivo pela televisão, ainda assim, creio neste país e em sua gente. Sei que muita água já rolou e ainda rolará por debaixo dessa frágil ponte que é a democracia, mas será ela que nos levará a uma saída menos tenebrosa.

 

Acílio Lara Resende artigo

Por Acílio Lara Resende

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