Opinião – A prisão de Lula: o velório de um vivo ou de um partido?

10/05/2018 05:13

”O destaque que o próprio Lula deu à dupla de jovens pré-candidatos, Manuela d’Ávila e Guilherme Boulos, tornou possível que estes conciliassem com mais facilidade interesses políticos”

A prisão do ex-presidente Lula pela Polícia Federal foi percebida como um dos principais eventos históricos da política democrática brasileira desde 1985. Essa avaliação não traz em si qualquer juízo de valor, mas se trata de uma mera constatação: tanto os partidários de Lula quanto seus opositores se organizaram com o objetivo de tornar a ocasião a mais marcante possível, tendo em vista a obtenção de benefícios eleitorais.

Somados tais esforços, e considerado o evidente sucesso do líder petista em controlar o desenrolar dos acontecimentos, ficou claro que a batalha dos símbolos e da mídia foi vencida pela esquerda, que conseguiu produzir imagens marcantes em torno do drama de Lula, assim como lançar slogans com grande potencial para utilização na eleição de outubro próximo.

Há, porém, uma importante ressalva a ser feita, em meio a toda essa comoção: apesar de Lula constituir-se como o foco das atenções, o ex-presidente dificilmente era a prioridade da maioria daqueles que o cercavam. À medida que o drama da prisão de Lula ganhava intensidade, era possível acompanhar, pela televisão e redes sociais, o frenesi de lideranças políticas da esquerda para tomar parte nessa história.

Usando desde fotos e vídeos até discursos inflamados, foram muitos os políticos que lutaram para aparecer sob o mesmo holofote que Lula, registrando assim seus respectivos lugares na história. A seis meses das eleições gerais, não é exagero associar o desejo desesperado por exposição ao lado de Lula, demonstrado por tantos políticos, com a necessidade, que estes mesmos terão, de imagens e conteúdo para divulgar em suas campanhas eleitorais que se aproximam.

Faz parte da essência da atividade política orientar-se por resultados, assim como operacionalizar sentimentos para a construção desses. As lideranças políticas presentes ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC paulista quando da prisão de Lula certamente não construíram suas carreiras de sucesso subvertendo esse mandamento basilar da política: pelo contrário, sempre mostraram maestria na hora de priorizar resultados e instrumentalizar sentimentos.

Um exemplo foi o senador Lindbergh Farias, que chegava próximo de ofender Lula quando da disputa pela presidência do PT em agosto de 2017 e, no momento da prisão deste, se portava como um dos mais condoídos da multidão.

Por cruel que possa parecer, o cortejo frenético de correligionários, marcado pelas respectivas demonstrações encenadas de solidariedade, guardava incômoda semelhança com os ritos sociais de um velório ocidental: todos demonstrando apreço e proximidade para com o falecido, mesmo que isso não reflita a realidade.

Também merecem destaque, nesse contexto, dois pré-candidatos à Presidência da República, Manuela d’Ávila e Guilherme Boulos: ao mesmo tempo em que se mantinham como os mais próximos de Lula, também eram aqueles que mais benefícios pessoais poderiam auferir da retirada do líder petista do processo eleitoral.

O destaque que o próprio Lula deu, em várias ocasiões, à dupla de jovens pré-candidatos tornou possível que estes conciliassem com mais facilidade interesses políticos e a solidariedade pessoal ao velho líder petista. Por algum motivo, Lula não concedeu a qualquer de seus correligionários o mesmo destaque que deu a Ávila e Boulos: o custo dessa atitude pode ser alto, transformando o PT no verdadeiro cadáver que se velava em São Bernardo do Campo.

 

 

Por Paulo Diniz

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