29/05/2019 18:18
”As mídias sociais impulsionaram Bolsonaro na eleição, mas não são mídias de comunicação de massa. É um equívoco governar por redes sociais”
As redes sociais, um fenômeno relativamente novo na sociedade, passaram a desempenhar um papel fundamental na vida da grande maioria dos mortais. Basta ver que o Facebook, a maior delas, tem hoje mais de 2,2 bilhões de usuários mundo afora, sendo aproximadamente 127 milhões no Brasil —cerca de 60% dos brasileiros.
Criadas especialmente para facilitar a interação entre as pessoas, passaram a ser usadas para várias finalidades, inclusive como ferramenta de campanha eleitoral. E tiveram, não resta dúvida, um papel importantíssimo na eleição de Jair Bolsonaro para a Presidência da República em 2018 —embora existam também vários outros fatores a explicar sua vitória.
Sem tempo na TV no primeiro turno (ele dispunha de apenas oito segundos no programa eleitoral), usou e abusou das redes sociais para conquistar corações e mentes, que se traduziram em milhões de votos. É preciso lembrar, entretanto, que Bolsonaro vinha intensificando sua presença nas redes sociais desde 2010, num trabalho comandado pelo seu filho Carlos Bolsonaro, o 02.
Em guerra permanente contra os veículos de comunicação tradicionais, o presidente Bolsonaro e seus filhos, a julgar pelo que estamos assistindo nos cinco primeiros meses de governo, parecem estar convencidos de que é possível também governar e se comunicar com os brasileiros pelas redes sociais. Não tenho dúvida em afirmar que se trata de um equívoco.
Redes sociais são espaços excelentes para que as pessoas possam se manifestar com total liberdade, dizer o que pensam sobre tudo e sobre todos, se sentirem empoderadas. São, de fato, um instrumento extremamente democrático. Para alguns, servem para desopilar o fígado e destilar veneno e têm se mostrado também muito eficazes para disseminar fake news e destruir reputações.
Mas elas não são, definitivamente, mídias de comunicação de massa. Errado imaginar, portanto, como parecem acreditar Bolsonaro, sua prole e alguns de seus seguidores nessas redes, que são instrumento para que um presidente da República possa se comunicar com uma nação que tem mais de 200 milhões de habitantes.
Um parêntese. Bolsonaro tem cerca de 11 milhões de seguidores no Facebook e no Instagram e aproximadamente 4 milhões no Twitter. São números expressivos, mas muito longe do universo de brasileiros que têm direito de ser informados sobre como ele está administrando o país. E um pequeno detalhe: reportagem publicada recentemente pelo portal UOL mostrou que 60% dos seguidores do presidente no Twitter são falsos. Fecha parêntese.
Alguém imagina que as redes são capazes de propagar, de forma espontânea, conteúdos que não são compreendidos ou que não interessam a quem está recebendo? Como, por exemplo, a reforma da previdência, tema antipático aqui no Brasil e alhures, uma vez que ela trata, fundamentalmente, da retirada de direitos e de corte de alguns privilégios?
Para a comunicação de massa, ainda não inventaram nada melhor do que a velha ferramenta de marketing chamada propaganda. Com ela, sim, é possível defender uma tese, construir cenários, projetar situações, tocar o coração das pessoas, convencer, persuadir. Estou certo de que não haverá caminho seguro para o governo se não recorrer a ela.
Nas redes sociais, é possível encontrar recomendações, receitas e remédios para todos os males da humanidade. Mas, ainda assim, é recomendável que se consulte um médico, o profissional capacitado para indicar o receituário mais adequado para cada moléstia. Se usar a medicação errada, o paciente corre riscos, inclusive de morte.
Por Paulo Vasconcelos, 58 anos, é publicitário com especialização em opinião pública. Foi diretor de Marketing da Coca Cola e já dirigiu várias agências de propaganda. Há 20 anos se dedica ao marketing político presidindo a Vitóriaci. Fez as campanhas presidenciais de Aécio Neves e Henrique Meireles.