Opinião – Radicais da ética, lembrei-vos de Plínio Salgado

25/10/2019 11:57

”Radicais têm pouco espaço na história. Poeira cósmica comparada ao sol. Plínio Salgado foi indo, foi indo, foi indo e terminou vida pública com 2 mandatos de deputado”

A história todo mundo já conhece, mas não custa nada lembrar: lá pelos meses finais de 1937, o ardiloso Gegê, Getúlio Vargas, tira da cartola o fraudulentérrimo plano Cohen (uma ficção criminosamente inventada e vazada com o enredo de uma fantástica conspiração internacional comunista para tomar o poder no Brasil). A Ação Integralista Brasileira, que usava 1 sigma como símbolo numa inspiração ao Nazismo que cativava suas fileiras, era comandada pelo líder Plínio Salgado. Ele apoiou o golpe do Estado Novo que fez de Getúlio 1 ditador. Mas 1 dos primeiros decretos do novo regime fez o que? Decretou o fechamento de todos os partidos políticos, inclusive o dos Integralistas. Plínio tinha pretensões de participar do governo. Como ministro. Nada. Os “camisas verdes” tentaram ainda fazer 1 levante, em 1938. Foram mascarados pelas manhas de Gegê.

Parece familiar? Uma guinada conservadora motivada para dar 1 freio na esquerda e restaurar a moralidade, mas que começa fazendo uma escala e dando uma bordoada nos radicais do conservadorismo antes de partir para o combate aberto contra o inimigo do outro polo? Muita gente acha que essa é uma narrativa que poderia ser aplicada aos primeiros meses do governo Bolsonaro, sobretudo no que diz respeito ao estado policial. Eleito coimo anteparo à permanência do PT, o atual presidente teve a ousadia de quebrar o protocolo que havia sido criado na indicação do chefe do Ministério Público Federal e muitos aliados seus o criticam por não ter intensificado ainda mais a Lava Jato. Pelo contrário.

Ai, ai… o Mito não está inovando. Assim como os lavajatistas do Estado Novo foram engolidos pela astúcia de Gegê e seu apoio na caserna, já houve outro precedente, oh céus!!!! Quem não se lembra do fundador do lavajatismo universal, sim, ele, Carlos Frederico Werneck de Lacerda. Apelido: o Corvo. A vítima do atentado na Rua Tonelero, que em última instância levaria ao suicídio da lenda, Getúlio. Lacerda, o conspirador-mor com sua UDN, que atentou contra JK, que abalou e conspirou para derrubar Jango. Ganhou? Ganhou: a Cruz da Ordem Militar de Cristo de Portugal, em julho de 1964. Em dezembro de 1968, foi cassado pelo regime dos generais e levado para a prisão num batalhão da polícia militar.

As ondas do moralismo e do punitivismo são 1 coro, mas o maestro que rege a orquestra ao fim das democracias costuma calar primeiro a voz dos radicais do seu lado. Com o terreno limpo, firmado e confirmado em sua legitimidade absoluta e em seu poder inconteste, tira as coleiras e solta os cães para cravar as mandíbulas nos inimigos ideológicos do regime. Mas antes de abrir o canil, é preciso colocar ordem nele. E a história mostra que a focinheira é entubada nos que rosnaram juntos pela derrubada do regime anterior, sobretudo os que rosnaram mais alto e estavam ao lado. Amansados esses, os cães começam a caçar os gatos.

Isso quer dizer que o Mito está traindo o ministro Moro ou a Lava Jato? Não. Isso quer dizer que o presidente está exercendo o poder da maneira mais clássica, nesse quesito. E, ao fazê-lo, cria 1 alinhamento dos astros com outros planetas do sistema político: a velha política (que defende o fim dos excessos da Lava Jato por bons e não tão bons motivos), os legalistas, o Supremo Tribunal Federal (cuja maioria hoje entende que a Lava Jato é importante, mas sob algum tipo de controle do Estado, maior do que teve no início). A Lava Jato não apenas é 1 fato histórico. Ela produziu cariosa fatos históricos. Um deles está acontecendo agora, aos olhos de todos: pela primeira vez, desde a redemocratização, não existe corrupção sistêmica no governo federal. Isso, em si, é 1 avanço.

Quanto aos radicais, bem, Lacerda morreu no ostracismo. Plínio Salgado foi indo, foi indo, foi indo e terminou sua vida pública com 2 mandatos de deputado federal pela Arena, o partido oficial do regime militar. Getúlio Vargas é nome de avenidas e marcado na história do país. Plínio e Lacerda são coisas para especialistas ou curiosos de nossas entranhas como nação. Poeira cósmica comparada ao sol.

 

 

 

 

Por Mário Rosa Mario Rosa, 54 anos, é 1 dos mais renomados consultores de crise do Brasil. Foi o autor do prefácio do primeiro plano de gerenciamento de crises do Exército Brasileiro. Atuou como jornalista e consultor.

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