02/06/2020 12:36
”Não sou, repito e insisto, inimigo da “globalização”. Defendo a integração. Sou autor de livros sobre as vantagens da eliminação de barreiras comerciais”
Era para ser o mundo do livre-comércio. O paraíso das oportunidades. Uma aldeia global. A extinção das fronteiras. A humanidade sem muros. Eis como se definiu, nas últimas décadas, o fenômeno conhecido como “globalização”.
A ideia – e fique isto muito claro – é válida. Já passou da hora de a humanidade adquirir consciência. Porém, bastou uma pandemia para demonstrar que espiritualmente estamos muito distantes disso. Descortinou-se, ao fim do cabo, um cenário dantesco.
A primeira vítima foi o comércio. As notícias de interceptação e desvio de equipamentos hospitalares já pagos viraram rotina nos jornais. Dentre as vítimas enumerou-se o Brasil – um dos países mais “globalizados” do mundo.
Seguiu-se o erguer, do dia para a noite, de barreiras comerciais as mais diversas – o protecionismo falou mais alto. Novamente, uma das maiores vítimas foi o nosso país.
Não nos esqueçamos da fraternidade e do respeito. Países que sempre homenageamos viram, impassíveis, brasileiros serem despachados para verdadeiros campos de concentração – onde permaneceram presos em condições absolutamente indignas. Outros acabaram dormindo na sarjeta, passando fome e privações.
Poucos foram, afinal, os exemplos de grandeza e sensibilidade testemunhados por esta “aldeia global” afora – em contraste com os inumeráveis exemplos de egoísmo, ganância, prepotência e mesquinharia.
Que não se confunda este quadro com o conhecido bordão “meu país primeiro”. O que vimos vai muito além disso! Chega às raias da pirataria e do desprezo.
Não sou, repito e insisto, inimigo da “globalização”. Defendo a integração. Sou autor de livros sobre as vantagens da eliminação de barreiras comerciais. Mas penso que deveríamos, enquanto Brasil, meditar.
Nas últimas décadas internacionalizamos brutalmente nossa economia – de forma sem paralelo no planeta. Grupos estrangeiros aqui estão a explorar nossas mais relevantes riquezas – até as não-renováveis. Alguns, inclusive, poluindo nosso solo e destruindo nossa tão rica natureza. Enquanto povo, chegamos ao ponto de substituir “intervalo” por “coffee break”. De aposentar o Saci Pererê e contratar o “Halloween”.
Em uma expressão: praticamente sem reciprocidade entregamos a outros povos muito de nossas riquezas e até de nossa identidade. Está certo isso? Acorda, Brasil!
Por Pedro Valls Feu Rosa é desembargador do Tribunal de Justiça do Espírito Santo.