Opinião – No Brasil, a dívida pública sempre foi de curto prazo

05/06/2020 13:40

Sede do Banco Central, em Brasília: ”Relação Tesouro-BC traz distorção. O que afeta reservas bancárias”,diz Freitas Gomes

No Brasil, com as expectativas favoráveis em relação ao comprometimento do governo com o seu endividamento, a dívida bruta estava caindo até o início da pandemia. Contudo, a dívida pública brasileira neste ano deve crescer muito. Mesmo com isso, é possível voltar à tendência de redução da dívida a partir do ano que vem. Desde que se continue com as reformas, para mostrar a seriedade do governo, este é o fator mais importante.

O Tesouro pode administrar esse aumento, desde que ele consiga cortar despesas primárias, vender reservas internacionais e usar recursos devolvidos pelo BNDES. Este último tem R$ 170 bilhões para devolver aos cofres públicos. Além disso, o Banco Central pode trabalhar com reservas menores. Com essas medidas, pode-se continuar com os juros baixos devido às expectativas inflacionárias sob controle.

Essas dívidas sempre foram de curto prazo devido ao fato das reservas bancárias sempre terem sido desequilibradas. O relacionamento entre o Tesouro Nacional e o Banco Central e o monopólio cambial exercido pelo Banco Central causam um desequilíbrio permanente nas reservas bancárias e um volume excessivo de operações compromissadas, além de afetar a formação da estrutura a termo das taxas de juros.

O relacionamento entre o Tesouro Nacional e o Banco Central gera muitas distorções. A maior parte dos países costuma optar, no relacionamento entre a autoridade fiscal e a monetária, por maior separação entre a conta fiscal, que administra os recursos primários e a dívida pública, e a conta monetária, que assegura o poder de compra da moeda e administra as reservas internacionais.  Na prática, isso significaria permitir ao Tesouro manter contas também em bancos comerciais. A conta no Banco Central seria mais usada para acerto de lucros ou prejuízos de sua carteira. A exclusividade da conta única do Tesouro no Banco Central faz com que as políticas fiscais e monetárias se confundam.

Ao se observar o histórico do país, nota-se que o governo não tem problemas para se endividar. Em um período difícil para a economia nacional, em 1989, o Tesouro lançava títulos na segunda e o Bacen recomprava na quarta. Mostrando que o Brasil sempre se endividou com o mercado sobrevendido. Não há problema em endividamento de curto prazo no Brasil, pois pode-se financiar a dívida em real.

Mesmo quando vende títulos de longo prazo, que pagam juros mais altos, o Bacen carrega esses papéis todos os dias. Logo, é um mito dizer que vende títulos longos, já que o Tesouro e Bacen acabam negociando no curto, devido à falta de reservas para financiar períodos mais distantes. Grande parte da dívida pública externa também era financiada no curto prazo, antes de sua renegociação.

Mesmo durante a hiperinflação, o Tesouro conseguiu vender seus títulos denominados na nossa moeda. A confiança não era na responsabilidade fiscal, mas na capacidade do Bacen emitir moeda. Hoje existe confiança na nossa responsabilidade fiscal, o que foi conseguido pelo atual governo, liderado pelo ministro Paulo Guedes.

 

 

 

Por Carlos Thadeu de Freitas Gomes, 72 anos, é economista-chefe da CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo). Foi presidente do Conselho de Administração do BNDES e diretor do BNDES de 2017 a 2019, diretor do Banco Central (1986-1988) e da Petrobras (1990-1992).

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