Opinião – ”Me dá um 1 dinheiro aí”, ainda é o melhor cabo eleitoral

23/08/2020 11:13

Microfones de emissoras instalados em frente ao Palácio da Alvorada: governo e mídia vivem uma ‘gangorra’, aponta o autor

Nos últimos meses, Bolsonaro e a grande mídia brasileira vivem numa espécie de gangorra. Sobe a aprovação do governo e cai a audiência do Grupo Globo, Folha, VejaIstoÉEstadão e Correio Braziliense. É o que mostra o cruzamento de uma pesquisa da Comscore com os números do PoderData publicados esta semana.

O PoderData é a única empresa de pesquisas no Brasil que faz 1 levantamento a cada 15 dias desde abril, com abrangência nacional. Os resultados, publicados permitem acompanhar de maneira minuciosa o humor dos brasileiros em relação a atual administração e o presidente.

A realidade exposta por estes números indica que nem sempre as versões e narrativas produzidas por grandes e pequenos veículos reproduzem com exatidão os fatos. Se Bolsonaro fosse metade do que dizem que ele é, não teria nem 5% do apoio que efetivamente tem. Pesquisas são como uma foto; registram um momento. Mas não é só isso. Elas revelam principalmente tendências, sentimentos que são captados no cruzamento das respostas de homens, mulheres, jovens, ricos, pobres, remediados, empregados, desempregados, os que têm esperança, aqueles que a perderam de vista e outros que conseguiram recuperá-la.

Lá no mês de abril, uns 100 dias atrás e auge da quarentena, tivemos um pico de audiência dos grandes veículos. O grupo Globo registrou 48,5 milhões de visitantes únicos, a Folha chegou a 39,4 milhões, a IstoÉ 24,2 milhões, o Estadão 21,8 milhões e o Correio Braziliense 17,6 milhões, conforme apurou a Comscore, especialista neste tipo de medição. No mesmo mês a desaprovação do governo bateu os 40%, conforme a pesquisa do PoderData realizada nos dias 26 e 29 e seguiu subindo.

A partir de maio a audiência começou a dar sinais de queda. A desaprovação do governo seguia alta, no patamar de 44%. A pesquisa realizada de 8 a 10 de junho pelo PoderData registrou 50% de desaprovação do governo. Nas quatro pesquisas seguintes esta desaprovação caiu 5 pontos percentuais, chegando a 45% e empatou com a aprovação.

Em junho, a Comscore registrou a maior queda de audiência do Grupo Globo nos seis primeiros meses do ano. Os visitantes únicos eram 48,5 milhões em abril e caíram para 38,2 milhões em junho. Arredondando, perderam 10 milhões de leitores ou 22%. Neste mesmo período, a Folha tinha 39,4 milhões e agora tem 26,3 milhões. Menos 13 milhões de leitores ou 33%. Veja, IstoÉ e Estadão também viram a audiência encolher. Pela lógica, estes leitores migraram para as redes sociais.

As pesquisas mostram que a popularidade do governo está diretamente relacionada ao auxílio emergencial para cerca de 70 milhões de pessoas, quase 2 Argentinas. Mérito do ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, que conseguiu fazer o dinheiro chegar na mão de todo este povo.

Quase metade dos brasileiros estão vivendo sem emprego fixo, se virando do jeito que podem. Com a ajuda em grana viva, a avaliação positiva do governo chegou a 41% no Nordeste, provando mais uma vez que não há relação entre ideologia e dinheiro na mão. Isso indica que o eleitor médio percebe o governo e o presidente de um jeito diferente – senão inverso – da imagem veiculada pela grande imprensa. Um indício de que a audiência não faz a preferência.

Bolsonaro recupera aos poucos o que perdeu nos últimos meses e, como Lula, vem trocando o apoio das classes A e B e pelo das classes C e D. Nada menos que 50% dos brasileiros sem renda fixa aprovam o governo, diz o PoderData. Eles hoje são 47% da população. Gente que passa todo tipo de aperto para sobreviver. Não há como abrir mão de pagar o auxílio emergencial ou qualquer outro seja lá com que nome for, porque sem estes eleitores pobres e necessitados não haverá reeleição em 2022. É pegar ou largar.

O Centrão ajudou a melhorar a vida de Bolsonaro, assim como a aliança com a Record e SBT, além de uma certa neutralidade da Bandeirantes, e a soma disso compensou os ataques do Grupo Globo e da Folha, dando fôlego ao presidente. Enquanto Bolsonaro dá dinheiro, seus adversários dão notícia ruim. Com a economia descendo a ladeira, a única má notícia que pode pegar de verdade é o fim do auxílio emergencial.

Isso explica como o presidente estancou a queda e começa a reverter a situação. Uma outra pesquisa do PoderData publicada em 6 de agosto mostrou um Bolsonaro forte, dono de 38% das intenções de voto para presidente, com 24 pontos de vantagem sobre o petista Fernando Haddad (14%) e 28 pontos sobre o ex-juiz Sergio Moro. Na rabeira, os governadores de São Paulo, João Doria, com ralos 4%, e do Maranhão, Flávio Dino, com 3%. No Nordeste, Bolsonaro tem 37% das intenções de voto, 1 ponto percentual a mais que no Sudeste. Entre os brasileiros sem renda fixa, 39% querem votar nele.

Pelos resultados das pesquisas do PoderData e a movimentação dos candidatos e partidos políticos, vai demorar para surgir um desafiante capaz de fazer frente a Bolsonaro em 2022. Se continuar ganhando eleitores nas classes C e D, conseguir ampliar um pouco mais a base no Nordeste e recuperar o que perdeu no Sudeste, o presidente pode se tornar um candidato difícil de bater. Se a eleição fosse hoje ele estaria a 12 pontos percentuais de vencer no primeiro turno.

Esta é a tendência por enquanto. Não significa que será realidade nos próximos 2 anos, porque na política o inesperado sempre pode fazer uma surpresa. Significa apenas que a combinação de eleitor pobre e políticas compensatórias do “me dá um dinheiro aí” continua sendo o melhor e mais eficiente cabo eleitoral. Em 1986 deu aoPMDB vitória estrondosa com o Plano Cruzado, em 1994 e 1998 elegeu Fernando Henrique com o Real, em 2006 foi a vez de Lula e, depois, Dilma ganhou em 2010 e 2014. Agora, o dono do cofre é Bolsonaro.

 

 

 

 

Por Marcelo Tognozzi é jornalista e consultor independente há 20 anos. Fez MBA em gerenciamento de campanha políticas na Graduate School Of Political Management – The George Washington University e pós-graduação em Inteligência Econômica na Universidad de Comillas, em Madrid.

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