24/09/2020 13:33
”É possível que a voz do atraso possa considera-lo dispendioso, mas se educação é cara, que se experimente o preço da ignorância”, diz autor
Diz um saber popular que Deus não escolhe os capacitados, apenas capacita os escolhidos. Conjugar conhecimento à capacitação pode ser rima e solução, mas nada acontecerá se não for pelos caminhos da prática. O humor satírico ensina que nada se cria, porém tudo se copia. Para capacitar os trabalhadores à eficiência, por que não olhar para experiências que já estão dando certo?
A educação na Alemanha se mostra ao mundo como um exemplo de eficiência. O Brasil, patinho feio, apesar do olhar e colaboração da iniciativa privada, ainda apresenta uma visão assistencialista na formação profissional. Somente 1 em cada 10 jovens cursam escolas técnicas federais no Brasil. Em países desenvolvidos, esse número é de 1 em cada 2 jovens.
Em um instante em que as mudanças tecnológicas pedem o aperfeiçoamento desse tipo de formação profissional, as escolas profissionalizantes do governo mantêm currículos excessivamente teóricos e distantes da realidade sempre atual no mundo do trabalho. Até janeiro deste ano, segundo o censo escolar do MEC, foram matriculados pouco menos de 2 milhões de alunos nos cursos profissionalizantes em todo o Brasil. A participação da iniciativa privada, de 40%, foi com 800 mil matrículas e o restante ficou com governos municipais, estaduais e federais.
Já faz décadas que a presença dos governos neste modelo de educação é insuficiente. É injusto criticar apenas os dirigentes atuais. Têm muitos aniversários que não se brinda o país com uma excelente formação profissional. Afinal, virou bordão que a gestão privada é controlada pelo governo, enquanto a pública é exatamente aquela que ninguém controla. Preocupante, tão preocupante que o Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID – alertou que os governos do Brasil há muito tempo gastam muito e gastam mal. Tamanho é o desperdício, que apesar do valor corrigido, R$ 68 bilhões saem pelo esgoto todos os anos.
O modelo que algumas escolas geridas pela iniciativa privada mostram o que é a formação dual. Esse conceito de formação profissional é aquele que equilibra os novos conhecimentos teóricos ao aprendizado prático profissional. Nada mais oportuno que uma reflexão sobre a capacitação, neste instante em que famílias se desesperam com as sombras do desemprego: trágica herança que a pandemia deixou.
A formação profissionalizante alemã é a que oferece as melhores perspectivas. Para a juventude, o fim do ensino médio é um período de muitas dúvidas. Aos 17 anos será preciso desenhar o formato do próprio destino. Haverá uma escolha dramática entre o dinheiro ou o sucesso público. A experiência alemã revela que é nesse momento que o jovem decide entre obter conhecimento para garantir as portas práticas que o levem ao emprego e salários ou o brilho em uma universidade. Uma escolha delicada. O caminho da profissão imediata e a glória no mundo das ciências gera uma bifurcação onde as escolhas não têm volta.
Os alemãezinhos sempre tiveram muito claro que se a opção for universidade é porque sabem ser capazes de gerar conhecimento e não apenas repetir o que já existe. Universität ou Ausbildung. Universidade ou Formação Profissional. Uma é para buscar conhecimento novo e seus resultados para a humanidade. Outra, para saber usar com perfeição aquilo que já se conhece. A primeira é aposta no futuro; a outra é certeza imediata de se transformar em um profissional. Essa última, resulta na opção mais procurada, pois os jovens têm pela frente mais de 330 profissões à escolha.
É fundamental que saibamos que muito mais importante que os valores externos, das florestas às grandes usinas, é o nosso patrimônio humano, construído com educação e tecnologia.
Deveríamos memorizar um mantra que nos avisasse que capacitação profissional é sempre investimento, jamais um custo. Quando os governos são insuficientes na educação, é melhor não atrapalhar. Lembrem-se que um relógio parado sempre tem ponteiros que duas vezes ao dia marcam a hora certa.
Enquanto isso, a ampulheta da iniciativa privada continua a correr areia. Até hoje, o Estado deu às empresas o mecanismo fiscal de produzir formação de mão de obra. Todo o esforço de aprimorar trabalhadores para enriquecer a mão de obra não tem preço. É possível que a voz do atraso possa considera-lo dispendioso, mas se educação é cara, que se experimente o preço da ignorância.
Por Francisco Maia é presidente do Sistema Fecomércio-DF (Fecomércio, Sesc, Senac e Instituto Fecomércio).