Opinião – A influência ideológica na busca pela igualdade de gênero

10/10/2020 17:37

Numa conversa virtual com o sociólogo e cientista político Antonio Lavareda, ele acabou me encaminhando um artigo seu publicado há um ano pelo Blog do Noblat: “Mulheres são de Esquerda, homens de Direita”.

A partir de avanços da neurociência, pesquisas sobre a diferença da estrutura cerebral entre cada sexo, influências hormonais e repertório emocional, Lavareda fez uma análise do comportamento dos eleitores de acordo com seu gênero: os homens costumam escolher seus candidatos mais rápido do que as mulheres.

Mulheres teriam mais espaço na esquerda
Mas há lideranças europeias de direita
Polarização pode atrapalhar crescimento

A estrutura que conecta e permite troca de informações entre os dois hemisférios cerebrais dos homens é menos densa, contribuindo para que eles cheguem a conclusões mais rapidamente e tenham maior capacidade de concentração.

Essa mesma estrutura nas mulheres é mais densa, o que as levam a processar simultaneamente razão e afeto antes de tomarem suas decisões.

HORMÔNIO DE DIREITA E DE ESQUERDA?

A quantidade de testosterona no organismo masculino, 20 vezes maior do que a registrada em mulheres, é apontada como determinando para a definição das características masculinas, associadas à ambição, competição, autoconfiança e assertividade. Controle e punição seriam o seu foco, o que os identificaria mais com os temas típicos da direita.

Enquanto as mulheres, com seus níveis de ocitocina aumentados e sua busca permanente pela integração de seu entorno, seja a família ou comunidade, teriam maior identificação o cardápio da esquerda.

A luta pela igualdade das mulheres, ao longo da história, acabou atrelando de fato o destino delas ao do socialismo, reconhecia há 71 anos a grande teórica do feminismo moderno, Simone de Beauvoir, em uma de suas principais obras, “O Segundo Sexo”, atual até hoje.

Mas Beauvoir, no entanto, considerava que seria pela ocupação do mercado de trabalho que as mulheres teriam maior chance de conquistar a almejada igualdade de direitos e oportunidades em relação aos homens, independentemente de seu posicionamento ideológico.

”É pelo trabalho que a mulher vem diminuindo a distância que a separa do homem, somente o trabalho poderá garantir-lhe uma independência concreta”, concluiu Beauvoir em 1949.

UMA LUTA ACIMA DAS IDEOLOGIAS

A advogada Luciana Lóssio, ex-ministra do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e uma amiga de longa data, com quem conversei esta semana, considera que a luta pela igualdade de gênero transcende qualquer tipo de ideologia.

Dentro da Ciência Política, Luciana reconhece que as minorias –como mulheres, negros e representantes LGBT– costumam ter mais voz dentro dos chamados partidos de esquerda. No entanto, lideranças femininas como as inglesas Margaret Thatcher e Thereza May ou mesmo a alemã Angela Merkel abrem flancos para o questionamento da teoria que vincula ideologias à luta pela igualdade de gênero.

No campo político, Luciana ressalta o papel preponderante que a Justiça Eleitoral tem tido para assegurar o cumprimento de conquistas antigas das mulheres, como a lei de cotas que teve início há 25 anos, primeiro com 20% e depois com 30%.

Na opinião da ex-ministra do TSE, 2018 teria sido um divisor de águas na luta pela igualdade de gênero na política, após a Justiça Eleitoral destinar às candidatas mulheres pelo menos 30% dos recursos do Fundo Eleitoral, como forma de garantir competitividade às candidaturas estimuladas pelas cotas de gênero.

No ano passado, ao determinar a cassação de toda uma chapa eleitoral a partir da identificação de uma candidatura laranja, a Justiça Eleitoral deu outro passo importante no sentido de desestimular as direções partidárias a driblarem a lei de cotas.

A jurisprudência criada neste caso, segundo Luciana Lóssio, é pedagógica e terá forte reflexo nas eleições municipais deste ano, na medida em que inibirá o lançamento de candidaturas fictícias, uma tática que vinha sendo muito utilizada, sobretudo nas disputas municipais.

Para a ex-ministra do TSE, a condução desse processo por uma mulher, no caso a ministra Rosa Weber, serviu ainda para reforçar a importância da participação feminina nos espaços de poder e decisão do país.

Este ano, antes de passar a presidência do TSE para o colega Luiz Roberto Barroso, Rosa Weber aproveitou ainda uma consulta ao tribunal para recomendar que os partidos observem a cota de 30% também na hora de compor suas executivas e diretórios nacional, estaduais e municipais.

Por enquanto, apenas uma orientação da Justiça Eleitoral que contribuirá para reduzir a hegemonia masculina vigente ainda dentro das estruturas partidárias, que acabam alijando as mulheres das principais decisões dessas legendas.

O que fica cada vez mais claro é que a luta pela igualdade de gênero na política é um caminho sem volta, que terá mais chance de avançar se não for contaminado pelo ambiente de grande polarização travado no país entre a direita e a esquerda.

 

 

 

 

Por Adriana Vasconcelos, 53 anos, é jornalista e consultora em Comunicação Política. Trabalhou nas redações do Correio Braziliense, Gazeta Mercantil e O Globo. Desde 2012 trabalha como consultora à frente da AV Comunicação Multimídia. Acompanhou as últimas 7 campanhas presidenciais.

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