05/10/2020 01:22
Todos os municípios líderes de polos agrícolas no Brasil têm IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) acima da média dos Estados onde se localizam. Vejam algumas referências:
- Rondonópolis tem IDH de 0,755 e Sinop tem IDH de 0,754, contra 0,725 do Mato Grosso.
- Balsas tem IDH de 0,687, contra 0,639 do Maranhão.
- Luiz Eduardo Magalhães tem IDH de 0,716, contra 0,660 da Bahia.
- Rio Verde tem IDH da 0,754, contra 0,735 de Goiás.
- Dourados tem IDH de 0,747, contra 0,729 do Mato Grosso do Sul.
- Araçatuba tem IDH de 0,788, contra 0,783 do Estado de São Paulo.
O IDH superior dos municípios líderes do agronegócio comprova que o efeito multiplicador das atividades geradas no agro beneficia toda a sociedade. A renda agregada se distribui, os empregos indiretos crescem, o comércio se dinamiza. Basta ver o ânimo dos shoppings centers, das revendas de veículos, das oficinas, escritórios, dos inúmeros serviços associados ao mundo rural.
Esse dinamismo econômico provocado pelos modernos polos de agronegócio não é ainda bem entendido pela economia clássica. Nesta, divide-se a economia de um país em 3 setores: primário (agricultura), secundário (indústria) e terciário (comércio). Tal esquematização servia, antigamente, para analisar as economias onde a agricultura era tradicional, a indústria puxava e os serviços começavam.
Acontece que, no Brasil, desde os anos de 1980, as cadeias produtivas ligadas ao agro foram se tornando mais e mais complexas, envolvendo outros setores, de processamento, de insumos e máquinas, de crédito, de tecnologia, chegando até o consumo da população com marcas nas gôndolas do supermercado.
Esse movimento contemporâneo que gerou o atual agronegócio agrega muito valor aos produtos finais. Quando uma tonelada de soja, ou de carne, sai para a distribuição interna, ou é exportada pelo porto, nela está contida elevada dose de tecnologia. Poderosos investimentos em conhecimento foram capazes de elevar a produtividade dos fatores de produção rural, na média dos últimos 40 anos, em cerca de 3,4% ao ano.
Ou seja, não vivemos mais no mundo separado entre indústria e agricultura, e nem esta é mais, como se dizia, primária. Segundo o Cepea/Esalq/USP, o PIB do agronegócio sobre o PIB brasileiro cravou 21,4% em 2019. Esta é a fatia da riqueza brasileira gerada a partir da produção rural.
Nesta fatia, a produção rural, propriamente dita, representa apenas 22% do valor total do agronegócio. Ou seja, lavouras e pecuária, atividades que se praticam dentro da porteira das fazendas, já é parte menor do agronegócio. Incrível.
A agroindústria de processamento (frigoríficos, lacticínios, usinas de açúcar, celulose, torrefação de café) gera valor maior, de 30%, dentro do agronegócio como um todo. Já os chamados agrosserviços (assistência técnica, transporte de cargas, varejo, açougues, quitandas, restaurantes, finanças, propaganda, exportação, etc.), lideram o PIB do agronegócio com peso de 42%.
Resumindo: a produção da roça, hoje em dia, faz movimentar uma roda gigantesca de atividades econômicas, gerando renda e empregos que se espalham pelo país. No século 21, o rural dinamiza o urbano.
Certos economistas tradicionais ainda pensam a agricultura como antigamente. Este é o erro, grave, cometido por Luis Piemonte, em seu artigo publicado , intitulado “País focado no agronegócio será sempre desigual”.
Piemonte pensa que ainda praticamos… “a milenar agricultura, aprendida nos primórdios da humanidade (cujo) caminho normal é confiar apenas na ajuda da mãe terra, jogando nela sementes e esperando que se desenvolvam para colher, ensacar e vender”.
Meu Deus, será que o professor nunca leu nada sobre a evolução tecnológica recente do agro? Já ouviu falar na Embrapa? Em que mundo vive Luis Piemonte?
O Brasil ainda não descobriu a força de seu agro, pois se apega ao raciocínio econômico tradicional e vê apenas rasas commodities onde existe profundo valor agregado. Invertendo o raciocínio de Piemonte, eu diria: o grão de soja agrega tecnologia a cada safra, tal qual o telefone celular agrega funcionalidades ano a ano.
Em termos globais, a Austrália e a Nova Zelândia, países fortemente agrícolas, mostram elevado IDH, ocupando respectivamente o 6º e o 14º lugar no ranking mundial de qualidade de vida.
Conclusão: não é verdade que um “país focado no agronegócio será sempre desigual”. Cqd.
Por Xico Graziano, 67, é engenheiro agrônomo e doutor em Administração. Foi deputado federal pelo PSDB e integrou o governo de São Paulo. É professor de MBA da FGV e sócio-diretor da e-PoliticsGraziano.