12/10/2020 13:36
”33% das candidaturas são de mulheres
Cota mínima é de 30% para o gênero”
A despeito do registro de um número recorde de mulheres nas eleições municipais deste ano, próximo de 180.000 candidatas, em termos percentuais o que se vê é que a cota mínima de 30% de vagas para cada gênero acabou sendo encarada como teto para as candidaturas femininas por parte dos dirigentes partidários.
Este ano, por exemplo, a cada 10 candidatos a prefeito, apenas uma é mulher. Em 9 partidos, os homens representam 90% das candidaturas para o Executivo municipal. Entre os demais, o que lançou mais mulheres candidatas ficou na faixa de 41%.
Esse quadro tem um reflexo direto no resultado da eleição e justifica os números registrados na disputa eleitoral de 2016, pelos quais apenas 11,5% das prefeituras brasileiras são geridas por mulheres.
Dos 21 partidos que lançaram chapas para a Câmara Municipal este ano, as mulheres representam 34% do total de candidatos a vereador registrados pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Um aumento de 2 pontos percentuais em relação a eleição passada.
Resta saber se os 30% dos recursos do Fundo Eleitoral, destinados obrigatoriamente pela Justiça Eleitoral para o financiamento de candidaturas femininas, terá o mesmo efeito registrado em 2018, após a decisão do TSE.
O suporte financeiro às candidaturas femininas foi apontado como um dos responsáveis pela eleição da maior bancada de deputadas federais da história da Câmara: que pulou de 51 para 77 parlamentares.
Algumas legendas chegaram a registrar um aumento acima de 60% na sua representação feminina na Câmara, enquanto o número de deputados eleitos caiu drasticamente. Esse foi o caso do PSDB, por exemplo, que tem hoje a maior bancada feminina entre todos os partidos da Casa.
Em alguns estados, como o Distrito Federal, as mulheres passaram a ser a maioria entre os representantes eleitos para o Legislativo, com 5 deputadas, numa bancada de 8 parlamentares, e uma senadora.
INFLUÊNCIA LIMITADA
Se as candidaturas laranjas foram a alternativa encontrada por parte das legendas para driblar as exigências da legislação eleitoral, 2 anos depois os dirigentes partidários sofisticaram suas estratégias para não perderem o controle do financiamento público de campanha.
Muitos partidos se organizaram para limitar internamente a influência dos segmentos femininos na definição do destino dos recursos do Fundo Eleitoral. A grande maioria está sendo impedida de definir como esse dinheiro será usado ou mesmo de indicar as candidatas beneficiadas.
MAIS UM DRIBLE?
Foi registrado também um aumento no número de candidatos negros. Pela primeira vez, na história do país, teremos mais candidatos negros (49,9%) do que brancos (47,9%).
Porém, não passou despercebido que 21 mil candidatos que disputaram as eleições de 2016 mudaram sua declaração de cor. A maior parte deles, 36%, de branco para parda, e 22% de pardo para preto. Outros 30% mudaram de pardo para branco.
Ainda que os protestos contra o racismo, que eclodiram pelo mundo, possam ter colaborado para que parte desses candidatos se reconhecessem como negros, tal mudança coincidiu com o debate no STF (Supremo Tribunal Federal) sobre a divisão proporcional das verbas de campanha entre brancos e negros.
No início de setembro, o ministro Ricardo Lewandowski concedeu uma liminar determinando a imediata entrada em vigor da decisão do TSE, que garantiria a divisão proporcional das verbas de campanha entre brancos e negros, mas só em 2022. Liminar, aliás, referendada essa semana pelo plenário do STF.
‘QUERO VOCÊ ELEITA’
Da mesma forma que registramos movimentações para frear a participação feminina na política, é possível encontrar na sociedade civil mobilizações de esforços no sentido contrário.
Com o objetivo de converter candidaturas femininas em mandatos, a advogada Gabriela Rollemberg se uniu a 2 outras mulheres para criar uma startup de impacto social e suprapartidária: ‘Quero você eleita’.
A ideia é garantir um suporte profissional e emocional para candidatas a prefeitas ou vereadora.
Por meio de lives diárias de meia hora, pelo menos 200 candidatas de diferentes partidos já estão sendo atendidas pela equipe de consultores da startup, recebendo orientações para a definição de suas estratégias política, jurídica, motivacional e digital, mediante pagamento simbólico de R$ 2,00.
“Além de não prepararem lideranças femininas para enfrentar as eleições, há partidos que boicotam candidaturas de mulheres que possam ameaçar a eleição de homens. São inúmeros os relatos de mulheres que, mesmo com mandato, foram obrigadas a trocar de partido, pois corriam o risco de ficar sem legenda”, destaca Gabriela Rollemberg, uma das fundadoras da startup.
Ou seja, as cotas de gênero no Brasil ainda estão longe de garantir uma igualdade de oportunidades entre homens e mulheres na política. E hoje funcionam quase como um teto para as candidaturas femininas. Sem elas, o quadro poderia ser ainda pior.
Por Adriana Vasconcelos, 53 anos, é jornalista e consultora em Comunicação Política. Trabalhou nas redações do Correio Braziliense, Gazeta Mercantil e O Globo. Desde 2012 trabalha como consultora à frente da AV Comunicação Multimídia. Acompanhou as últimas 7 campanhas presidenciais. Nos últimos 4 anos, especializou-se no atendimento e capacitação de mulheres interessadas em ingressar na política.