28/10/2020 13:45
A pouco menos de uma semana para a eleição presidencial nos Estados Unidos, as pesquisas são unânimes ao apontar larga vantagem (em torno de 10 pontos percentuais) para o democrata Joe Biden. Mais importante: elas indicam também boa folga para o desafiante sobre o republicano Donald Trump no colégio eleitoral.
Dirão o leitor e a leitora que em 2016 as pesquisas também projetavam isso, e no final deu Trump.
Verdade, mas só até certo ponto. Em primeiro lugar, porque a dianteira de Biden agora é bem maior que a de Hillary Clinton na época. Em segundo, porque as empresas de pesquisa aperfeiçoaram seus métodos. E em terceiro, porque os levantamentos nos estados-chave confirmam até o momento a tendência.
Mas sempre é bom esperar a urna, pois o velho ditado sempre nos lembra que dela pode sair qualquer coisa. De todo modo, diante dos números, é bom começar a especular o que pode mudar para o Brasil, para melhor ou para pior, caso a tendência das pesquisas se confirme e Donald Trump seja mandado de volta para casa, em Nova York ou na Flórida.
As relações especiais entre o Brasil e os Estados Unidos, mais particularmente entre Jair Bolsonaro e Donald Trump, parecem ser um eixo organizador da atual política exterior brasileira. E desde janeiro de 2019 o Brasil vem abandonando a política externa construída a partir de meados do regime militar, de um certo não-alinhamento.
Os resultados econômicos por enquanto não chegam a ser estimulantes, ao contrário, mas esta parece ser uma preocupação secundária em Brasília. Os aspectos ideológicos e geopolíticos têm falado mais alto. O Brasil vem aceitando sofrer por enquanto nas relações econômicas desde que Trump se reeleja e assim reforce-se o apoio dele por aqui.
O que pode mudar com Biden? Bem, talvez seja precipitação imaginar um confronto aberto e definitivo. Se as relações com os Estados Unidos são importantes para o Brasil, e mais ainda para o atual governo, boas relações com o Brasil também são essenciais para a Casa Branca. Inclusive porque se o Brasil “cuida” das redondezas é um problema a menos para Washington.
E no principal desafio atual para os americanos, a tendência a serem deixados para trás pela China, não consta que Biden vá ser mais, digamos, relaxado. Talvez mudem algumas táticas, mas o objetivo permanecerá. E garantir que o Brasil não seja estimulado a trocar Washington por Beijing nas preferências continuará sendo vital para a potência do norte.
O nó mais complicado talvez esteja mesmo na questão ambiental, em que Biden quererá mostrar serviço para 1) agradar à base e 2) garantir que outros países não se aproveitem de uma eventual rigidez ambiental dos Estados Unidos para ganhar espaço econômico sobre os americanos. Mas será que isso vai ser suficiente para deteriorar as relações com o Brasil?
Improvável. Há um amplo leque de possibilidades intermediárias para um acordo, especialmente porque chegar a um acordo interessará a ambos. E o governo brasileiro, inclusive e antes de tudo Jair Bolsonaro, tem mostrado inusitado apetite por recuos e acordos quando o que está em jogo é a sobrevivência política.
Dificilmente o governo vai dormir no ponto e abrir espaço para que outros, nos mais diversos pontos do espectro político, apresentem-se como mais capazes de bem conduzir as relações por aqui com os Estados Unidos. Inclusive porque não faltam candidatos a desempenhar esse papel na improvável alternativa Jair Bolsonaro desejar abandoná-lo.
Por Alon Feuerwerker, 63 anos, é jornalista e analista político e de comunicação na FSB Comunicação. Militou no movimento estudantil contra a ditadura militar nos anos 1970 e 1980. Já assessorou políticos do PT, PSDB, PC do B e PSB, entre outros. De 2006 a 2011 fez o Blog do Alon. Desde 2016, publica análises de conjuntura no blog alon.jor.br.