08/12/2020 17:16
Países buscam projetos para usar fonte
América Latina pode ser fundamental
A possibilidade do uso de hidrogênio como alternativa energética vem ganhando destaque em razão da sua confiabilidade na geração de energia, além da sua digital ambiental. Na Cúpula de Osaka em 2019, os líderes do G20 enfatizaram que o desenvolvimento de tecnologias para o uso do hidrogênio serão muito relevantes para permitir uma transição para um mundo de zero emissões. Desde que o Japão publicou sua Estratégia Básica de Hidrogênio em 2017, vários outros governos, como o da Espanha, Alemanha e Holanda, bem como a Comissão Europeia vem apresentando estratégias e buscando desenvolver tecnologias e projetos para o hidrogênio. Dentro deste contexto, a América Latina pode se tornar um contribuinte fundamental para o impulso global em direção ao hidrogênio de baixo carbono.
Apesar de ser o elemento químico mais comum do universo, ele não aparece na sua forma pura, como fonte primária de energia tão facilmente. Na separação do hidrogênio de outros elementos, é necessária a realização da eletrolise, ou seja, uma corrente elétrica precisa ser descarregada na água para separar os átomos de hidrogênio (H2) de Oxigênio (O). Isso significa dizer, que para obtermos hidrogênio, precisamos de energia. Nesse sentido, podemos classificar o hidrogênio a partir da fonte de energia usada para a obtenção do energético. Assim, caso a eletrolise seja feita pelo uso do carvão teremos Hidrogênio Cinza; pelo uso do gás natural, Hidrogênio Azul; e com o uso de energias renováveis, o Hidrogênio Verde. Hoje, menos de 0,1% da produção global de hidrogênio dedicado vem da eletrólise da água, com custos decrescentes para eletricidade renovável, em particular de energia solar fotovoltaica e eólica. Portanto, ainda são necessários muitos avanços tecnológicos nesse sentido, para que o Hidrogênio Verde possa ser mais competitivo que combustíveis fosseis como o gás natural.
Acontece que não só através da eletrolise podemos obter hidrogênio, hoje, em razão de fatores tecnológicos e econômicos. o gás natural é, atualmente, a principal fonte de produção de hidrogênio, respondendo por cerca de três quartos da produção anual global, de cerca de 70 milhões de toneladas. Isso representa cerca de 6% do uso global de gás natural. O gás é seguido pelo carvão, em razão do seu papel dominante na China, e uma pequena fração é produzida a partir do uso de petróleo e eletricidade. Grande parte do hidrogênio produzido no mundo vem a partir de gás natural, ou seja, basicamente metano.
As discussões em torno do uso do hidrogênio como possibilidade futura de vetor energético estão crescendo. Por ser apontado como mais uma opção que traga segurança energética e redução dos impactos ambientais constituem os principais motivadores para o avanço na mudança de paradigma do setor energético. No entanto, o caminho para transição energética atual para uma baseada no hidrogênio e outros combustíveis alternativos é longa. Isso, porque há de se considerar barreiras técnicas, econômicas e institucionais a serem ultrapassadas. O hidrogênio é difícil de se transportar e armazenar, por exemplo.
Na América Latina, uma abordagem regional colaborativa para o hidrogênio poderia complementar as iniciativas nacionais, permitindo aos países captar complementaridades nos padrões de demanda e produção, e desbloquear sinergias no uso e desenvolvimento da infraestrutura. Essa abordagem estaria alinhada com os desenvolvimentos em outras partes do mundo, por exemplo, entre os países ao redor do Mar do Norte (Noruega, Dinamarca, Alemanha, Países Baixos, Bélgica, França e Reino Unido). Para que isso aconteça, o diálogo e a colaboração regionais são fundamentais para garantir que as regulamentações sejam harmonizadas e que os mercados de energia convirjam.
A produção e o uso do hidrogênio na América Latina estão limitados a alguns países, onde é usado principalmente como matéria-prima para refinarias e indústria química, como em outras partes do mundo. Muitos países estão avançando com estratégias e projetos-piloto para promover seu uso como fonte primaria na geração de energia.
Embora os esforços iniciais possam se concentrar na redução das emissões associadas ao uso de hidrogênio existente, vários países estão de olho no potencial do hidrogênio para descarbonizar o transporte, especialmente frotas pesadas e de transporte público, bem como oportunidades para exportar hidrogênio de baixo carbono para mercados fora da região. Porém, críticos afiram que essa tarefa pode não ser tão fácil. Um carro elétrico converte 86% energia para movimentar o veículo, enquanto um carro movido a hidrogênio possui uma eficiência de apenas 45%.
Vários países latino-americanos, incluindo Argentina, Brasil, Colômbia e México, compartilham muitas das características que os tornam candidatos para a produção competitiva do hidrogênio verde. No front tecnológico, a Argentina tem sido pioneira região. Desde 2008, o projeto Hychico na Patagônia produz hidrogênio verde por um dos primeiros parques eólicos do país. No Brasil, o desenvolvimento de tecnologias para a economia do hidrogênio pode contribuir para uma utilização mais eficiente das fontes energéticas renováveis, de ampla participação na matriz.
O uso de hidrogênio hoje é dominado pela indústria (refino de petróleo, produção de amônia, produção de metanol e produção de aço). Ou seja, praticamente toda a produção é feita através dos combustíveis fósseis, existindo um grande potencial para o futuro hidrogênio verde.
Para fazer jus ao seu potencial e impulsionar a transição energética para um mundo de baixo carbono, o desenvolvimento do hidrogênio deve se concentrar não apenas na produção, mas também na construção da cadeia de abastecimento geral necessária e um ambiente de mercado favorável. Isso significa apoiar a inovação e o desenvolvimento de tecnologia, especialmente para usos finais do hidrogênio. A infraestrutura e os arranjos institucionais precisam ser desenvolvidos. São necessários regulamentação, estruturas de mercado e governança robustas.
Por isso, uma abordagem regional, envolvendo um amplo espectro de partes interessadas, mas especialmente reguladores de energia, é fundamental para permitir que a América Latina explore as sinergias na produção futura de hidrogênio. Esse diálogo também é essencial para fomentar o comércio regional e global de hidrogênio, harmonizando padrões e códigos internacionais.
Adriano Pires, 62 anos, é sócio-fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE). Doutor em Economia Industrial pela Universidade Paris XIII (1987), Mestre em Planejamento Energético pela COPPE/UFRJ (1983) e Economista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1980). Atua há mais de 30 anos na área de energia.
Pedro Rodrigues, 32 anos, é advogado, sócio do Centro Brasileiro de Infraestrutura e sócio-fundador do CBIE Advisory. Idealizador e apresentador do Canal Manual do Brasil.