19/04/2021 09:10
Zoneamento fará grassar a miséria
Área de Mato Grosso está em risco
Pode estar fadada ao empobrecimento
Voltei ao Vale do Araguaia neste final de semana. Fui a Cocalinho, ao Sul daquela região, conhecer a proposta do Zoneamento Ecológico Econômico do Mato Grosso (ZEE). Reafirmei minha impressão anterior, quando estive mais ao Norte, em São Félix do Araguaia: o ambientalismo retrógrado, visão que domina o ZEE, fará grassar a miséria por ali.
Uma enorme área, abrangendo 17 municípios, com cerca de 4 milhões de hectares, estará fadada ao empobrecimento se forem aprovadas duas ideias expressas no ZEE:
a) somente a “pecuária extensiva” poderia ser explorada no espaço do agro em todo esse perímetro do Vale do Araguaia;
b) um novo Parque Estadual, com aproximadamente 400 mil hectares, tomaria conta de quase todo o município de Cocalinho.
O pressuposto da primeira proposta – a da pecuária extensiva – se assenta na interpretação de que aquele território é composto, na integra, por “áreas úmidas”, e portanto deveriam ser impedidas ao uso agropecuário, seja para a pecuária tecnológica, seja para a produção de grãos, cereais ou fruticultura.
É fato que boa parte daquelas terras são alagadas na época das abundantes chuvas, de dezembro a março. Denominadas de “varjões”, ou “terras baixas”, realmente se configuram como áreas mais frágeis do ponto de vista ecológico, exigindo modernas práticas agropecuárias para garantir sua sustentabilidade.
Sustentabilidade, nesse caso, nada tem a ver com a prática tradicional da pecuária, aquela que somente utiliza as gramíneas nativas dos varjões, e exigem a colocação anual de fogo – sim, fogaréu – para renovar a massa verde do capim e permitir a alimentação do gado.
Pastagens que visitei, nas quais os produtores haviam plantado gramíneas melhoradas, próprias para solos úmidos, a produtividade do gado saltou de 0,5 para 2,0 @/ha/ano, ou seja, multiplicou 4 vezes. E mais. A instalação da nova pastagem ocorreu com a técnica do plantio direto, quer dizer, sem haver revolvimento do solo. Mais ainda. Nunca mais se precisou queimar a pastagem.
Conclusão: a pecuária tecnológica, quando implantada, manteve as características básicas do agroecossistema, trazendo ganho zootécnico, ambiental e de sustentabilidade, que inclui a economia.
Em Cocalinho, ademais, se organizou a “Liga do Araguaia”, formada por pecuaristas avançados que investem na agenda do baixo Carbono. Seguem eles as orientações da “Carne Carbono Neutro”, um protocolo de certificação desenvolvido pela Embrapa. Exemplares, tais produtores rurais estão antenados nas mudanças de clima.
Quem conhece essa realidade comprova que o avanço tecnológico, quando bem aplicado, favorece, e não atrapalha, a conservação ambiental. O ambientalismo retrógrado, e portanto o ZEE do Mato Grosso, não consegue entender essa vantagem da moderna produção rural do século 21.
Quanto à segunda proposta – a criação de novo Parque – impressionou-me que, naquelas bandas onde estive, o território está ocupado com variadas atividades, não apenas agropecuárias, mas com minerações de calcáreo, estradas asfaltadas e, inclusive, um trajeto já demarcado da FICO, a ferrovia de integração do Centro-Oeste, que fará a ligação com a ferrovia Norte-Sul. Toda essa infraestrutura produtiva se encontra dentro da área da suposta nova unidade de preservação ambiental.
Se você não entendeu, saiba que nem eu nem ninguém com quem conversei por lá também não entendemos nada. Como que se pretende criar um grande unidade de conservação onde impera a economia produtiva e se situa a malha logística do país?
Conclusão: o ZEE está propondo um Parque de papel. Para não dizer um Parque de maluco.
No Vale do Araguaia – e isso eu fui lá testemunhar – existem não apenas grandes fazendeiros. Dezenas de projetos de colonização fundiária e de reforma agrária funcionam há 15, 20 anos, gerando ocupação e renda para milhares de famílias. Todos se empobrecerão se for aprovado o ZEE tal como proposto.
O antigo “vale dos esquecidos” começou a se transformar em uma fronteira de prosperidade no interior do Brasil. Mas o ZEE do Mato Grosso não reconhece esse progresso. Mira no passado. Suas proposições contemplam o século 20. Sua visão preservacionista é antiga, teme o avanço tecnológico. E namora a miséria rural.
O ZEE do Mato Grosso, sinceramente, não defende a sustentabilidade.
Por Xico Graziano, 67, é engenheiro agrônomo e doutor em Administração. Foi deputado federal pelo PSDB e integrou o governo de São Paulo. É professor de MBA da FGV e sócio-diretor da e-PoliticsGraziano. É o atual secretário do Meio Ambiente de IlhaBela.