Opinião – Afinal, o que é ‘centrão’?

05/08/2021 09:03

”Até para melhor explicar os comportamentos adotados pela direita e a esquerda brasileira”

Uma das expressões mais usadas na política brasileira é “centrão”, como definição de partidos aglutinados por interesses pontuais, sem ideologia, ou compromissos éticos.

Nesse torvelinho de acusações recíprocas fica difícil separar o “joio do trigo”.

É o caso de indagar: afinal, o que vem a ser direita, esquerda e centro?

A divisão esquerda e direita teve origem na Revolução Francesa.

Na época da Assembleia Nacional Constituinte (1789-91), os grupos conservadores sentavam no lado direito, enquanto os mais radicais, ocupavam o lado esquerdo do plenário.

O centro seriam aqueles com postura moderada, diante de questões que dividem o país.

Partidos de centro podem, por exemplo, buscar equilíbrio entre o Estado e o mercado na economia.

As extremas esquerda e direita se unem e desqualificam o centro, acusando de indefinidos e “mornos”.

A prova disso foi a recente “união” de Lula e Bolsonaro, juntos, fazendo declarações contrárias ao surgimento da ”terceira via” na disputa presidencial.

Em todas as democracias existem direita, esquerda e centro.

O termo “centrão” é típico da política brasileira. Foi criado na Constituinte de 1988, quando grupo de parlamentares procurava impor vetos a propostas mais avançadas e progressistas.

Identificou-se na mídia, que “centrão” significava vender “apoio” aos governantes, em troca de vantagens.

Entretanto, curioso é que no cenário político brasileiro, após a redemocratização, “todos os partidos”, tidos como direita ou esquerda”, buscaram (e buscam) alianças com o “centrão”.

Atualmente, o chamado “centrão” abriga, em rodízios permanentes, parlamentares do PP, Republicanos, Solidariedade, PTB, MDB, PL, DEM, PSD, PROS, PSC, Avante, Patriota.

O maior exemplo de prestígio ao “centrão” foi Lula em 2022 escolher o empresário José de Alencar do PL para aliado e o indicou como seu vice.

Agora, todo o dia ouve-se que os petistas defendem um nome de centro para companheiro de chapa do ex-presidente.

Aliás, com a defesa dessa estratégia, o PT demonstra coerência política.

Os governos petistas nunca foram de esquerda

Todos eles envolveram alianças amplas, que iam da direita até a centro esquerda.

Henrique Meireles, símbolo do capitalismo internacional por presidir à época um banco norte-americano, integrou o governo Lula como presidente do Banco Central.

Sob o aspecto de redistribuição de renda, os governos Lula e Dilma subsidiaram o capital muito mais do que a política social do país. É só conferir as cifras financeiras.

No outro polo da política nacional contemporânea, o presidente Bolsonaro é acusado de unir-se ao “centrão”, incorporarando ao seu governo. líderes do PP, PL, PTB e DEM.

Faz o que Lula e Dilma fizeram e ele condenou, chamando de “velha política”;

Ciro Gomes do PDT, herdeiro do brizolismo, anuncia que deseja aproximar-se do centro para disputar a presidência pela quarta vez.

Essas posturas políticas exigem que definitivamente haja uma distinção clara do que seja “centro” e “centrão”.

Até para melhor explicar os comportamentos adotados pela direita e a esquerda brasileira.

O “centro político” é posição legítima de moderação e equilíbrio e não traz consigo o sentido pejorativo, que muitos radicais lhe atribuem.
“Centrão” é outra coisa.

Essa denominação, como já citado, teve no passado o endereço certo de apontar práticas fisiológicas usadas durante a Constituinte de 88, pela direita e a esquerda.

Em nome da verdade dos fatos, “centrão” não existe apenas nos partidos de direita.

Há múltiplos exemplos de comportamentos antiéticos também em legendas de esquerda, tais como, PT, PSB, PDT e outros.

A Lava Jato mostrou esse retrato, sem retoques.

É recomendável, portanto, “separar o joio do trigo” para evitar contradições, incoerências e, sobretudo, injustiças com aqueles que assumem posições legítimas de centro democrático.

Em relação aos atuais partidos brasileiros seria o caso de lembrar a expressão bíblica: “aquele que não tiver pecado, atire a primeira pedra”.

 

 

 

 

ney lopesPor Ney Lopes  jornalista, advogado, ex-deputado federal; ex-presidente do Parlamento Latino Americano (PARLATINO); e- Presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara; procurador federal; professor de Direito Constitucional da UFRN – [email protected] – blogdoneylopes.com.br

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