Opinião – Política ambiental e segurança alimentar andam juntas

03/12/2021 05:50

”Crise do clima afeta a sazonalidade dos alimentos e impacta os preços”

Plantação de milho no Centro-Oeste. Foto: Sergio Lima

Em 2021, a imensa maioria dos brasileiros sentiu o orçamento apertar, tanto em função do aumento na conta de luz como da inflação dos alimentos, que disparou. Um dos fatores que tem impactado frontalmente o bolso dos brasileiros –em ambas as situações– são as mudanças climáticas, que causaram a maior seca dos últimos 100 anos –acelerada pelas queimadas na Amazônia, Cerrado e Pantanal– e prejudicaram gravemente o abastecimento das hidrelétricas e a produção agrícola.

Esse último ponto é especialmente sério: a crise do clima vem afetando a sazonalidade dos alimentos com impactos preocupantes na oferta, no preço e, sobretudo, na segurança alimentar da população, e mesmo os eventos climáticos extremos em países distantes reverberam no Brasil.

Em 2020, por exemplo, as secas que atingiram a região produtora de arroz na Tailândia causaram queda de 25% na produção da commodity local, o que gerou uma demanda inédita pelo grão brasileiro. E esta tem sido uma constante. São geadas, queimadas, secas e enchentes que têm mudado a ordem natural da oferta e demanda, elevando os preços em períodos que comumente seriam de deflação para determinados produtos e causando até a escassez de alguns alimentos.

O efeito das mudanças climáticas sobre a cadeia produtiva é pauta institucional para o setor supermercadista porque se tornou um assunto incontornável que traz consigo o risco da insegurança alimentar. Todo esforço é necessário para diminuir a emissão dos gases de efeito estufa.

Neste sentido, desde 2015 a APAS (Associação Paulista de Supermercados) é signatária do Pacto Global da ONU, quando alinhamos as metas do setor supermercadista aos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) da ONU.

Aderimos ao Acordo Ambiental São Paulo e temos ajudado a moldar o debate empresarial na câmara de mudanças climáticas da Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo). Aderente ao Protocolo de Montreal em consonância com a Emenda de Kigali, o setor tem se esforçado na manutenção e troca dos equipamentos que utilizam os fluidos refrigerantes HCFC (hidroclorofluorcarbonos) e HFC (hidrofluorocarbonetos), gases que agravam o aquecimento global.

Em meio a este contexto, por mais que possa parecer difícil combater um problema tão extenso e complexo, vale notar que as políticas públicas podem fazer a diferença. Exemplo disso foi a lei municipal de São Paulo que proibiu a distribuição gratuita de sacolas plásticas nos supermercados e criou um novo modelo reutilizável que vem sendo comercializado a preço de custo desde 2015.

Essa mudança de hábito reduziu em 84,4% o uso das sacolas plásticas na cidade de São Paulo. Traduzindo em ganhos ambientais, anualmente 94,25 mil toneladas de CO2 deixaram de ser lançadas na atmosfera e 27,5 mil toneladas de resíduos sólidos de plásticos deixaram de poluir os rios e córregos paulistanos, não se acumularam nos aterros sanitários e não se degradaram em gás metano e etileno quando expostos às condições climáticas. Esta lei municipal tem inspirado governantes e foi adotada em plenitude nos Estados do Rio de Janeiro e do Pará, que tornaram-se exemplos a seguir.

Todo esforço que contribua para a diminuição de gases de efeito estufa é bem-vindo e necessário, principalmente se houver mudança de hábito e conscientização, pois a educação ambiental é um ativo dos países desenvolvidos. De acordo com o IPCC (Painel Intergovernamental sobre as Mudanças Climáticas), se a emissão dos gases de efeito estufa não for mitigada, em só 8 anos a temperatura média na Terra aumentará 1,5 °C.

Mais do que perigoso, será irreversível. Os eventos climáticos extremos serão cada vez mais frequentes e trarão prejuízos ainda maiores para a sazonalidade e a disponibilidade dos alimentos, colocando em risco a segurança alimentar em nosso planeta, principalmente das pessoas que vivem nos países subdesenvolvidos e em desenvolvimento, como o Brasil.

Diante do desafio postulado pela COP26, para acelerar a agenda ESG (sigla, em inglês, para questões ambientais, sociais e de governança corporativa) e diminuir os impactos dos eventos climáticos extremos que têm comprometido a segurança alimentar em todo o mundo, é necessário que uma liderança ocupe o vácuo existente na política ambiental brasileira e dialogue com os setores da economia.

Assim, conduzir o nosso país pelos caminhos do desenvolvimento sustentável, viabilizando políticas públicas que diminuam a emissão dos gases de efeito estufa, estimulando a conscientização para a preservação do meio ambiente e criando novos hábitos para que a sociedade seja a verdadeira protagonista das mudanças que a Terra precisa.

 

 

 

 

Por Ronaldo dos Santos é presidente da Associação Paulista de Supermercados (Apas) e vice-presidente da Rede de Supermercados Covabra. Cursou Economia e Administração, possui MBA pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e atuou ao longo de toda a sua trajetória profissional no segmento de varejo alimentar.

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