Opinião – O ICMS do diesel

Embora com o ICMS congelado e com a alíquota reduzida para 16%, de novembro para cá o diesel saltou 32%! Se o remédio ministrado está errado, não há como esperar a cura do mal que aflige a flutuação de preços dos combustíveis no país, escreve Rogério Gallo

 

27/03/2022 13:31

”Lei inovou ao determinar alíquota única para todo o território nacional”

Imagem: reprodução.

Há poucos dias, foi publicada a Lei Complementar (Federal) n° 192, de 11 de março de 2022 (LC 192/22), alterando a forma de cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre a gasolina, o etano anidro, o diesel, o biodiesel o gás liquefeito de petróleo ( gás de cozinha), inclusive o derivado de gás natural.

A referida lei altera a modalidade da alíquota incidente sobre o ICMS, que deixa de ser um percentual sobre o valor atual do combustível vendido ao consumidor final, denominada tecnicamente de alíquota ad valorem, para ser um valor específico por litro do combustível, a chamada alíquota ad rem.

A lei também inovou ao determinar que a alíquota seja única para todo o território nacional, desprezando o fato de que, em cada estado da federação, há um preço de combustível, em razão de custos logísticos (o Estado do Acre, por exemplo), e também diferentes alíquotas (desde 12% até 18%). Assim, na fixação de uma alíquota única para todo o país, qual deveria ser a alíquota ad rem por litro do diesel? A menor carga de ICMS praticada em uma unidade federativa? A maior? A média?

Se fosse pela menor, Estados que praticam, por exemplo, alíquotas de 18% teriam uma redução brutal de arrecadação de ICMS, inviabilizando a execução de seus orçamentos. Se fosse pela maior, Estados cuja alíquota é de 12% a 16% teriam aumento de carga tributária e do diesel na bomba dos postos. Caso fosse a média, Estados que tributam abaixo da média ainda teriam aumento de carga tributária e os que têm tributação acima perderiam receita.

Em virtude das peculiaridades regionais que marcam a federação brasileira, não é à toa que a Constituição Federal (CF) distribuiu as competências do Congresso Nacional e do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), colegiado formado por todos os secretários de Fazenda dos Estados e presidido pelo ministro da Economia, para definir a incidência do ICMS sobre combustíveis.

No caso do Congresso Nacional, de acordo com o art. 155, § 2°, XII, “h”, da CF, caber-lhe-ia apenas definir quais combustíveis o ICMS incidiria uma única vez (incidência monofásica), retirando-os da regra geral que preconiza a incidência sobre o valor adicionado em cada etapa de comercialização do produto. Ao CONFAZ, por expressa disposição do art. 155, § 4°, IV, da CF, caberia estabelecer a modalidade de alíquota (se ad valorem ou ad rem) e a sua aplicação uniforme para todos os estados. O mesmo valor por litro ou o mesmo percentual sobre o valor de venda do combustível.

A LC 192/22 estabeleceu a incidência monofásica. Está no seu papel. Entretanto, foi além. Avançou o sinal e rasgou a Constituição Federal ao usurpar a competência do CONFAZ e fixar a alíquota ad rem como a incidente, de modo uniforme em todo o país, sobre os combustíveis derivados de petróleo e biocombustíveis (exceto o etanol hidratado).

Para o diesel, a LC 192/22 foi ainda mais forte na violência ao pacto federativo: Dispôs que, enquanto não disciplinada a alíquota ad rem, deveria ser definida como base de cálculo do ICMS a média móvel dos últimos 60 meses, colocando sob forte ameaça as contas públicas estaduais e municipais.

O CONFAZ, apesar da inconstitucionalidade, disciplinou a alíquota ad rem sobre o diesel em reunião realizada nesta quinta-feira, 24 de março de 2022. A partir de 1° de julho entrará em vigor a alíquota específica única (ad rem) sobre o diesel, que será equalizada, de acordo com o convênio, de tal modo a alcançar o mesmo valor do ICMS por litro praticado em 1° de novembro de 2021 em cada estado.

Não haverá aumento de ICMS sobre o diesel. O valor praticado pelos Estados será o mesmo de 1° de novembro de 2021, quando o ICMS foi congelado. Aliás, quem pode garantir que os preços dos combustíveis serão controlados? Em Mato Grosso, embora com o ICMS congelado e com a alíquota reduzida para 16%, de novembro para cá o diesel saltou 32%! Se o remédio ministrado está errado, não há como esperar a cura do mal que aflige a flutuação de preços dos combustíveis no país.

 

 

 

 

 

Por Rogério Gallo é procurador e secretário de Fazenda do Estado.