Opinião – A vitória da inflação em 2022 e a retomada econômica mundial

Portanto, o combate à inflação não será bem-sucedido em 2022 devido ao conflito na Ucrânia, mas a retomada da economia mundial em 2022 deve continuar inabalável…escreve Ricardo Caldas

13/05/2022 06:22

”…com redução generalizada do desemprego, mas não dos gastos sociais”

Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Aos poucos, o ano de 2022 vai se mostrando: um ano turbulento, repleto de ações inesperadas, levando o mercado para mares antes nunca navegados. Com efeito, o ano de 2022 se iniciou com a ressaca da inflação mundial, recorde em todo mundo, com os Estados Unidos com mais de 7,0% de inflação, acumulada em 8% em abril, a maior em 40 anos; o Brasil, com mais de 10%, acumulada de 12% em abril, a maior desde o fatídico ano de 2015; Turquia com cerca de 36%, maior em 20 anos e Argentina com mais de 50%, maior índice em 20 anos.

Os economistas anunciaram, com alguma pompa – e certa dose de razão, tem-se que admitir – que o ano de 2022 seria o ano de combate à inflação e que, portanto, a economia mundial caminhava para uma recessão global.

Tais economistas esqueceram-se apenas que os fatores que geraram a inflação em 2021 continuavam atuantes, notadamente os aumentos nos combustíveis (leia-se barril do petróleo) e energia, incluindo eletricidade e outras fontes de energia. Além disso, tais fatores não apenas continuaram vivos em 2022, como ganharam força após a invasão da Ucrânia. Ou seja, as perspectivas de redução de inflação em um ano de alta no preço dos barris do petróleo – como foi em 2021 e continua sendo em 2022 – seriam ínfimas. Aliado a esse fato, a maioria dos governos ocidentais, por questões políticas e eleitorais, não apenas não desmantelaram o sistema de auxilio criado durante o combate à Covid, como o expandiram, como foi o caso dos EUA e do Brasil, entre outros países.

Resultado: como a inflação parecia inevitável em 2022, o discurso oficial de combate à inflação foi gradualmente trocado por um discurso acerca da necessidade de manter o tecido social intacto pós-Covid. Sob esse pretexto, os Estados Unidos lançaram um dos maiores, se não o maior, programa de apoio à uma doença contagiosa na história, de mais de US$ 1 trilhão e, ao menos inicialmente, com apoio suprapartidário. O Brasil não ficou atrás. Estima-se que o país tenha gastado cerca de R$ 1 trilhão com a pandemia, dos quais R$ 353 bilhões foram para o pagamento do Auxílio Emergencial e o restante em transferências para estados e municípios, fortalecimento ou adaptação da rede hospitalar, ações diretas e programas de apoio às MPEs, como o Pronampe. Isso equivale, no total, a cerca de 8,6% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.

O aspecto interessante a observar é que os governos gostaram dos resultados políticos do apoio social no combate à Covid em 2020, não combateram a inflação em 2021, e certamente não vão combatê-la em 2022 por uma razão muito simples: o nível de emprego cresceu em vários países do mundo (como EUA, Brasil e França, por exemplo) e os governos centrais não querem que essa situação mude. Com efeito, a taxa de desemprego nos EUA caiu para 3,9% em dezembro de 2021, 7,4% na França (menor taxa em quase uma década) e 11,1% no Brasil no mesmo período, após ter chegado a 14,8% em abril de 2021.

É fato que a retomada econômica no mundo todo, inclusive no Brasil, o qual cresceu 4,6% em 2021, pressionou os preços do barril do petróleo, que saltaram de cerca de US$ 40 a US$ 50 em janeiro de 2021 para cerca de US$ 80 em dezembro do mesmo ano. É certo que a invasão da Ucrânia também pressionou os preços do barril do petróleo, se não por outro motivo, pelo simples fato de que ambos os países são fornecedores de petróleo para a economia mundial. Não se esperava, porém, que os preços do barril do petróleo chegassem a bater na casa dos US$ 140, como ocorreu em março de 2022, tendo se estabilizado entre US$ 100 e US$ 110 em abril de 2022.

De qualquer forma, a disparada do barril do petróleo após invasão da Ucrânia gerou um efeito inesperados nos governantes de vários países do mundo: a indiferença à inflação. Com efeito, vários governantes, inclusive dos EUA, alegam que a origem da inflação está em fatores sobre os quais não possuem nenhum controle, como o conflito da Ucrânia, e não estão dispostos a entrar em uma guerra interna que não podem vencer e cujos custos sociais seriam altíssimos: a luta contra a inflação. Estimam que o desgaste político seria considerável e os resultados seriam pífios. Assim, os líderes mundiais aguardam o desfecho do conflito Rússia-Ucrânia e, enquanto isso, mantêm políticas expansionistas voltadas para a busca do pleno emprego.

Os Bancos Centrais de vários países perceberam a manobra política e começaram a aumentar a taxa de juros por conta própria, como foi o caso do Banco Central americano que praticou o maior aumento desde 2000: de 0,5% na taxa de juros. O Banco Central brasileiro, na mesma linha, aumentou a Selic para 12,75% em maio, maior taxa desde 2017.

Em suma: os governos centrais não vão gastar seu capital político para combater a inflação em 2022 por ser um ano eleitoral, notadamente na França, no Brasil e nos EUA, mas deixarão esse papel antipático para seus respectivos bancos centrais, que tomaram para si essa difícil função.

Portanto, o combate à inflação não será bem-sucedido em 2022 devido ao conflito na Ucrânia, mas a retomada da economia mundial em 2022 deve continuar inabalável, com redução generalizada do desemprego, mas não dos gastos sociais. 2022, assim como foi 2021, será conhecido como um ano inflacionário, mas a economia mundial deve ter um desempenho melhor do que o esperado pela maioria dos economistas e pelos analistas internacionais.

 

 

 

 

 

Por Ricardo Caldas, economista e cientista político com PhD em Relações Internacionais, especialista da Fundação da Liberdade Econômica.