A empresa recuperanda consegue negociar efetivamente com os credores interessados ao mesmo tempo que tira poder dos especuladores, já que inúmeras assembleias foram marcadas pelo conflito de interesses, escreve Luiz Antonio Sarraf
02/06/2022 07:12
”Os processos são mais céleres e as empresas conseguem voltar às atividades normais”
Mais uma vez as adversidades marcam o ano agrícola de muitos empresários rurais brasileiros. Além dos efeitos climáticos, que podem ser catastróficos dependendo da intensidade, na safra 2021/2022 os produtores foram afetados pelo aumento nos custos, pela queda na produção, e mais recentemente pela oscilação nos preços da soja e do milho como consequência de movimento no mercado internacional. A guerra entre Rússia e Ucrânia, que afeta diretamente a oferta de fertilizantes para o mundo, acendeu mais um sinal de alerta para os produtores.
O encolhimento da atividade rural já é demonstrado em números. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que o Produto Interno Bruto Brasileiro (PIB) cresceu 4,6% em 2021, puxado pelos setores de serviços (4,7%) e indústria (4,5%). Enquanto isso, a agropecuária registrou recuo de 0,2%, em decorrência da estiagem prolongada e de geadas. O resultado negativo foi provocado por perdas em lavouras como milho, cana de açúcar e café. Produção de bovinos e de leite também caíram. Soja teve crescimento.
Combinado a esses fatores, os agricultores começam a ter que honrar o pagamento de dívidas que foram postergadas em função da pandemia, quando muitas instituições financeiras – diante do desconhecido – concederam mais prazo para os produtores rurais quitarem empréstimos. E agora, dois anos depois, as contas começam a chegar.
A possibilidade de uma crise financeira, de não conseguir pagar fornecedores, empréstimos e financiamentos, funcionários, e muito menos investir na atividade assombra os empresários do campo. O contexto catastrófico, efeito da pandemia e das variações climáticas, fazem especialistas projetarem, a médio prazo, um aumento considerável nos pedidos de recuperação judicial.
Dados da Serasa Experian apontam curva crescente no número de pedidos de recuperação judicial este ano. De janeiro para abril, a quantidade de requerimentos aumentou 310% ao sair de 67 solicitações no 1° mês do ano para 275 no 4° mês. E a tendência é de a curva continuar ascendente nos próximos meses.
Cabe ressaltar que a recuperação judicial (Lei 11.101/2005) é um mecanismo legal e deve ser usado pelo produtor rural ou qualquer outro empresário em situação de crise financeira. Dessa forma ele blinda o negócio e ganha tempo para negociar o pagamento aos credores. Autorizada pela Justiça, a recuperação judicial permite a superação da crise e a plena atividade da empresa após o período processual garantindo o pagamento àqueles que tinham a receber (fornecedores, bancos, trabalhadores, etc.) e mais tempo de vida ao negócio.
E a legislação vai sendo aprimorada. No ano passado, a alteração na Lei de Recuperação Judicial encorajou o empresário a buscar o amparo legal na negociação de dívidas. Agora é possível firmar o Termo de Adesão Coletivo Majoritário (TACOM), um instrumento que permite substituir a tradicional Assembleia Geral de Credores (AGC), presencial ou virtual, dando celeridade ao processo. Um caminho que o legislador encontrou para não depender das assembleias de credores, que em muitos casos, se arrastavam por meses, e atrasavam o processo de recuperação e o reerguimento da empresa.
Assim, a empresa recuperanda consegue negociar efetivamente com os credores interessados ao mesmo tempo que tira poder dos especuladores, já que inúmeras assembleias foram marcadas pelo conflito de interesses, que emperravam o avanço nas negociações. Com isso, os processos são mais céleres e as empresas conseguem voltar às atividades normais e contribuir para geração de empregos, renda e impostos.
Por Luiz Antonio Sarraf é advogado em Cuiabá e sócio da ERS Advocacia