Opinião – O que é compliance e sua importância nas empresas

Na minha visão, o maior ativo para uma companhia que adota um bom programa de integridade é operar sob a pauta da higidez, da ética, da conformidade. Ter um programa de compliance é primordial. Escreve Thaméa Danelon.

05/06/2023 17:49

“Não há nada mais gratificante e nobre do que a adoção de comportamentos éticos, corretos e íntegros”

O maior ativo para uma companhia que adota um bom programa de integridade é operar sob a pauta da higidez, da ética, da conformidade. Foto: Unsplash

A partir da aprovação da Lei Anticorrupção (Lei 12.846/13), intensificaram-se as discussões sobre a melhor definição de um programa de compliance e qual seria a repercussão da implementação de um adequado programa nas companhias brasileiras. Traduzindo esse termo de origem na língua inglesa, compliance significa “conformidade”, sendo essa uma adequação à legislação e às boas práticas de governança corporativa, com intuito de prevenir, detectar e remediar condutas relacionadas a práticas corruptas, a comportamentos inapropriados (como assédio sexual e moral), e também um desempenho empresarial sustentável (ESG).

Na década de 70, após uma série de escândalos em empresas americanas que posicionavam seus lucros acima da ética e do dever de não cometimento de fraudes e pagamento de propina, o Parlamento norte americano aprovou em 1977 o FCPA – Foreing Corrupt Practices Acts – lei federal que pune empresas americanas ou com sede nos EUA na hipótese da prática de corrupção em outros países. A partir de então, as companhias sediadas nos Estados Unidos passaram a adotar posturas mais adequadas, mais éticas e íntegras, codificadas em manuais de condutas e nos respectivos programas de compliance.

Essa adoção legal da integridade foi personificada no Brasil apenas em 2013 com a aprovação da Lei 12.846/13, denominada Lei Anticorrupção (LAC) ou Lei da Empresa Limpa, sendo certo que aludida norma entrou em vigor em janeiro de 2014. Em 2015, foi editado o Decreto 8.420/2015, regulamentando a LAC e os programas de integridade. A Lei Anticorrupção trouxe uma importante inovação: a fixação da responsabilidade objetiva de uma empresa nos casos de prática de infrações previstas na LAC, mas essa responsabilidade ocorre apenas no âmbito cível e administrativo.

Responsabilidade objetiva significa dizer que a empresa responderá por eventuais pagamentos de multas, e sofrerá penalidades administrativas ainda que o CEO, diretores ou conselheiros executivos não tivessem conhecimento dos crimes cometidos por seus colaboradores. Assim, caso um gerente comercial, por exemplo, pague uma vantagem indevida a um fiscal municipal, ele cometerá o crime de corrupção ativa, e estará sujeito a uma pena de 2 a 12 anos de reclusão. Contudo, a companhia na qual ele trabalha poderá ser responsabilizada pelo pagamento de multas e sofrer outros tipos de sanções, tais como perdimento de bens, suspensão de atividades e, até mesmo, a dissolução compulsória da sociedade. Desta forma, ainda que o presidente, ou diretores não tenham conhecimento da prática desse ato de corrupção, a empresa poderá receber essas punições.

Importante ressaltar que as pessoas físicas que integram o corpo diretivo não responderão criminalmente pela infração cometida por seu colaborador, pois, no âmbito penal, a responsabilidade é subjetiva, ou seja, deve-se comprovar o real envolvimento de determinada pessoa na prática de um crime, evidenciando-se que houve, de fato, o cometimento de um crime por ela, ou, ao menos, o conhecimento desses atos. Assim, a Lei da Empresa Limpa trouxe essa responsabilidade objetiva somente no que se refere às implicações cíveis e administrativas da pessoa jurídica, e nunca pessoal de seus sócios e administradores.

A LAC e seu decreto regulatório não estipulam a obrigatoriedade das empresas brasileiras privadas implementarem um efetivo programa de compliance, contudo, esses regulamentos disciplinam que, na hipótese de investigação de práticas ilícitas por determinada companhia, será observado a existência de eventual programa de integridade, tais como código de conduta, canal e incentivo à denúncia de irregularidades, procedimentos internos e integridade, e a efetiva aplicação dos códigos de ética. Assim, sendo constatada a implementação de um programa de compliance real e efetivo por parte da empresa investigada, esse fato será levado em consideração no momento da fixação de eventual penalidade à pessoa jurídica, equiparando-se, este programa, de certa forma às “circunstâncias atenuantes” previstas no Código Penal.

A existência de um bom código de integridade garantirá à empresa uma eventual amenização de suas sanções; e, além disso, a adoção de práticas limpas e saudáveis se refletirão na criação de um ambiente agradável de negócios, que resultará no aumento da produtividade da companhia e incremento de seus lucros financeiros. Esses são os resultados objetivos da implantação de práticas íntegras, sendo as consequências subjetivas (ou imateriais) ainda mais salutares.

Na minha visão, o maior ativo para uma companhia que adota um bom programa de integridade é operar sob a pauta da higidez, da ética, da conformidade. Ter um programa de compliance é primordial, simplesmente pela importância de se fazer a coisa certa. Apenas isso, pois a correição e a virtude são um fim em si mesmas, não sendo essas duas qualidades nenhum instrumento para obtenção de algo maior – não há nada mais gratificante e nobre do que a adoção de comportamentos éticos, corretos e íntegros.

 

 

 

 

Por Thaméa Danelon, Procuradora da República (MPF) desde dezembro de 1999, ex-coordenadora do Núcleo de Combate à Corrupção em São Paulo/SP; ex-integrante da Lava Jato/SP; mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal pela Escola Superior do Ministério Público de São Paulo (ESMPSP); professora de Direito Processual Penal e palestrante.

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