Campos é amaldiçoado todos os dias como o responsável único e direto por todos os problemas que possam existir na sociedade. Escreve J.R. Guzzo.
04/08/2023 11:16
“No Brasil de Lula, do PT e dos economistas de esquerda”
O Banco Central decidiu reduzir a taxa de juros em 0,50 ponto percentual, depois de uma longa e paciente caminhada para combater as ameaças de disparada da inflação que apareceram junto com a Covid. Foi um combate extremamente bem-sucedido – pela primeira vez na história, a inflação anual do Brasil, em 2022, ficou abaixo da inflação dos Estados Unidos, da Alemanha e de outros exemplos mundiais de seriedade econômica. Hoje está menor ainda. Pode haver uma prova mais clara de competência na gestão de um Banco Central? Os números mostram que não. A comunidade financeira mundial, que tem um julgamento neutro sobre as questões de estabilidade da moeda – e trabalha apenas com realidades, não com demagogia – deu aprovação unânime e vigorosa a tudo o que o Brasil tem feito para enfrentar a inflação. Seu presidente, Roberto Campos Neto, foi eleito em 2022 como o melhor presidente de banco central da América Latina, por seu desempenho diante da desgraça geral da pandemia, da guerra da Ucrânia e outros traumas da economia global. O real é hoje uma das moedas mais estáveis do mundo, e as reservas internacionais do Brasil em divisas, atualmente em 350 bilhões de dólares, estão entre as dez maiores do planeta.
No Brasil de Lula, do PT e dos “economistas de esquerda”, porém, Campos é amaldiçoado todos os dias como o responsável único e direto por todos os problemas que possam existir na sociedade. Não há, naturalmente, fundamento técnico nenhum para essas agressões. O que há, desde o primeiro dia, é a desonestidade, a má fé e o uso deliberado da fraude como método de ação política que estão na alma de todos os governos Lula. Ele decidiu, e o cardume de bajuladores-raiz que tem em volta de si foi atrás automaticamente, que o presidente do Banco Central tinha de ser o judas do Brasil. Jogam em cima dele todas as culpas por sua própria incompetência – e a sua incapacidade fundamental em resolver qualquer das dificuldades do Brasil, sobretudo as que eles próprios criaram. Está ruim? A culpa não é nossa. É “do Campos”. Nunca tiveram a menor intenção de fazer um debate sério em relação aos juros, ou de apresentarem uma única ideia útil para a política monetária. Em vez de discordar com respeito e com a sugestão de alternativas, o que seria a obrigação elementar de um presidente da República, Lula e o PT só fizeram insultos. Campos, a um momento, foi chamado de “este cidadão” por Lula.
O problema do presidente do Banco Central é que ele é hoje, disparado, o melhor gestor público do Brasil – e não foi nomeado por Lula, não precisa dele para nada e, por lei, trabalha com autonomia em relação ao governo. O rancor básico que comanda a cabeça de Lula, e a inveja rasteira que faz parte do seu DNA, o levaram a surtar de novo, no mesmo dia em que o BC baixava os juros – aliás, com o voto decisivo de Campos a favor na redução. Acusou o presidente do BC de não entender nada “de Brasil” e “do povo”; disse, também, que não sabe quais os “interesses” que ele “defende”. O presidente do Banco Central, para o interesse do cidadão, não tem de entender “de Brasil”. Tem de entender de estabilidade monetária – é esse o seu trabalho, e ele está fazendo seu trabalho melhor do que ninguém. “O Banco Central brasileiro conseguiu um feito que tem sido perseguido por todas as autoridades monetárias globais: um pouso suave da economia, com controle da inflação”, disse a Goldman Sachs, um termômetro básico do consenso financeiro mundial. Lula não suporta ouvir essas coisas.
Por J.R.Guzzo é jornalista. Começou sua carreira como repórter em 1961, na Última Hora de São Paulo, passou cinco anos depois para o Jornal da Tarde e foi um dos integrantes da equipe fundadora da revista Veja, em 1968. Foi correspondente em Paris e Nova York, cobriu a guerra do Vietnã e esteve na visita pioneira do presidente Richard Nixon à China, em 1972. Foi diretor de redação de Veja durante quinze anos, a partir de 1976. Nos últimos anos trabalhou como colunista em Veja e Exame.