Desastres naturais, em todo o mundo, são ocasiões em que o governo tem de se mostrar eficaz, não falar de si e respeitar o luto das vítimas. Escreve J.R. Guzzo.
21/05/2024 11:50
“É esse o Brasil que estão construindo”
Não se pode dizer que este é o pior momento do governo Lula porque o governo Lula está o tempo inteiro no seu pior momento, dia e noite, desde que começou dezessete meses atrás. Mas agora, com a tragédia das enchentes do Rio Grande do Sul, Lula, sua mulher e os bajuladores mais extremistas do seu círculo íntimo estão indo a novos extremos em matéria de desleixo com o ser humano, oportunismo e falta de escrúpulos.
Diante das mortes, da destruição e do drama de quem perdeu tudo que tinha na vida, a corte que se pendura no presidente da República está, desde o começo, com uma ideia fixa e maligna: aproveitar a desgraça do povo gaúcho para tirar proveito político pessoal. Não conseguiram pensar em outra coisa até agora: como transformar as ações de socorro, e, sobretudo, as verbas que prometem, em vantagem para as próximas eleições.
Não houve, também neste caso, a menor preocupação em manter um mínimo de decoro. Indo direto ao foco de infecção mais evidente: Lula inventou um “Ministério Extraordinário” para “cuidar” da crise (os 38 que ele já tem não são suficientes) e entregou o cargo de ministro-interventor a ninguém menos que o seu candidato ao governo do Rio Grande do Sul nas próximas eleições.
É um novo recorde, em matéria de uso da máquina e do dinheiro público para fazer campanha eleitoral. A cada cinco minutos o novo plenipotenciário aparece nas emissoras de televisão amigas (ele é também o ministro das Comunicações, vejam só) falando bem de Lula, do Exército e de si próprio. Também está convencido de que o principal problema das enchentes são as notícias de que ele e o governo não gostam – quer polícia, processo e prisão. Simula atividade todos os dias, persegue prefeitos da oposição e não faz nada: não existe nenhuma providência útil que possa ser atribuída a ele.
É o contrário. Ele próprio revelou que está perdido e não tem ideia do que fazer. “A cada hora aparece um problema novo, e a gente não sabe nem para que lado mexer”, disse ele dias atrás. “Eu acho que nós temos de nos fixar em alguma área específica. Mas não sei exatamente que área seria essa.” O resto das autoridades, em geral, vai na mesma toada. Sua prioridade máxima é aparecer para o público e dar a impressão de que estão fazendo um grande trabalho.
Levam microfones na lapela e estão sempre com o celular na mão para postar vídeos e áudio com seus atos de heroísmo. O interesse não é fazer, trabalhar e ajudar. É exibirem a si mesmos. Faz sentido montar um cenário e um “evento” para mostrar os gatos gordos do governo oferecendo, como se tivessem saído do seu próprio bolso, purificadores de água? Se querem mesmo ajudar, por que não entregam os aparelhos, simplesmente, sem essa palhaçada toda?
Desastres naturais, em todo o mundo, são ocasiões em que o governo tem de se mostrar eficaz, não falar de si e respeitar o luto das vítimas. Lula transformou a catástrofe gaúcha numa quermesse do PT, com coros de “Lulalá”, fotos com cachorrinho no colo e a primeira-dama rindo de tudo como se estivesse numa festa em sua homenagem. É esse o Brasil que estão construindo.
Por J.R.Guzzo é jornalista. Começou sua carreira como repórter em 1961, na Última Hora de São Paulo, passou cinco anos depois para o Jornal da Tarde e foi um dos integrantes da equipe fundadora da revista Veja, em 1968. Foi correspondente em Paris e Nova York, cobriu a guerra do Vietnã e esteve na visita pioneira do presidente Richard Nixon à China, em 1972. Foi diretor de redação de Veja durante quinze anos, a partir de 1976. Nos últimos anos trabalhou como colunista em Veja e Exame.