No fim da linha e da picada, um poder sem voto está passando por cima de toda a sensatez e da Constituição que diz ser o português o idioma do Brasil. Escreve Percival Puggina.
06/06/2024 06:05
“Mesmo ao preço do emburrecimento nacional”
Quando nos mudamos para Porto Alegre, vindos de Santana do Livramento, fui aprovado no exame para ingresso no Colégio Estadual Júlio de Castilhos, carinhosamente chamado “Julinho” e oficializado como “Colégio Padrão”. E era mesmo. Excelentes professores, num ambiente de liberdade, mas de muito estudo, leitura e provas mensais pra valer.
Imediatamente, fui capturado para a política estudantil dos anos 1960, 1961 e 1962. Aprendi muito sobre a extrema esquerda que derrotávamos nas eleições para o Grêmio Estudantil, mas para a qual perdíamos as eleições metropolitanas e estaduais. Uma lição recorrente foi observar e enfrentar a determinação com que, nas assembleias, os “comunas” ou os “vermelhos”, ou ainda, os “do partidão” (PCB), quando minoritários, criavam tumultos para impedir deliberações que os contrariassem. A opinião daquela gurizada deveria prevalecer mesmo se rejeitada, custasse o que custasse. Éramos adolescentes, eu tinha 15 anos, representava minha turma e ali, naqueles entreveros – valho-me do conceito popularizado – aprendi a jogar xadrez com pombos: eles derrubam as peças, defecam no tabuleiro e saem cantando vitória.
Lembrei-me disso agora, no dia 03 de junho, assistindo reportagens com cenas da invasão e vandalismo da Assembleia Legislativa do Paraná por professores e alunos contrários ao projeto de terceirização da administração de 200 estabelecimentos de ensino. Há 15 dias, algo semelhante quase aconteceu em São Paulo durante a votação da criação de algumas dezenas de Escolas Cívico-Militares. É ou não o mesmo desapreço à democracia que eu conheci há 64 anos?
A bancada da extrema esquerda na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados está inconformada com a eleição do jovem e brilhante deputado Nicolas Ferreira para presidência do órgão. Por isso, vem usando os meios menos regimentais e mais grosseiros possíveis para impedir, mediante tumulto, que as deliberações ocorram.
Parece pouco? Tem mais. Não é o mesmo desapreço pela democracia e pela representação política que tem levado grupos identitários a entrar no STF contra leis que proíbem o uso de linguagem de gênero neutro? Danem-se o idioma, seu léxico e sua gramática, confundam-se as mentes dos educandos com novocabulário e regras contraditórias, a vontade da extrema esquerda deve imperar!… No fim da linha e da picada, um poder sem voto está passando por cima de toda a sensatez e da Constituição que diz ser o português o idioma do Brasil. Então, porque pode (ou não pode?), faz cumprir, numa canetada, a vontade da minoria ruidosa e ensandecida. Mesmo ao preço do emburrecimento nacional.
Por Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.