Opinião – Até os aliados começam a perder a paciência com os excessos do STF

O ministro Moraes, por exemplo, disse que o STF não precisa de um código de ética, porque já é altamente ético. Escreve J.R. Guzzo.

02/07/2024 12:32

O mais estranho é a recusa dos ministros do STF em admitirem que estão fazendo algo errado

O ministro do STF Edson Fachin.| Foto: Gustavo Moreno/SCO/STF.

Primeiro, foi o ministro Luiz Fux, que lembrou aos colegas, em público e em voto no plenário, que o Brasil não deve ser governado por juízes. Logo em seguida, o ministro Edson Fachin julgou conveniente afirmar que o STF deve se comportar com compostura. Antes dos dois, editoriais de órgãos de imprensa que passaram os últimos anos elogiando o tribunal pelo que consideram ser a sua atuação em favor da democracia, já tinham começado a fazer críticas cada vez mais duras ao Supremo – inicialmente por cometerem o que lhes pareceu seus exageros, depois por suas violações abertas à lei.

Fux e Fachin não mencionaram nomes, mas todo mundo sabe de quem eles estavam falando: do Comitê Central presidido por Alexandre de Moraes que comanda hoje o STF, com a participação de Gilmar Mendes, Flávio Dino, Luís Barroso e Dias Toffoli – que não comanda nada, mas se junta sempre ao grupo que está por cima. O fato é que nem eles se entendem mais como se entendiam. Pode ser só uma chuva de verão, é claro. Se for mais que isso é uma sorte para o Brasil.

A questão a observar daqui para frente é se o STF, de agressão em agressão ao Estado de Direito, começa realmente a cansar. Não é só isso. Além da supressão de direitos civis e liberdades públicas, da legalização virtual da corrupção e da intervenção nas atividades legais do Congresso, os ministros frequentemente têm uma conduta pessoal incompatível com a função de magistrados. Tornaram-se, como diz o advogado Sebastião Coelho, as pessoas mais odiadas do Brasil.

O mais estranho, nessa situação, é a recusa absoluta dos ministros do STF em admitirem que estão fazendo algo errado – ao contrário, lançam iradas condenações contra qualquer tipo de crítica feita a eles. Quem faz isso é de extrema-direita, fascista e quer destruir a democracia no país, dizem eles. Na melhor das hipóteses, é chamado de “idiota”, ou de “mané”. As observações de Fux e Fachin, e a crescente impaciência dos aliados com o país sem lei que o Supremo está construindo, são um alerta bem-educado para que o tribunal preste um pouco mais de atenção ao que está fazendo.

O Comitê Central do STF continua a dar sinais de que não tem o menor interesse em mudar de vida. Virou uma posição inegociável tratar os pontos de vista discordantes como “atentados à democracia” – o direito de opinião, no entendimento dos ministros, não pode ser aplicado quando a opinião é diferente da sua. As últimas atitudes que têm tomado são as piores que se poderia esperar. O ministro Moraes, por exemplo, disse que o STF não precisa de um código de ética, porque já é altamente ético – um espanto, realmente, quando os fatos mostram que há urgência urgentíssima de se fixar regras mínimas de decência para o tribunal.

Disse, no mesmo embalo, que a anistia para os presos políticos do dia 8 de janeiro é impossível, pois a decisão é “da Constituição” – e é o Supremo quem interpreta a Constituição. O ministro Toffoli leva um guarda-costas pago com dinheiro público para assistir a um jogo de futebol em Londres. Num extremo de desmoralização, o STF se enterra no “Gilmarpalooza” – a quermesse organizada em Portugal para reunir ministros da “suprema corte”, empresários com problemas na Justiça e gatos gordos do governo Lula. Já custou mais de 1,3 milhões para o pagador de impostos e, como sempre, os mais exibidos são justamente os mais inúteis para o interesse público – a ministra da “Igualdade Racial”, por exemplo, conseguiu não apenas ir à festa, mas levar quatro assessoras para interagir com os magnatas brancos em Lisboa. Pelo jeito, tudo isso é essencial para a democracia.

 

 

 

Por J.R.Guzzo é jornalista. Começou sua carreira como repórter em 1961, na Última Hora de São Paulo, passou cinco anos depois para o Jornal da Tarde e foi um dos integrantes da equipe fundadora da revista Veja, em 1968. Foi correspondente em Paris e Nova York, cobriu a guerra do Vietnã e esteve na visita pioneira do presidente Richard Nixon à China, em 1972. Foi diretor de redação de Veja durante quinze anos, a partir de 1976. Nos últimos anos trabalhou como colunista em Veja e Exame.

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