Opinião – Reforma ilegítima

Com o aumento de custo de vida, a carne provavelmente ficará inacessível para muitos da classe média que terá que cortar muitos outros itens de sua mesa. Escreve Luiz Philippe de Orleans e Bragança.

19/07/2024 12:23

“Se não fosse o governo comprando os parlamentares (…) nenhuma das propostas passariam”

A Câmara dos Deputados concluiu a votação do projeto que regulamenta a reforma tributária| Foto: Mário Agra.

Poucos minutos antes do voto, os deputados receberam o texto final da lei complementar que irá regulamentar a reforma tributária. Ninguém leu. E mesmo assim vários deputados da esquerda governista subiram ao palanque para defender o texto não lido. Os deputados de “centrão” se calaram e votaram com o governo. Resultado, a lei complementar – não lida – passou com mais de 300 votos.

Já vimos essa mesma cena de filme. Mais de uma vez. Na verdade, vimos esse filme cinco vezes, desde o voto que acabava com o teto de gastos no final de 2022, antes que o novo governo eleito tomasse posse. Esse atropelo para votar questões tributárias, que ajudam a comunistas e corruptos, foi o mesmo colocado em pauta para acabar com teto de gastos, criar o arcabouço fiscal, reverter as regras do CARF, aprovar a reforma tributária e agora regulamentar a reforma.

Na última quarta-feira (10) tivemos a votação mais importante do ano na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei Complementar 68/24, que regulamenta a reforma tributária, com várias mudanças em relação ao projeto original, de autoria do Poder Executivo. Agora a proposta será enviada ao Senado.

Ignorância, corrupção e ilegitimidade

O ponto principal, entretanto, é que nada do que foi aprovado é legítimo.

Se não fosse o governo comprando os parlamentares, e o presidente da Câmara violando o regimento de debate desses temas, nenhuma das propostas tributárias passariam.

O incentivo usado são as emendas parlamentares que sempre surgem para comprar governabilidade dos deputados, que se comportam mais como vereadores do que representantes de nível nacional.

Outro péssimo aspecto é que a maioria dos parlamentares não entende nada do sistema tributário e fica sempre dependente do que o Governo e a Receita Federal dizem. Muito ruim, pois os eleitores perdem o que seriam seus defensores contra um sistema que os rouba todos os dias e em todas as atividades.

A proposta

Já cobrimos em diversos artigos nesta coluna os problemas da reforma tributária.  Em resumo, ela irá agir contra os estados, os municípios e os cidadãos de todas as classes sociais e econômicas. Só um interesse foi atendido: o do Governo atual.

Princípios como federalismo, subsidiariedade ou liberdade econômica foram ignorados em prol de arrecadação sem limites, centralização e controle de toda a atividade do país, que está nas mãos de corruptos e incompetentes nomeados por um governo amigo de criminosos, terroristas e ditadores.

Quem acompanhou o processo de votação pôde testemunhar o esforço da oposição para convencer os deputados do “centrão” a honrarem seus mandatos. Assim, rejeitando as manobras do governo, que pretende, na verdade, se apropriar da totalidade dos recursos públicos sob o pretexto de fazer uma “reforma”. Mas que vai resultar em confisco de poupança, perda de empregos, inflação e meio de corrupção, dentre outros.

Jogo de cena

Na hora da votação, para criar um subterfúgio de suas intenções mesquinhas, o Governo e o “centrão” criaram uma falsa oposição na questão da inclusão de proteína animal entre os itens de cesta básica, que receberão alíquota zero de impostos. Foi aprovado como vitória da esquerda. Como previsto, a medida é tão demagógica que situação e oposição estão reivindicando a paternidade. Será uma medida inócua.

Resumo e o que virá

Para entender o impacto dessa proposta espúria, que foi praticamente aprovada com poucos ajustes, vamos relacionar abaixo algumas causas que já antecipavam o desastre da PEC:

1. Não houve estudo de impacto, a sociedade e os especialistas não foram ouvidos, ao contrário, a proposta foi elaborada por membros do governo despreparados e apoiada por políticos igualmente incompetentes na matéria;

2. ⁠Os proponentes e os deputados não tiveram nenhum conhecimento do texto antes da votação, que foi apresentado sem discussão;

3. ⁠Os deputados, legítimos representantes da sociedade, não puderam ser contemplados com emendas de sua autoria, num jogo autocrático em que a corrupção correu solta;

4. O processo ⁠não seguiu o ritual adequado legislativo, via comissão especial, o que compromete inclusive a legalidade da proposta;

5. Foi decidido um relator de plenário de última hora, sem o adequado processo regimental, colocando sob suspeita também o texto como foi aprovado.

E como tudo o que começa errado continua mais errado ainda, não surpreende que consequências – previsíveis – tenham melado os trâmites corretos e legítimos, e que os resultados a curto e médio prazo sejam igualmente previsíveis. É o que acontece quando se atropela um processo natural de discussão sobre um sistema importante, mas falido, que é o da tributação no Brasil.

1 – Emendas vão virar projetos de lei;
2 – Setores reagirão com estudos de impacto próprios;
3 – ⁠Quem votou a favor irá representar ajustes;
4 – Enquanto isso, o investimento privado deve cair ainda mais.
5 – Onde está a esperança?

Enquanto não revertermos o que foi aprovado até agora, o Brasil continuará a ser um país muito inseguro para investir. No curto prazo, a esperança reside no fato de que os diversos setores reajam, forçando revisões, e o Governo perceba a complexidade debilitante do modelo proposto, assim postergando a implementação indeterminadamente.

Mas a maior esperança é que em 2026 possamos renovar a Câmara, o Senado e a Presidência, revogando todas as medidas tributárias aprovadas desde 2022.

 

 

 

Por Luiz Philippe de Orleans e Bragança é deputado federal por São Paulo, descendente da família imperial brasileira, trineto da princesa Isabel, tetraneto de d. Pedro II e pentaneto de d. Pedro I, sendo o único da linhagem a ocupar um cargo político eletivo desde a Proclamação da República, em 1889. Graduado em Administração de Empresas, mestre em Ciências Políticas pela Stanford University (EUA), com MBA pelo Instituto Européen d’Administration des Affaires (INSEAD), França. Autor dos livros “Por que o Brasil é um país atrasado”, “Antes que apaguem”, “A Libertadora – Uma Nova Constituição para o Brasil” e “Império de Verdades”.

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