Justiça representativa não se faz criando mais cargos, mas com coragem para devolver ao povo o poder que lhe é prometido. Escreve Daniela Reinehr
13/05/2025 11:04
“É necessário redistribuir as cadeiras para refletir uma realidade populacional e econômica”

Votação do projeto que cria mais 18 vagas de deputados federais dividiu a Câmara. (Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados)
A recente aprovação do Projeto de Lei Complementar 177/2023, que aumenta o número de deputados federais de 513 para 531, foi a bola da vez para criar uma nova cortina de fumaça, desviando os holofotes de temas mais urgentes – como as fraudes bilionárias no INSS, a recessão econômica que cresce a olhos vistos e outras questões latentes.
Mais uma vez, o que se percebe é um retrocesso disfarçado de avanço democrático. A aprovação do PL que propõe o aumento do número de deputados não se trata de ampliar a representatividade. Longe disso: trata-se de inflar estruturas públicas e ignorar a alternativa legítima e viável – a redistribuição das cadeiras entre os estados, dentro dos limites constitucionais já existentes.
Além de ineficiente, a proposta que cria mais vagas de deputados fere o espírito constitucional. O § 1º do art. 45 estabelece limites claros de representação para evitar desequilíbrios federativos. A ligação automática entre crescimento populacional e aumento de cadeiras, como propõe o PLP 177/2023, cria um precedente perigoso de expansão infinita da Câmara. É uma afronta aos princípios da eficiência, da moralidade e do equilíbrio federativo.
O correto seria redistribuir as cadeiras existentes entre os estados, corrigindo injustiças sem inflar a estrutura legislativa. Isso está dentro da Constituição e não geraria custo extra para os cofres públicos, às custas do contribuinte. O que foi feito, portanto, não é uma imposição legal. É uma escolha política errada, na qual fui voto vencido.
A pergunta que se deve fazer é: o que o povo ganha com a aprovação do PLP 177/2023 e com mais deputados? O argumento utilizado pelos defensores do projeto é o cumprimento do § 1º do art. 45 da Constituição Federal, que prevê proporcionalidade populacional na composição da Câmara. Entretanto, é perfeitamente possível redistribuir as cadeiras sem aumentar o número total de parlamentares. Estados como Santa Catarina, que mais crescem em população e contribuição econômica, seguem sub-representados.
Também é preciso considerar uma hipótese de conveniência: já que se tratou de mudar a lei, seria bastante razoável adotar um critério no qual a proporção de cadeiras fosse distribuída com base na produção de cada estado. Os estados que produzem mais receberiam mais cadeiras. Me parece o mais justo. Mas, enquanto esse sonho – em que a lei do retorno se cumpriria – não se realiza, nos contentaremos com a distribuição proporcional por representatividade, conforme previa a legislação até a aprovação de ontem.
Segundo o Censo de 2022, Santa Catarina ultrapassou os 8 milhões de habitantes e teve um crescimento populacional de 5,89%, acima da média nacional (4,68%). É o estado que mais cresceu no Sul do Brasil e merece, ao menos, quatro novas cadeiras na Câmara – com a redistribuição das vagas existentes – não por privilégio, mas por justiça federativa.
Vale lembrar que o crescimento populacional implica diretamente no aumento dos custos para os estados: saúde, segurança, educação, infraestrutura, entre outros. Isso eleva a necessidade de maior representatividade. Enquanto isso, estados com crescimento estagnado mantêm o mesmo peso político. Isso sim é distorção.
Por meio da redistribuição de cadeiras – com responsabilidade, justiça federativa e compromisso com o cidadão – é possível corrigir distorções na representatividade parlamentar sem ferir o pacto federativo. O Brasil não precisa de mais cargos, mas de mais compromisso com a eficiência. É pelo equilíbrio entre os entes da federação que garantimos um parlamento mais justo, conectado com as reais demandas da população de cada estado.
Como representante de Santa Catarina, reitero: é necessário redistribuir as cadeiras para refletir a realidade populacional e econômica de cada estado, mas não é preciso mais deputados. Justiça representativa não se faz criando mais cargos, mas com coragem para devolver ao povo o poder que lhe é prometido – e que tantas vezes é desvirtuado por interesses que mudam leis que deveriam ser respeitadas.
Por Daniela Reinehr é deputada federal pelo PL-SC.