Raramente se registra a presença de vida racional em qualquer demanda que o PT faça, mas desta vez estão chutando o pau da barraca. Escreve J.R. Guzzo.
23/08/2023 09:38
“O PT, com tudo o que tem, deveria ficar até feliz. Mas é aí, justamente, que está o problema”
O PT, como o movimento perpétuo da Terra em volta do Sol, nunca para de querer alguma coisa, de preferência coisa gorda, da máquina pública. Quando está no governo, então, a fome aumenta. Nenhuma entidade política do Brasil desviou para si tanto dinheiro do Estado (quer dizer, do cidadão) e tantos benefícios oficiais como o PT – moeda sonante, empregos, cargos do primeiro ao quinto escalão do governo e por aí afora. Sua direção, neste momento, está de volta ao bazar de ofertas do emirado de Brasília: quer que o Sistema Lula lhe dê um canal de televisão. Imagine-se o ataque de nervos que a esquerda nacional teria se os partidos que fazem oposição pedissem uma TV para o governo. Talvez o Supremo socasse uma multa de 22 milhões de reais em cima deles, por “pedido abusivo”. O ministro da Justiça poderia dizer que é “traição à pátria”. É melhor nem imaginar.
Raramente, ou talvez nunca, se registra a presença de vida racional em qualquer demanda que o PT faça, mas desta vez parece que realmente estão chutando o pau da barraca. Não há a mais vaga partícula de interesse público no seu pedido de concessão – e os argumentos que apresentam para receber esse novo presente não seriam levados a sério por um roteirista de drama de circo. Sabe-se perfeitamente que a autora da petição, a presidenta nacional do PT, tem um senso de humor que em geral se localiza entre o zero absoluto e o menos 1. Parece eternamente enfezada, é incapaz de entender a piada e passa o tempo todo à procura de algum culpado da “direita” para denunciar – seja lá pelo que for, da seca no semiárido ao apagão na energia elétrica. Neste caso, porém, ela deu um cavalo de pau na sua conduta costumeira. Justificou a solicitação dizendo que o PT, vejam só, precisa do canal para cumprir “um dever constitucional, legal e estatutário”, e para fazer “pedagogia de participação político-partidária”. Sério? Ainda bem que ela explicou que é “dever” e “pedagogia”, só isso. É um alívio. Se não explicasse, as pessoas poderiam até pensar que o PT está querendo a televisão para fazer propaganda de Lula, dizer que “a direita” é “terrorista” e informar que o governo eliminou a “fome” no Brasil em apenas seis meses.
O pedido, oficialmente, está agora com o “ministro” das Comunicações. Não existe ministro de Comunicações – o que existe é Lula, e o que vai ser resolvido é o que ele resolver. Esse ministro é aquele que usa jato da FAB para ir à exposição de cavalo de raça – seu sogro, que não tem cargo nenhum no quadro funcional do governo, despacha numa sala do Ministério, abertamente, com empresários interessados em suas habilidades. Não é preciso dizer mais muita coisa, e o PT sabe muito bem disso. Já tem a TV Brasil, e o resto da máquina de fazer propaganda do governo. Já tem a TV Cultura de São Paulo, e coisas parecidas com ela. A audiência somada de tudo isso é um belo traço, é verdade, mas a culpa não é da direita – se não está bom, paciência. O PT, com tudo o que tem, deveria ficar até feliz. Mas é aí, justamente, que está o problema. Se há dinheiro público à vista – e essa TV-PT vai sair direto do Tesouro Nacional, ou do seu bolso – o PT quer sempre mais.
Por J.R.Guzzo é jornalista. Começou sua carreira como repórter em 1961, na Última Hora de São Paulo, passou cinco anos depois para o Jornal da Tarde e foi um dos integrantes da equipe fundadora da revista Veja, em 1968. Foi correspondente em Paris e Nova York, cobriu a guerra do Vietnã e esteve na visita pioneira do presidente Richard Nixon à China, em 1972. Foi diretor de redação de Veja durante quinze anos, a partir de 1976. Nos últimos anos trabalhou como colunista em Veja e Exame.