Opinião – Apostadores compulsivos

Se tem muita gente usando o Bolsa Família para jogos, isso diz mais sobre falhas do programa de governo do que qualquer coisa. Escreve Rodrigo Constantino.

27/09/2024 05:20

“onde foi que o conservadorismo partiu para a tutela estatal contra a liberdade responsável?”

Brasileiros recorrem a empréstimos para fazer apostas online, diz pesquisa| Foto: Joedson Alves/Agência Brasil

Em O Jogador, Dostoiévski relata por meio de uma personagem o seu próprio vício diante de uma mesa de aposta. Para algumas pessoas, aposta se torna realmente algo incontrolável e leva ao endividamento irresponsável e pode acabar destruindo a vida. Diante dessa triste realidade, muita gente defende simplesmente a proibição ou a regulamentação pesada do estado tutelar. Mas deve o vício de alguns tolher o uso de muitos?

Esse debate está na ordem do dia e basta abrir os jornais para ver. A esquerda petista lutou para aprovar as casas de apostas e agora parece arrependida. Influenciadores que ganharam rios de dinheiro fazem agora campanha contra, como o imitador de focas. É arrependimento sincero ou há algo mais por trás dessa campanha coordenada? Não sei dizer, mas eis as manchetes em destaque apenas na Folha e no O Globo de hoje:

Base de Lula, que aprovou projeto das bets, diz agora que foi ‘como abrir as portas do inferno’

O que pensa a Folha: Apostas sem controle avançam entre os mais vulneráveis

Veja as diferenças de regulamentação do setor de Brasil, Estados Unidos e Europa

Deputado quer tirar benefício de quem gasta dinheiro recebido pelo Bolsa Família com bets

Sites levam 10 vezes mais dinheiro que loterias da Caixa

Editorial O Globo: É preciso antecipar monitoramento e fiscalização das bets

O que o governo planeja para reduzir o endividamento com bets e jogos on-line?

Isso tudo, repito, apenas hoje. Ou as bets viraram mesmo um dos maiores problemas do país, ou tem algum caroço nesse angu. Mas vamos admitir que seja uma preocupação sincera com os mais pobres e viciados: a tutela estatal é mesmo a resposta? O liberalismo sempre defendeu a liberdade individual com a devida responsabilidade. Apenas pessoas responsáveis podem ser livres, afinal de contas.

Se tem muita gente usando o Bolsa Família para jogos, isso diz mais sobre falhas do programa de governo do que qualquer coisa. E a crença de que basta o governo proibir ou regulamentar para curar o mal é ingênua e boba: ou o brasileiro não aposta no jogo do bicho há décadas?

Alguns seguidores meus alegam que conservador defender casa de apostas é incoerência, mas onde foi que o conservadorismo partiu para a tutela estatal contra a liberdade responsável dos indivíduos? No mais, é perfeitamente possível condenar algo moralmente, mas não defender leis que proíbam a coisa em si. Tem muito comportamento que julgo indecente ou imoral, mas nem por isso quero a turma do Lula controlando a vida privada do cidadão…

Entendo que o tema seja delicado e que muita gente está genuinamente preocupada com os mais pobres. Discordo, porém, da solução autoritária pregada por quem se diz liberal ou conservador. Numa das reportagens da Folha, consta esse trecho sobre a realidade americana: “Nos Estados Unidos, o mercado paralelo é praticamente inexistente, porque existem ações firmes contra a ilegalidade e, ao mesmo tempo, existe uma flexibilidade que favorece o operador que quer realmente trabalhar de forma correta”, diz o diretor de comunicação da ANJL (Associação Nacional de Jogos e Loterias), Leonardo Benites.

Esse me parece o melhor caminho. O da liberdade com império das leis. O argumento de que há lavagem de dinheiro não é dos melhores, pois há também no mercado financeiro, nas moedas cripto e nas artes, em especial a moderna onde “vale tudo” (há quem pague milhões por uma banana com um adesivo). Nem por isso vamos defender o Estado cuidando de ou proibindo tais atividades.

Há muito mais o que pode ser dito sobre o assunto, mas quero aqui apenas sugerir uma reflexão aos que logo clamam por autoritarismo estatal diante de qualquer problema social. No mais, existe uma grande parcela do povo viciada em uma aposta recorrente fadada ao fracasso: votar no PT. O resultado é sempre mais miséria e escravidão, mas lá vai o apostador viciado novamente fazer sua “fezinha” para ver se dessa vez chove picanha.

O melhor antídoto para esse problema crônico não é acabar com as eleições, mas sim tentar esclarecer o eleitor. O problema, claro, é que o PT, uma vez no poder, faz de tudo para censurar o debate e calar os mais esclarecidos…

 

 

 

Por Rodrigo Constantino, economista pela PUC com MBA de Finanças pelo IBMEC, trabalhou por vários anos no mercado financeiro. É autor de vários livros, entre eles o best-seller “Esquerda Caviar” e a coletânea “Contra a maré vermelha”. Contribuiu para veículos como Veja.com, jornal O Globo e Gazeta do Povo. Preside o Conselho Deliberativo do Instituto Liberal.

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