Brasil 2016 – Os 10 desafios do país na política internacional – Parte 1

10/12/2015 13:23

O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, terá desafios importantes em 2016

Ajudar a consertar a economia, recuperar a liderança regional e buscar mais acordos de livre comércio estão na primeira parte da lista.

Selecionar simplesmente dez pontos de uma imensidão de desafios que o Brasil enfrenta é, claro, uma tarefa praticamente impossível, e fadada a omitir tópicos cruciais. Esta lista, logo, não alega ser completa (não contempla temas chave como o meio ambiente, ajuda ao desenvolvimento e não proliferação), mas busca estimular o debate sobre um excitante e desafiador ano à frente.

Leia abaixo a primeira parte desta lista, com cinco temas. A segunda parte será publicada na próxima semana.

ministro mauro vieira

A economia do Brasil está em frangalhos e nenhuma política internacional no mundo poderia consertá-la sem profundas reformas domésticas – contudo, uma política externa sabiamente desenhada pode produzir uma contribuição importante. Isso implica em reviver o Mercosul e ativamente buscar acordos de livre comércio (confira o item #5), tornar os empréstimos estrangeiros do BNDES mais transparentes e eficazes, e articular claramente aos investidores internacionais como o Brasil pretende sair da bagunça econômica em que se encontra (um plano para subir 30 posições no ranking ”Doing Business”, do Banco Mundial, seria um bom começo).

1. Ajudar a consertar a economia 

Também envolve buscar agressivamente financiamento do Novo Banco de Desenvolvimento liderado pelos BRICS, retomar o programa de bolsas para estudantes brasileiros no exterior (mas limitando-o a engenheiros), facilitar as regras de imigração e ativamente atrair migrantes qualificados (de lugares como a Síria), e cortar regras complicadas para vistos para aumentar o número de turistas estrangeiros.

2. Recuperar a liderança regional

Nada simboliza a perda de dinamismo da política externa brasileira melhor do que sua política regional passiva e indiferente. Onde a presidente vê a região em cinco, dez ou 20 anos? Qual é o projeto regional do Brasil e como deve ser implementado? Ele busca definir a agenda regional de alguma forma significante?

Enquanto o Brasil buscou uma política regional pro-ativa durante os mandatos de Fernando Henrique Cardoso e Lula, poucos na região hoje entendem o que o Brasil quer. Isso não significa que o Brasil tem que impor suas visões, longe disso. No entanto, o Brasil é único país na região com poder convocatório suficiente para articular uma visão inclusiva e criar ímpeto para perseguí-la.

Nos últimos dez anos, houve algumas razões para otimismo. Por exemplo, o Brasil convidou os líderes locais para se reunir com Xi Jinping, presidente da China, que havia vindo ao Brasil para a 6ª Cúpula dos BRICS, o que poderia ter sido o início de um diálogo sistemático entre líderes da região sobre como lidar com a ascensão chinesa. O Brasil poderia tomar a iniciativa de forma muito mais frequente, como já o fez no passado – por exemplo, ao construir o Conselho de Defesa da Sul-Americano.

3. Colocar os direitos humanos e a democracia de volta na agenda 

Como presidente eleita, em dezembro de 2010, Dilma Rousseff chamou a política do Irã de apedrejar mulheres condenadas por adultérios de ”medieval”, criando esperanças de que o Brasil assumiria uma posição mais clara em relação a violações de direitos humanos ao redor do mundo.

Mesmo diplomatas experientes interpretaram o comentário da presidente como um sinal verde para criticarem abusos em outros locais. Contudo, apenas alguns dias depois, o ministro das Relações Exteriores recebeu um austero aviso do assessor especial de Dilma Rousseff, Marco Aurélio Garcia, para não mencionar problemas de violações de direitos humanos em Cuba e Venezuela sem a autorização da presidente.

Se algum país na região poderia ter lidado de forma efetiva com a crise democrática na Venezuela, era o Brasil. Brasília, entretanto, ofereceu ao presidente Nicolás Maduro um cheque em branco para ir atrás de seus opositores políticos, controlar a mídia e o Judiciário, sem ter que temer a censura internacional.

Dilma cop21

Dilma Rousseff após a 21º Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (COP21), em Paris. Foto: Rafael Carlota/PR

 

4. Recuperar a voz perdida do Brasil em frente a desafios globais

Quando se trata de temas dominantes em assuntos globais nos últimos 12 meses, como a ascensão do Estado Islâmico, a crise mundial de refugiados ou a guerra civil na Ucrânia, o Brasil raramente foi além do papel de espectador, cedendo espaço para potências tradicionais.

Brasilia poderia, no entanto, ser muito mais pro-ativa na discussão global sobre como efetivamente enfrentar os desafios listados acima, e influenciar positivamente dinâmicas – como já o fez, no passado, em relação à intervenção humanitária, governança na internet, missões de paz, resolução de conflitos e defesa da democracia.

Isso requer, primeiramente, estar na sala quando esses temas são discutidas – como na Conferência de Segurança de Munique que ocorre anualmente, onde o Brasil tem sido ausente nos últimos anos. Nosso debate global está em desequilíbrio, e não podemos mais resolver desafios globais ao apenas confiar na sabedoria de alguns países.

As falhas dramáticas em enfrentar assuntos chave durante as últimas décadas são indicadores claros de que novos atores devem contribuir para encontrar soluções significativas.

5. Buscar mais acordos de livre comércio

Na última década e meia, centenas de acordos comerciais foram registrados na Organização Mundial de Trabalho (OMC). O Mercosul, em seu lado, assinou apenas um punhado, com mercados de limitada importância.

Conversas comerciais entre o Mercosul e a União Europeia (UE) são incrivelmente difíceis, tendo começado há 15 anos. Elas estagnaram em problemas similares aos que fizeram as negociações da OMC tão complexas: a indisposição europeia em expor seus fazendeiros protegidos à competição e o desejo sul-americano de resguardar as indústrias de importações de alta qualidade.

Contudo, no Brasil, um número crescente de interessados apoiam acordos de livre comércio não apenas com a UE, mas também com os EUA. Eles argumentam que a indústria brasileira poderia competir em termos iguais se o governo reduzisse o duradouro “custo Brasil” ao facilitar regras tarifárias e melhorar a infraestrutura.

Conforme grandes negociações regionais como a entre UE e EUA avançam (e o comércio no Pacífico será transformado pelo TPP), não é possível negar o prospecto de um mundo dividido em blocos comerciais. Junto com a Argentina, o Brasil deveria mudar a marcha e se adaptar a essa nova realidade.

 

por Oliver Stuenkel - texto originalmente publicado no blog Post-Western World. Leia aqui.

 

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