Perda de impostos com a Copa 2014 já soma R$ 1,2 bilhão

12/07/2010 10:38

Terminada no domingo (11) a Copa da África do Sul com a vitória da Espanha, inicia-se o Mundial de Futebol de 2014, no Brasil. Por enquanto, longe do verde dos gramados, e perto do verde do tapete da Câmara dos Deputados. Com todos os lances, rasteiras e cotoveladas típicos do jogo político. O projeto de isenção fiscal da Federação Internacional de Futebol Associado (Fifa), enviado para a Câmara em 31 de maio, deve levar o governo a se meter em uma nova briga.

Após a bola dividida entre as pastas do Esporte e da Fazenda, agora será a vez do Palácio do Planalto discutir com o Congresso. Isso porque, se depender dos parlamentares, a área econômica do governo, que já chiava com as desonerações já prometidas, terá de engolir novas isenções. Até o momento, a matéria ganhou cinco emendas, todas tentando aumentar ainda mais o perdão fiscal para quem investir na Copa. Se as emendas forem aprovadas, o governo se verá diante de novas renúncias fiscais. Apenas com a desoneração para a Fifa, a perda de impostos já está hoje avaliada em R$ 1,2 bilhão.

Zero de impostos para Fifa na Copa de 2014

O caminho da isenção fiscal está concentrado entre os artigos 21 e 25 da proposta elaborada pelo Executivo. O capítulo cinco prevê a criação do Regime Especial de Tributação Para Construção, Ampliação, Reforma ou Modernização de Estádios De Futebol (Recom). A intenção do governo é conceder incentivos fiscais para os projetos de arenas esportivas que vão sediar os jogos da Copa. Somente para isso, o governo vai deixar de arrecadar aproximadamente R$ 340 milhões.

Pelos cálculos da Receita Federal, a União perderá algo na faixa de R$ 900 milhões com a isenção total da Fifa e a instalação do Recom. Além disso, outros R$ 300 milhões deixarão de ser arrecadados pelos municípios com a renúncia do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS). Em compensação, a Receita espera que entrem nos cofres R$ 10 bilhões em arrecadação em outras áreas. Já houve uma mudança de cálculo, para menor. O número inicial era de R$ 16 bilhões.

Leia a íntegra do projeto do governo

O problema das emendas apresentadas até agora pelos parlamentares é que elas propõem novas isenções sem fazer qualquer tipo de cálculo sobre o rombo que vão representar. Isso confronta diretamente a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) no seu artigo 14, que prevê a necessidade dessa conta ser feita, além de medidas que compensem o rombo no orçamento.

Porém, especialistas com familiaridade no projeto consideram outro fato mais complicado e que merece muita discussão. Uma emenda do deputado José Rocha (PR-BA) altera o artigo 25, o que fecha o capítulo sobre o Recom. O parágrafo único, no texto mandado pelo governo, estabelece que os benefícios concedidos no regime criado para a Copa comecem em 1º de janeiro de 2011 e terminem em 30 de junho de 2014.

O parlamentar, que foi presidente do Esporte Clube Vitória (BA) e atualmente presidente do Conselho Deliberativo do time, retirou a data na qual o benefício começa, deixando apenas o encerramento do Recom no texto. Além disso, coloca que os tributos pagos antes da publicação da lei podem ser rembolsados. Ou seja, pela emenda do parlamentar baiano, o Recom vai retroagir na isenção fiscal das obras nos estádios. Consultores ouvidos pelo site apontam que, com a redação proposta, a renúncia seria impossível de calcular.

Na justificativa da emenda, Rocha afirmou que “a restrição temporal imposta ao início do gozo dos benefícios fiscais não se justifica, na medida em que ocasionará atraso na conclusão das obras”. O site não conseguiu localizar o deputado. No texto protocolado, ele diz que as “alterações sugeridas vêm a restituir o beneficiário pelos impostos recolhidos
nas aquisições/serviços realizadas antes da vigência desta Lei”.

Para o presidente da Subcomissão de Fiscalização da Copa de 2014, deputado Silvio Torres (PSDB-SP), a proposta é polêmica. E vai exigir uma mobilização do Parlamento, em especial da oposição, para que a renúncia fiscal dada para o Brasil realizar a Copa não aumente ainda mais dos R$ 1,2 bilhões previstos. “Nós vamos fiscalizar”, garantiu.

“Nós só saberemos qual o impacto depois que as cidades subsedes forem definidas e os projetos apresentados”, disse o deputado Marco Maia (PT-RS) ao Congresso em Foco, que apresentou uma das emendas na Comissão. Ele pretende que o Recom não se restrinja apenas aos investimentos nos estádios utilizados na Copa. Quer também isenção para quem construir, reformar ou modernizar bases de treinamento para as seleções. Somente no Rio Grande do Sul, pelo menos quatro cidades postulam a posição.

Para ele, a emenda deve ser aprovada para corrigir uma falha original do projeto. “Queremos dar isonomia a todos”, completou. O parlamentar gaúcho, que tem como base de atuação Canoas – uma das postulantes a ser subsede –, deixou o artigo 21 com um parágrafo a mais.

A emenda de Marco Maia estende o mesmo benefício dado aos governos e clubes nas sedes às subsedes. Mas a euforia de desoneração pode ir alam. Outra emenda de José Rocha prevê que, além das arenas esportivas, também tenham isenção as obras que foram feitas nas estruturas adjacentes aos complexos esportivos, englobando “demolições e outras obras necessárias ao cumprimento das exigências da Fifa, tais como estacionamentos, centros de imprensa e áreas de convivência para atendimento e conforto do público”.

As emendas foram apresentadas na semana passada na Comissão de Desenvolvimento Econômico da Câmara, onde o Projeto de Lei 7422/10 será analisado inicialmente. O relator, deputado Carlos Eduardo Cadoca (PSC-PE), ainda não estudou as propostas. A intenção dele é estabelecer nesta semana um calendário de trabalho, já que, por se tratar de matéria de isenção fiscal, ela tem que ser aprovada até setembro.

Marco legal

Terminada a Copa do Mundo de Futebol na África do Sul, governo, parlamentares e entidades do esporte começam a se preocupar unicamente com a organização do evento no país em 2014. Uma das várias exigências que a Fifa faz ao país sede é que todo um marco legal, especialmente nas áreas tributária e de propriedade intelectual, estejam aprovadas antes dos cartolas se instalarem no Brasil.

De acordo com o Ministério do Esporte, o projeto foi elaborado para abranger três das 11 garantias governamentais exigidas pela Fifa como condição inicial para a candidatura do país. São elas: sobre tarifas alfandegárias e impostos de importação, isenções fiscais gerais, procedimentos relativos à imigração, alfândega e check-in. Além disso, o governo mandou também uma proposta que trata da isenção do ISS, que é de competência dos municípios e do Distrito Federal, e um decreto estabelecendo a proteção da propriedade intelectual e dos direitos comerciais da entidade.

Ao site, Marco Maia disse que será necessário um esforço grande para aprovar as medidas  que tratam da Copa até setembro. Isso porque o envolvimento dos parlamentares com as campanhas eleitorais certamente diminuirá muito o quorum das sessões no segundo semestre. Segundo ele, a demora na aprovação já preocupa o ministro do Esporte, Orlando Silva. Por isso, o governo já estuda pedir a urgência nos projetos de lei, levando a tramitação apenas para o plenário da Câmara, não passando pelas comissões.

Silvio Torres, que foi relator da CPI da CBF/Nike, que investigou o futebol brasileiro e seus cartolas em 2001, não acredita que o governo consiga votar o projeto de isenção e as outras matérias nesse período. “Não vejo essa possibilidade. Numa pauta de esforço concentrado, não entram matérias polêmicas”, afirmou.

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