31/10/2011 10:58
Palestras e artigos escritos sobre a falta de limites impostos pelos pais são cada vez mais numerosos. Um assunto recorrente sempre que se fala em educação. Fico então perplexa e sedenta para compreender por que não existe uma mudança significativa no comportamento das crianças. Fazendo esta reflexão, fui movida do olhar sobre a criança para um olhar sobre os pais.
Estas crianças sem regras, com forte resistência à frustração, estão sendo criadas por uma geração que se formou sob a égide da culpa de seus pais ou sob a permissividade que se contrapunha a gerações inteiras reprimidas. Os filhos dos “hippies”, das esquerdas explosivas, da contracultura, da pílula anticoncepcional (revolução sexual) e de todas as mudanças que marcaram os anos 60 e 70, são os pais de hoje. Os pais das nossas crianças são, pois, egocêntricos e hedonistas.
Adolescentes e crianças do terceiro milênio são, em grande parte, absurdamente egocêntricos, avessos a qualquer frustração e consumistas quase sem limites. Eles formam uma geração que demonstra dificuldade em aceitar a frustração, não entende que seus desejos não sejam atendidos e lida com o mundo magicamente. Não fazem relações entre o trabalho e o consumo.
Pesquisas de todos os tipos vêm sendo desenvolvidas nos EUA sobre o egocentrismo crescente entre os jovens. Uma delas, chamada “Inventário da Personalidade Narcisista”, mostra que este egocentrismo vem crescendo. Twenge, autora do livro Geração Eu, afirma: “O que me preocupa é que estejamos criando uma sociedade na qual as pessoas se tratarão de uma forma ruim, seja na rua, seja em suas relações pessoais”
Nossa sociedade enfrenta um dilema: não sabe o que fazer com os jovens e começam a ter dificuldade com as crianças. Vaidosos, hedonistas, agressivos, inquietos, desconcentrados, ambiciosos e egoístas. Nossos jovens têm grandes dificuldades de conviver com desejos não satisfeitos e incapazes de projetar para o futuro, eles querem aqui e agora.
Como criar uma criança tipicamente normal? “O problema é que nenhum pai acha que seu filho é uma criança ‘na média’ e os pais (…) insistem na ideia de que seus filhos são especiais ou “acima da média” (M. Levine). Estes conflitos, mesmo com a melhor das intenções, podem ser terríveis no processo educativo. Sendo muito especiais, os filhos não podem errar, não podem falhar. “Eles fazem que os filhos antecipem preocupações, levando a obsessões pelas notas e por estudar na escola certa, pois sem isso, eles acreditam que os filhos não terão chances em um mundo cada vez mais competitivo.” (M. Levine)
DIREÇÃO: STEVEN SPIELBERG
A.I. – Artificial Intelligence, (2001)
Após perderem o filho, um casal “adota” David, um menino-robô com sentimentos quase humanos. Quando o filho do casal acorda do coma, a mãe resolve devolver David, mas prefere soltá-lo no mundo para sobreviver sozinho. David começa uma jornada em busca do amor de sua “mãe”. O filme não está entre os melhores de Spielberg, mas é bem interessante para refletir sobre os desejos narcísicos que levam à construção de robôs como respostas a desejos narcísicos humanos. Refletir o quanto o “livrar-se do robô” representa a incapacidade de integração ao princípio de realidade. O pequeno David, quase humano, representa por sua vez o desejo absoluto, por sua incapacidade de desviar-se de seu objeto de desejo.
LEITOR INDICA
O LIVRO
Não se trata de literatura sofisticada, mas é sem dúvida importante e de fácil leitura para os jovens pais e professores.
UM LIVRO:
O Castelo de Vidro de Jeannette Walls
O livro é autobiográfico. Jeannette conta-nos sua história expondo os limites e dificuldades nas relações entre pais e filhos. Não teme a exposição de relações complexas de abandono e negligência. Não se trata de literatura sofisticada, mas é sem dúvida importante e de fácil leitura para os jovens pais e professores. A obra nos ajuda a compreender as limitações humanas e a desvendar o crescente comportamento narcísico que expõe até mesmo os filhos em atos de negligência abusivos. Vale conferir.
“Existe um porre muito antes do álcool. É a bebedeira egoísta e narcisista de ignorar os outros.”
Arnaldo Jabor
“Chamei de mau gosto o que vi, de mau gosto, mau gosto… É que Narciso acha feio o que não é espelho”
Sampa-Caetano Veloso
Por:Adriana O. Lima, Doutura em Educação