17/07/2012 08:39
Os produtores rurais daqui usam melhor os insumos (sementes, fertilizantes, defensivos, mão de obra, rações, entre outros) para produzir mais em menos área do que seus concorrentes norte-americanos.
Para chegar a este resultado, José Eustáquio Ribeiro Vieira Filho, pesquisador do Ipea, fundamentou seu estudo “Brecha Produtiva Internacional e Heterogeneidade Estrutural na Agricultura Brasileira” em um intrincado indicador chamado “Produtividade Total dos Fatores (PTF)”.
Este indicador apresenta uma relação entre o agregado de todos os produtos e o agregado de todos os insumos. Segundo o trabalho, esta relação tem crescido a taxas elevadas e crescentes no agro brasileiro. De 1975 a 2010, a média anual de crescimento da PTF no Brasil foi de 3,6%, taxa superior à verificada para os Estados Unidos, que foi de 1,9%.
“Reduziu-se as distâncias produtivas entre os dois países. A agricultura brasileira passou por fortes transformações nas últimas décadas, cresceu de forma intensa, gerando modernização, incorporando tecnologia e aumentando a produtividade, com estabilidade no uso da terra”, destaca José Eustáquio.
No entanto, o pesquisador chama atenção para o fato de que o agro brasileiro é competitivo, mas se sobrepõe ao dos Estados Unidos, por exemplo, se considerarmos apenas uma camada de produtores com acesso a tecnologias mais avançadas.
“A modernização agrícola gera benefícios apenas para um grupo de produtores. Existe ainda uma grande parcela que está fora deste ambiente favorável de acesso à tecnologia. O agro apresenta disparidades produtivas. Nesse sentido, é preciso fazer a inclusão tecnológica destes agricultores, ainda, marginalizados deste processo”, ressalta José Eustáquio.
Porém, de acordo com o pesquisador, ainda existem desafios enormes em promover o desenvolvimento inclusivo destes agentes produtivos. Descubra quais na entrevista abaixo:
Sou Agro: Explique a relevância do indicador PTF? Por que ele é recomendado para medir a eficiência de um setor, no caso o agro?
José Eustáquio Ribeiro Vieira Filho: O avanço da PTF é a diferença entre a taxa efetiva de crescimento da produção e a taxa de incremento do conjunto de fatores produtivos. Numa linguagem menos técnica, o crescimento da produção pode ser explicado, de um lado, pelo aumento da quantidade de insumos ou, de outro, pelo uso eficiente destes mesmos insumos.
Por exemplo, ao dobrar a área plantada de uma fazenda haverá automaticamente o aumento da produção. Mas, a eficiência do uso dos insumos pode ter ficado constante. Por analogia, se a produção aumenta e a quantidade de insumos se mantém constante ou diminui, há claro indício de que a PTF cresceu. Ocorre uma melhoria na eficiência do uso dos insumos: produz-se mais com o mesmo ou menos.
Como a PTF considera um conjunto de fatores produtivos, esta medida é indicada para mostrar a evolução dos ganhos de eficiência, o que implica de forma indireta em evolução tecnológica.
Ter um crescimento da PTF, como o Brasil teve de 1975 a 2010, é algo bom então? Se sim, por quê?
No Brasil, a evolução da produção se deve mais ao aumento da eficiência no uso dos insumos do que ao incremento da quantidade deles. Este avanço de 3,6% da PTF do agro brasileiro frente a 1,9% dos EUA – país tido como referência em tecnologia de ponta – mostra que os produtores rurais fizeram um esforço enorme de atualização e inovação tecnológica, incorporando estes ganhos de conhecimento à produção.
Seu estudo traz um percentual destes produtores especializados e da outra categoria que ainda não tem tanto acesso à tecnologia?
A dualidade presente no desenvolvimento da economia nacional como um todo é um problema que prejudica a inclusão produtiva de segmentos marginalizados tecnologicamente. Só para se ter ideia, 0,5% dos estabelecimentos agropecuários brasileiros respondem por cerca de 50% do valor bruto da produção.
Se dobrarmos este grupo e com tudo mais [leia-se, uso dos insumos] se mantendo constante, o País aumentará a produção agropecuária pela metade. Aumentar a produção dessa forma é produzir mais com sustentabilidade, pois os recursos escassos são economizados e usados de modo mais eficiente.
Então, como promover a inclusão tecnológica destes produtores? Que políticas públicas devem existir?
Podemos dividir os agricultores em três grandes grupos. O 1º, caracterizado pela extrema pobreza (produz de 0 a 02 salários mínimos mensais), engloba cerca de 3,2 milhões de estabelecimentos, está à margem da produção, bem como se mostra excluído de qualquer setor de atividade econômica, pois carece de estruturas básicas de organização produtiva (micro e macroeconômicas).
O 2º, considerado de baixa renda (produz de 02 a 10 salários mínimos mensais), possui 960 mil estabelecimentos agropecuários e deve ser assistido pelo governo com políticas de fomento e dinamização da produção, normalmente de base familiar. São produtores com reduzida capacidade de absorção de conhecimento externo, com baixo conteúdo tecnológico e com deficiências no âmbito gerencial e microeconômico.
O 3º é a riqueza agrícola, que envolve as rendas média e alta (mais de 10 salários mínimos mensais). Para este grupo, a capacidade de absorção tecnológica é um problema secundário. Porém, o ambiente macroeconômico favorável ao crescimento das vendas se torna essencial.
Assim, para ampliar a capacidade de absorção tecnológica dos agricultores é preciso repensar a educação rural, que deve ser planejada num horizonte de 15 a 20 anos. Já para facilitar a difusão tecnológica, é necessário repensar a extensão rural, que pode ser resgatada num período menor.
Cabe ao governo desenvolver assistência técnica que tenha capilaridade (integração entre as políticas federal e estadual), bem como incentivar a pesquisa de domínio público. Desta forma, o papel da Embrapa de nada adianta se a extensão rural for deixada de lado.
Fonte:portaldoagronegócio