“Deixo a política para aproveitar os últimos anos de vida”

04/07/2014 12:29

Ao longo dos últimos 40 anos, Júlio Campos (DEM) fez praticamente de tudo na vida pública. O democrata ocupou os cargos mais importantes da política de Mato Grosso, como os de governador e senador.

Agora, ao fim de seu mandato como deputado federal, ele anuncia a aposentadoria alegando, principalmente, questões de saúde.

Enfrentando uma cirrose hepática desde 1990, e com diabetes em estado avançado, Júlio pretende aproveitar a aposentadoria cuidando dos negócios de família, dos netos e da carreira política de seu filho e herdeiro, Júlio Campos Neto (DEM).

“Acho que já cumpri minha missão na vida pública. Está na hora de dar oportunidade para novos valores. Me considero realizado”, afirmou, em entrevista exclusiva ao MidiaNews.

Júlio começou como presidente de agremiações estudantis nos principais colégios de Cuiabá e nas duas faculdades onde se formou engenheiro agrônomo, a Universidade Federal de Goiás (UFG) e a Universidade do Estado de São Paulo (Unesp).

Tony Ribeiro/MidiaNews
“A vida pública é fascinante. Para mim, que nasci político praticamente, que vivi a política a vida toda, é fascinante”

De lá, voltou para a terra natal, Várzea Grande, na qual se tornou, em 1972, o prefeito mais jovem do Brasil, com 25 anos.

“Resolvi fazer um governo moderno para Várzea Grande, ao invés da aquele tradicional feijão com arroz. Bolamos um projeto para transformar a cidade em polo industrial. À todas as empresas que queriam vir para cá, nós dávamos incentivos, como doação de terrenos. Várzea Grande deixou de ser uma cidade dormitório”, lembrou.

A administração, considerada por ele como “ousada”, garantiu mais um feito político: a eleição como deputado federal mais votado da história do Estado.

Em seguida, ele disputou a primeira eleição direta para o governador, após o início do fim da Ditadura Militar. Concorreu com o Padre Raimundo Pombo, do PMDB, em uma das eleições mais acirradas da história.

Ele ainda ganhou a eleição ao Senado e atuou como conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE), onde se aposentou.

Teve duas derrotas em sua carreira. A primeira em 1998, quando perdeu o Governo para Dante de Oliveira (PSDB), que buscava a reeleição.

Dez anos depois, perdeu para o candidato à reeleição na Prefeitura de Várzea Grande, o empresário Murilo Domingos (PTB).

Confira os principais trechos da entrevista com o deputado federal Júlio Campos:

“Não pude curtir meus filhos, porque estava numa vida pública intensa. Então, vou curtir meus netos”

MidiaNews – O senhor está há 40 anos na política, já tem 68 anos. Nesse tempo, surgiram diversos rumores a respeito da sua vida. O senhor está deixando a política por alguma questão de Saúde?

Júlio Campos – Primeiro, a idade vai chegando, estou indo para 69 anos e não sou mais o Julinho com 35 anos. Segundo que tenho um quadro de saúde um pouco complicada. Além de uma cirrose hepática, que tenho desde 1990, tenho diabete. Emagreci muito e toda hora vou ao banheiro, tudo  fruto da diabete, que é muito alterada, principalmente quando fico nervoso. E a vida pública é o dia todo nervoso, o dia todo estressado. Os meus médicos recomendaram que eu parasse. Além disso, o que vai somar na minha vida mais um mandato de deputado federal? Já fui três vezes e não tenho mais perspectiva nenhuma de ocupar um cargo mais elevado que deputado federal. Então, acho que vale muito mais a pena se dedicar, neste final de carreira, neste final de vida, à luta para ter mais qualidade de vida, aproveitar.

“Resolvi fazer um governo moderno para Várzea Grande, ao invés de fazer aquele tradicional feijão com arroz.”

Tenho 68 anos, com mais 7 anos de vida útil boa, como estou hoje, posso viajar, ir a um restaurante comer algo melhor, produzir no meu trabalho e chegar aos 80 anos. É bom aproveitar esse período agora, curtir um pouco. Não pude curtir meus filhos, porque estava numa vida pública intensa. Quero curtir meus netos. Tenho quatro filhos e já tenho 3 netos, vem mais um daqui a dois meses. Então, em conjunto com a família e amigos, decidi que estava na hora de investir no novo.

MidiaNews – Quais são os seus planos para a aposentadoria?

Júlio Campos – Vou melhorar minha saúde. Vou ficar no trecho de Chapada dos Guimarães, onde tenho uma chácara, no Pantanal, onde tenho um sítio, e também em Cuiabá. Ir para São Paulo fazer meus exames mensais, de dois em dois meses, e também viajar um pouco para Europa e Estados Unidos. Quero cuidar das minhas coisas em Cuiabá, já estou passando tudo para o nome dos meus filhos, porque eles vão administrar tudo. Depois, vou levar meus netos para conhecer a Disney e assumir a velhice, porque o tempo já chegou.

Acho que, hoje, vale mais investir no meu filho Júlio Neto, que está com 33 anos e pode fazer uma carreira política, caso consiga obter sucesso nessa eleição. É melhor do que eu ficar batendo na mesma tecla. Acho que já dei minha contribuição, saio de cabeça erguida pelo dever cumprido. Sou querido em todo Mato Grosso, respeitado, deixei marcas indeléveis no Estado, sou também respeitado em Brasília. Então, fico feliz que estou saindo sem nenhuma mágoa ou ressentimento.

“Acho já cumpri minha missão na vida pública, está na hora de dar oportunidade para novos valores. Me considero realizado”

MidiaNews – O senhor foi eleito o prefeito e o governador mais jovens do Brasil. Como foi o início da sua carreira?

Júlio Campos – Comecei na política muito cedo, sou filho de uma família tradicionalmente política. Meu pai, Júlio Domingos de Campos, foi prefeito de Várzea Grande, por duas vezes, vereador, e um dos fundadores do antigo PSD. Participei ativamente dos primeiros movimentos do grêmio estudantil do colégio e também na faculdade. Depois de terminar a faculdade de engenheiro agrônomo em São Paulo, voltei para Cuiabá e fui trabalhar na Companhia de Desenvolvimento do Estado (Codemat, já extinta), no setor de colonização. Foi, então, que recebi o convite para ser candidato a prefeito de Várzea Grande pela antiga Arena.

MidiaNews – Como foi esse convite?

Júlio Campos – É que meu pai já tinha sido prefeito da cidade, minha família era de lá, embora, na época da Codemat, eu morasse na região de Cáceres, tinha um vinculo muito grande, não só com a cidade, mas também com o Clube Esportivo Operário Várzea-grandense. Acabei sendo eleito prefeito com uma vitória com 2002 votos na frente do empresário e desportista Rubens dos Santos, que também era de uma sublegenda da Arena.

MidiaNews – Sua atuação como prefeito o impulsionou aos cargos de deputado federal e governador. O que o senhor fez de mais importante nessa época?

Júlio Campos – Resolvi fazer um governo moderno para Várzea Grande, ao invés de fazer aquele tradicional feijão com arroz. Pedi ao então governador do Estado, do qual era amigo, José Fragelli, que me cedesse técnicos de alto nível para compor meu secretariado. Entre eles estavam a minha futura esposa, a professora Isabel Pinto. Coloquei como meta, naquela época, transformar Várzea Grande de cidade dormitório de Cuiabá numa economia própria. E conseguimos, trazendo grandes indústrias e madeireiras para a cidade.

Além disso, na época, o governo federal lançou o BNH (Banco Nacional de Habitação), para financiar projetos de pavimentação e saneamento básico das principais cidades brasileiras. Só que Várzea Grande não se enquadrava por não ter mais que 50 mil habitantes. Fiz, então, junto com o prefeito de Cuiabá, Rodrigues Palma, uma parceria para criar a Grande Cuiabá. Aí, nós dois teríamos financiamento para fazer a pavimentação das duas cidades. Pavimentei todo centro de Várzea Grande e reurbanizei a cidade. Dupliquei a Avenida da FEB, com uma iluminação moderna, com aqueles postes altos de mercúrio, o que me deu um prestigio muito grande como administrador.

Tony Ribeiro/MidiaNews
“Saio de cabeça erguida pelo dever cumprido. Sou querido em todo Mato Grosso, respeitado, deixei marcas indeléveis no Estado”

MidiaNews – Como o senhor costurou a sua candidatura ao Governo na época?

Júlio Campos – Foi justamente porque tinha sido um bom prefeito, o deputado federal mais votado e, habilmente, consegui o apoio da maioria da Assembleia Legislativa e dos prefeitos da época. Eu era secretário-geral do PDS e saí em todos os municípios organizando o partido, o que me consolidou de forma que todos os delegados da convenção quisessem Júlio Campos para governador. Participei dessa eleição com 35 anos, disputei a eleição em 15 de novembro de 82 contra o padre Raimundo Pombo, na época, do MDB (hoje PMDB).

MidiaNews – Na época, houve diversas denúncias contra o senhor por suposta fraude eleitoral. Houve algum tipo de fraude nessa eleição?

Júlio Campos – Não. Foi feito uma denúncia, houve até um processo, mas foi indeferido pelo TSE, porque ninguém provou nada, foram mais lendas e fatos criados. A oposição nunca está conformada com a derrota e busca como saída dizer que foi roubada.

Na época, chegaram a afirmar que jogaram urnas no rio, mas isso é tão mentira que o presidente do Tribunal Regional Eleitoral na época, desembargador Onésimo Nunes Rocha, era tio do candidato a vice da chapa contrária, Louremberg Nunes Rocha. Você acha que ele ia ficar conivente com alguma ilicitude? E foi ele quem acompanhou e presidiu as eleições. Só isso já prova que era firula ou então sonho de noite de verão essas denúncias.

MidiaNews – Foi nessa época que acusaram o senhor e o seu grupo de assassinar um candidato a prefeito de Várzea Grande…

Júlio Campos – Sim, ele era de uma sublegenda para prefeito, chamado Quintela, era um homem extremamente violento. Tanto que deu um tapa na cara da professora Sarita Baracat, uma senhora de alto nível, que era candidata a prefeita com ele. No palanque, ele deu um bofetão nela. Quer dizer, um homem que bate na companheira de sublegenda, correligionária e ainda por cima uma mulher, já dá parar perceber o nível de violência. Ele era envolvido com invasão de terras, a morte dele não tem nada a ver com política. Ele morreu três dias depois que perdeu a eleição. Quem manda matar a pessoa que já está derrotada? Não tem sentido. Eles acusaram a mim e ao Jayme [Campos, senador e irmão do deputado]. Mas isso é coisa da oposição, que era muito radical. Na época, não tinha essa convivência pacifica que tem hoje.

“Se eu tivesse o patrimônio que eles falavam que eu tinha, hoje estaria morando na Suíça. Nunca escondi nada do que eu tenho, está tudo declarado na Receita Federal.”

MidiaNews – Como o senhor compôs o seu Governo naquela época?

Júlio Campos – Se eu fosse Presidente da República, ia escolher o melhor quadro do Brasil para ajudar a minha gestão. Essa história de colocar pessoas do partido não funciona, isso é só negociata. Quer coisa mais vexaminosa do que isso que a Dilma fez para aumentar o tempo de televisão? Para pegar um minuto do PR, demitiu o ministro da pasta dos Transportes, que estava indo muito bem, para colocar um cidadão que o PR queria indicar. Isso não se faz. O bom gestor não vai admitir essas coisas, eu nunca admiti isso. Se o partido quer exigir indicação, mando me trazer três nomes, com três currículos para escolher o melhor. Agora, receber imposição? Jamais. O próprio Silval [Barbosa, atual governador] poderia ter tido um melhor governo se não tivesse tido que sacrificar a sua gestão com essas imposições. O gestor fica sem autonomia, sem autoridade para governar.

MidiaNews – Qual foi o maior feito do seu Governo, na sua opinião?

Júlio Campos – O maior feito foi à integração estadual. Fui um governador estadista, que não pensou nos desafios para integrar Mato Grosso. O Araguaia não tinha nada a ver com Mato Grosso, consegui reintegrá-lo ao Estado. Lá, até o horário ainda era de Goiás, não tinham nenhuma ligação conosco. Hoje, eles fazem parte. Integrei, também, o nortão com Cuiabá, a região oeste. Fiz um governo de muita paz, sem perseguição, tanto é que ainda tenho muitos amigos que compunham a estrutura de Mato Grosso.

MidiaNews – Mas a oposição era muito forte?

Júlio Campos – Foi, mas faz parte. Acho que é melhor uma oposição dura, do que uma oposição que se vende a troco de dinheiro e acertos escusos.

MidiaNews – O senhor se lembra de algum fato inusitado durante seu Governo?

Júlio Campos – Na época, inventei uma moda que até hoje o povo tem saudade, que é levar, durante as passagens pelas cidades do interior, a banda de música da Polícia Militar. A banda ia na frente e tinha um desfile, a cidade sabia que naquela hora estava chegando o chefe do Estado. Coisa que hoje não acontece: chega governador, prefeito parece um joão-ninguém. No meu tempo, um tchau do governador parecia uma consagração, porque existia a liturgia do cargo. Hoje, até isso acabou.

MidiaNews – O senhor foi um governador polêmico: deu banana na televisão e afirmou aos professores, durante uma greve, que “a mesma caneta que nomeia, demite”.

Júlio Campos – No caso da caneta, havia dado uma promoção aos professores. Naquele tempo, havia classe e nível e todos tinham sido promovidos nas duas categorias. O crescimento da folha foi de 40%. Mal fiz isso, passados dois meses, vem uma nova greve, com os professores querendo novos aumentos e comandados por uma professora que negociou diretamente comigo. Achei um desaforo! O Estado estava vivendo um momento difícil, com dificuldade para pagar a folha e eles fazem isso, logo após um aumento salarial. Fiquei sabendo da greve quando estava chegando de uma viagem, um secretário me informou que, além dos aumentos individuais, que seriam feitos por classe e nível, eles queriam mais um aumento geral. Ai fiquei muito revoltado com a falta de compromisso e palavra, e mostrei a caneta e afirmei que ‘a mesma caneta que nomeia e promove, é a mesma que pode demitir e desclassificar’. Falei isso na TV, não nego.

Com relação à banana, há uma versão mentirosa, não mostrei aos professores, mostrei para o então candidato a prefeito de Cuiabá, Dante de Oliveira. Na época, houve a primeira eleição direta para prefeito, eu era governador e lancei o professor Gabriel Novis Neves, tendo como vice o Silva Freire, que era muito amigo do Brizolla. – E, pela primeira vez, consegui colocar ele e o Roberto Campos, inimigos ideológicos, no mesmo palanque, lutando pelo professor -.

“Com relação à banana, há uma versão mentirosa, não mostrei para professor, mostrei para o então candidato a prefeito de Cuiabá, Dante de Oliveira”

Então, a oposição fez uma carreata e ao chegar em frente à Residência dos Governadores [na Rua Barão de Melgaço, atrás do Palácio Alencastro], o pessoal da comitiva do Dante jogou dois cachos de banana dentro da casa. Foi uma provocação. E, quando cheguei, eles me mostraram a banana . À noite, na TV Brasil Oeste – que, na época não era minha -, houve uma entrevista com a minha participação e aproveitei para devolver a banana ao Dante. O pessoal da oposição falou que foi para professor. A oposição era muito radical. Tudo que se inaugurava em Cuiabá afirmavam que era meu, diziam que eu era o homem mais corrupto de Mato Grosso. Mas, se tivesse o patrimônio que eles falavam que eu tinha, hoje estaria morando na Suíça. Nunca escondi nada do que tenho, está tudo declarado na receita federal.

MidiaNews – Como era a estrutura quando o senhor foi governador?

Júlio Campos – Era muito pequena. Nossa receita era o que hoje corresponde a R$ 30 milhões. Já no Governo do Jayme chegou a R$ 50 milhões. Mesmo assim, o que me ajudou foram os empréstimos externos que recebemos e a ajuda do Governo Federal, que naquela época era muito dadivoso em mandar recursos federais para execução de obras. Os governos militares investiam muito no centro-oeste e com obras de qualidade, bem feitas, sem superfaturamento, sem essas mazelas de hoje. Tínhamos muito recurso a fundo perdido, que vinha de Brasília. Os presidentes da época faziam questão de estar presentes nas inaugurações de obras.

MidiaNews – Quais eram os principais desafios da época que o senhor foi governador?

Júlio Campos – O de sempre. Em Mato Grosso sempre faltou infraestrutura, estradas, energia, construção de escolas, porque a gente recebia muito emigrante, postos de saúde e hospitais. E havia a questão da Segurança Pública: somos um estado que faz fronteira com dois países, a segurança sempre precisou de atenção e éramos um estado meio isolado. Então, precisamos investir bastante nesse setor.

MidiaNews – Traçando um paralelo da época em que o senhor foi governador até hoje, como está o Estado, na sua opinião?

Júlio Campos – Acho que melhorou muito. Temos que reconhecer que é um Estado potência em termos de produção da agricultura, pecuária e agronegócio. Temos que reconhecer que, nesses 40 anos pós-divisão do Estado, Mato Grosso conquistou um respeito na Federação. Deixou de ser primo pobre, para ser o primo rico do país. E, se tudo ocorrer bem, em 10 anos alcançamos o Paraná.

Mas ainda temos algumas dificuldades, como de logística, transporte… Até hoje, não temos a ferrovia cortando nosso Estado, não temos as hidrovias funcionando, as estradas são ruins e a manutenção pior ainda, os recursos são poucos. O Fethab, que deveria ser empregado totalmente em rodovias, foi desviado para outros tipos de atividades, como as obras da Copa. A Educação é baixa e embora o salário esteja bem, é pouco para o que merece ganhar um professor. A Saúde está um caos e não é só culpa do Governo do Estado e da Prefeitura, é culpa também do Governo Federal, que não repassa os recursos que a saúde deveria receber. A maioria dos recursos é para pagar dívida, ninguém aguenta mais essa dívida brasileira.

Mas é um estado de futuro. Por exemplo, no meu tempo, se arrecadavam R$ 360 milhões por ano, hoje se arrecadam R$ 1 bilhão por mês. Quer dizer, o Estado está viável economicamente. Claro que, com esse endividamento das obras da Copa, vamos ter dificuldades, mas estamos crescendo. Acho que com seriedade e um bom administrador, em um ano, Mato Grosso estará em ordem novamente, dependendo de quem a sociedade escolher como governador.

MidiaNews – Colocando, por assim dizer, tudo na balança, o que teve de bom e ruim nesses 40 anos de sua vida política?

Júlio Campos – A vida pública é fascinante. Para mim, que nasci político praticamente, que vivi a política a vida toda, é fascinante. É claro que nunca deixei de ser empresário, tenho um misto de político e empresário. Meu pai e minha mãe também eram assim, mesclando ambos. Meu pai tinha a Futurista, empresa que começou pequena e que fechou. Na época em que fui governador, pedi que ele fechasse para não falar que eu estava usando a máquina. Era o maior atacadista do Estado de Mato Grosso, distribuindo mercadoria por todo interior, chegando a Rondônia e Acre.

Então, temos uma veia empresarial e, nesse decorrer da minha vida, também fui corretor de imóveis. Me orgulho de ter sido presidente da Associação de Profissionais Corretores de Imóveis de Mato Grosso. Tenho uma empresa que se chama Empreendimentos Santa Laura S.A, que montei nos anos 70. Desde criança, sempre gostei de comércio e mesmo optando pela vida pública, nunca deixei as minhas coisas. Tanto que temos também uma empresa de mineração, a Televisão Brasil Oeste, a Rádio Industrial, a Rádio Jovem Pan, também administro o patrimônio que meu pai deixou, sou inventariante do espólio dele. Minha mãe está com 89 anos, meu pai morreu com 90. Se tudo correr bem, quero chegar até os 80.

“É uma campanha democrática. Com o Riva afirmando sua candidatura, acredito que vá para o segundo turno, Se fosse só entre Ludio e Taques, dificilmente teria segundo turno. Esperávamos que Taques ganhasse no primeiro turno”

Então, a vida pública é feita de momentos de alegria e tristezas, mais tristezas do que alegria, mas as poucas alegrias que temos vale a pena o sacrifício. E, na vida pública, você tem que entender que tem a hora da saída, você não pode ficar apegado. Nunca fui apegado a cargo. Por exemplo, fui quase tudo dentro do Senado e vou lá, hoje, o mínimo necessário, não fico naquela história de ficar revivendo. Acho que é uma missão que você recebe da população, e acho que cumpri bem a minha missão.

MidiaNews – O senhor se arrepende de alguma coisa nesse período?

Júlio Campos – Acho que não, não me arrependo de nada, porque fiz tudo da melhor maneira possível. Cometi erros? Cometi. Poderia ter feito mais? Poderia. Mas, dentro das possibilidades da democracia, cumpri meu papel. Vivi três momentos na minha vida: um momento de uma democracia na época em que era jovem; depois, a ditadura militar; depois, a reabertura democrática, como é hoje. Inclusive, acho que hoje a democracia é até excessiva, porque há determinados movimentos que se transformam em verdadeiro ato de vandalismo e s autoridades perderam a sua voz. Mas, acredito que entre altos e baixos, saio feliz, com a consciência tranquila de dever cumprido.

MidiaNews – Como o senhor enxergava a Ditadura Militar, na época?

Júlio Campos – Quando começou o regime militar, eu era garoto. Em 64, era estudante secundarista. Não deu para sentir, porque aqui em Mato Grosso não teve muito reflexo desses movimentos que houve em São Paulo ou no Rio de Janeiro. Aqui foi mais calmo, o Estado era pequeno, cidade pequena, todos se conheciam, houve pouca movimentação. Mas, em termos de desenvolvimento econômico e social, para o Estado de Mato Grosso, o movimento militar foi muito benéfico, não se pode esconder. Se hoje somos este Estado potência, devemos muito aos governos dos presidentes Médici, Geisel e Figueiredo, não resta duvida.

Mas a grande falha foi não ter feito a abertura logo após o regime Médici. Se após esse período, que foi um dos mais duros, tivessem feito a abertura, acho que seria bem melhor para o país. Outro erro do regime militar foi não ter dedicado esse período no investimento da Educação. Se nesses 20 anos no poder tivessem colocado a Educação como prioridade, nós teríamos um país de Primeiro Mundo, como são a Coreia, o Japão, que investiram na Educação e transformaram a nova geração. Espero que os próximos governos sejam voltados para a Educação. Se eu fosse governador, iria me dedicar muito na Educação, como, por exemplo, no ensino integral. Lamento que no meu governo não pude fazer isso, isso é uma das minhas tristezas.

MidiaNews – Qual a diferença das políticas partidárias e administrativas de antigamente e de agora?

Tony Ribeiro/MidiaNews
“A única condenação que eu tive foi com relação a uma fala minha contra o Murilo Domingos, que eu disse que ele estava fazendo corrupção em Várzea Grande”

Júlio Campos – A diferença é grande. Naquela época, o político tinha o desejo de fazer carreira política, tinha um ideal, queria ser prefeito, deputado federal, governador e sonhava até ser presidente, como eu sonhei. Sempre acreditei que se fosse um grande governador de Mato Grosso, poderia ser presidente da República um dia. Hoje, lamentavelmente, grande parte dos políticos pensam só em ficar ricos. A corrupção se generalizou em um patamar muito alto, tanto que a população está revoltada. Falta remédio nos postos de Saúde, hospitais estão em decadência total, a educação é de péssima qualidade, segurança de mal a pior, com violência estrondosa, obras superfaturadas, mal feitas, tudo isso revolta a população. Então, a diferença é que naquela época o político tinha ideal e fazia um bom governo. Conheço muita gente em Mato Grosso que quer ser político apenas para ficar rico, para ficar importante.

MidiaNews – Inclusive no seu grupo político?

Júlio Campos – Também, deve ter. Não vou dizer que lá só tem santo (risos).

MidiaNews – Como o senhor vê a campanha eleitoral entre Pedro Taques, Ludio Cabral e José Riva?

Júlio Campos – É uma campanha democrática. Com o Riva afirmando sua candidatura, acredito que vá para o segundo turno, Se fosse só entre Ludio e Taques, dificilmente teria segundo turno, esperávamos que Taques ganhasse no primeiro turno. Mas, agora, com três fortes lideranças disputando, deverá ter segundo turno, pela primeira vez em Mato Grosso

“Já falaram diversas coisas a meu respeito, já falaram até que eu era homossexual… Mas, na vida pública, você tem que estar preparado para todo tipo de acusação”

MidiaNews – E como o senhor vê cada uma dessas candidaturas?

Júlio Campos – As pesquisas já mostraram e acredito que Taques vai chegar em primeiro lugar. Mas vamos aguardar o desempenho daqui para frente, até porque não constava nas pesquisas o nome do Riva, só do Ludio, Julier e Taques. O quadro mudou, qualquer fala minha, agora, será incoerente, porque daqui a 30 dias tudo pode mudar. Espero que viabilizemos não só a candidatura de Taques ao Governo, como de Jayme ao Senado, que está em primeiro lugar nas pesquisas, e também de uma boa bancada estadual e federal para ajudar o Estado a crescer.

MidiaNews – Quais os pontos fracos dos três principais candidatos?

Júlio Campos – Isso prefiro não responder, porque não tenho intimidade ou proximidade com nenhum deles.

MidiaNews – Nem com Pedro Taques?

Júlio Campos – Nem com ele. Minha convivência é esporádica, lá em Brasília. O Lúdio, conheço de vista. Já Riva conheço há algum tempo, mas também sem intimidade familiar.

MidiaNews – Qual mensagem o senhor deixa para o próximo governador?

Júlio Campos – Que ele faça um bom governo para o desenvolvimento econômico e social principalmente aos mais humildes.

MidiaNews – Qual deve ser o principal foco do próximo governador?

Júlio Campos – Organizar as finanças públicas do Estado e também moralizar as coisas públicas.

“É claro que você não consegue agradar a todos, é meu caso, em que há dois caminhos: ou gosta ou desgosta. Nem Jesus agradou a todos, não serei eu que satisfaria a todos”

MidiaNews – O Júlio Neto, seu filho, vai tentar uma vaga na Assembleia. O senhor está ajudando ele com dicas, conselhos?

Júlio Campos – Sim, converso, oriento, mas ele tem que ter vida própria. Tanto é que ele tem as atividades político-partidárias independentes da minha. Ele está por conta própria, até porque não quero que ele seja um político dependente do pai. Afinal, não sei até quando vou estar por aqui.

MidiaNews – Deputado, ao longo da sua carreira, o senhor sofreu uma série de acusações, como assassinato por disputa de terras, já respondeu a ações na Justiça comum e na eleitoral. Como o senhor vê essas acusações?

Júlio Campos – Tive só um processo de improbidade lançada no Tribunal de Contas, mas fui absolvido por um juiz da Fazenda Pública. As minhas declarações de renda estão ai. Nesse caso das disputas de terra, um cidadão, que já faleceu, me acusou de ser um dos mandantes do crime. Ele era meu sócio, fiquei com uma parte e ele com outra, mas ele se envolveu com outros assuntos, que não tenho conhecimento, e acabou morrendo. Aí, me acusaram para um delegado de São Paulo e esse delegado veio até aqui fazer chantagem para tomar dinheiro. Mas ele não teve sucesso, porque a partir do momento que você aceita chantagem, você está liquidado, é preferível responder a um processo que aceitar chantagem. Esse processo corre há 10 anos e não há nada, o que há é um inquérito contra mim.

A única condenação que tive foi com relação a uma fala minha contra o Murilo Domingos, que disse que ele estava fazendo corrupção em Várzea Grande e ele entrou com um processo e fui condenado. Depois ele foi cassado por corrupção. Mas já falaram diversas coisas a meu respeito, já falaram que eu era homossexual… Mas, na vida pública, você tem que estar preparado para todo tipo de acusação.

“Político tem que ser corajoso, destemido e pronto para enfrentar qualquer coisa. Eu já enfrentei eleições, já perdi, já ganhei, já respondi a processo. Se você não tiver postura, é melhor não entrar para a vida pública”

MidiaNews – Tem uma ação correndo no TRE, por suposta compra de votos na campanha de 2010. O relator, juiz José Luiz Blaszak, chegou a pedir sua cassação.

Júlio Campos – Sim, mas esse processo ainda está correndo e não vou comentar.

MidiaNews – O senhor tem medo de terminar a carreira política sendo cassado no seu último mandato?

Júlio Campos – O político que tiver medo de alguma coisa ruim ocorrer, não deve ser político. Político tem que ser corajoso, destemido e pronto para enfrentar qualquer coisa. Já enfrentei eleições, já perdi, já ganhei, já respondi a processo. Se você não tiver postura, é melhor não entrar para a vida pública.

MidiaNews – Esse tipo de acusação não pode ser uma marca negativa na sua carreira?

Júlio Campos – Não tem um político que tenha saído apenas com marca positiva. Juscelino Kubitschek foi o maior presidente deste país e, no entanto, houve diversas acusações contra ele. É claro que você não consegue agradar a todos e esse é meu caso, em que há dois caminhos: ou gosta ou desgosta. Nem Jesus agradou a todos, não serei eu que satisfaria a todos. O que vale ficar é o trabalho que fiz perante a todos e a minha consciência tranquila.

MidiaNews – O senhor perdeu duas eleições na sua carreira, a esposa do Jayme Campos, Lucimar, também perdeu as eleições para Prefeitura de Várzea Grande em 2012. Os Campos estão perdendo espaço na cidade?

Júlio Campos – Não, acredito que foi o momento político. A Lucimar perdeu por 2 mil votos, porque não quis fazer boca de urna. Ela é contra contratar alguém para ficar pedindo votos e todos fizeram isso, o Walace Guimarães e o Tião da Zaeli. Ela não quis. O Walace tem até processo por isso, era público e notório o que ele fez. Mas a Lucimar se recusou a fazer e perdeu.

Mas não estamos perdendo espaço, podemos ganhar agora. O Jayme, nas pesquisas, está em primeiro e faz mais de 60% em Várzea Grande contra qualquer um.

Tony Ribeiro/MidiaNews
“Aceitar cargo de prefeito, hoje, no Brasil, onde o município é tratado como se fosse do terceiro escalão, é complicado”

MidiaNews – Os Campos fizeram o que estava ao alcance quando governaram ou deixaram de fazer algo?

Júlio Campos – Fizemos o máximo permitido dentro dos recursos da época, mas faltou, sim, sempre falta. Se Jayme tivesse tido uma má gestão, não estaria bem avaliado nas pesquisas, mesmo após quase 38 anos de vida pública. De cada 100 pessoas, 40 ainda acreditam nele, o que é o dobro do Wellington Fagundes.

MidiaNews – E como está Várzea Grande hoje nas questões estruturais?

Júlio Campos – A cidade está muito judiada, porque está há 10 anos sem gestão. Uma cidade que fica sem gestão pública, vivendo a Deus-dará, fica complicado. Só na gestão passada, foram quatro prefeitos. Mas acredito que Walace, se tiver inteligência, pode fazer uma recuperação e até viabilizar sua reeleição. Caso contrário, vai ser massacrado daqui a dois anos.

MidiaNews – Como o senhor avalia a gestão dele?

Júlio Campos – Por enquanto, regular. Não está boa, porque a população está muito revoltada, porque está faltando tudo.

MidiaNews – Hoje, quais são os problemas de Várzea Grande?

Júlio Campos – Os mesmos de Mato Grosso: faltam Saúde, Infraestrutura, Educação… Lá tem muito lixo, obras superfaturada, tudo isso devido a corrupção. Mas também temos que avaliar que hoje é difícil, qualquer prefeito é um sofredor. Aceitar cargo de prefeito, hoje, no Brasil, onde o município é tratado como se fosse do terceiro escalão, é complicado. Às vezes, o problema não é o prefeito, é a falta de recurso. A demanda é muito grande para pouco recurso disponível.

MidiaNews – Como o senhor avalia a situação do Vale do Araguaia? O Governo se esqueceu da região?

Júlio Campos – Até pouco tempo, eles eram chamados de o Vale dos Esquecidos, mas agora está “explodindo” aquela região: com agricultura e pecuária, vai ser uma região muito próspera. Então, está na hora de o Governo olhar com mais carinho para aquela região que tem um potencial imenso de ser um grande polo de desenvolvimento econômico e social para Mato Grosso.

Fonte: MidiaNews

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