Haitianos relatam dificuldades no interior de MT

17/10/2014 00:25

O grupo de haitianos que reside em Sinop e está no Brasil na condição de refugiados relatou à Subseção da OAB/MT a situação que vivenciam, apontando problemas enfrentados com relação a emprego, atendimento médico, alimentação e moradia. Atualmente, cerca de 120 pessoas vindas do Haiti estão no município, alojados em residências no bairro Alto da Glória e nas proximidades da Avenida dos Jequitibás.

Entre os principais problemas apontados pelo grupo está a questão salarial. Os haitianos afirmam que recebem valores abaixo dos pagos aos brasileiros. O idioma natural (crioulo ou francês) é apontado como um dos entraves pelos empregadores, segundo um haitiano que prefere não ser identificado.

“Os que são assalariados recebem valores menores do que os brasileiros. A maioria trabalha na informalidade, ou seja, fazem diárias. Vários possuem qualificação em diversas áreas, têm ensino superior completo ou cursavam algum curso superior no Haiti. A situação de refugiados, o idioma diferente, a falta do português fluente e outros fatores são usados como desculpa ou argumentos pelos empregadores para nos pagarem valores abaixo dos que realmente são praticados ou pagos a brasileiros que ocupam os mesmos cargos que nós”, declara o haitiano.

O grupo também reclama da falta de atendimento médico. A maioria está em Sinop há mais de seis meses e desde então não teve nenhum atendimento clínico ou acesso a exame laboratorial. A condição de refugiados também dificulta o atendimento e encaminhamentos mais complexos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). “A distância da família e as dificuldades que enfrentamos nos afetam também psicologicamente. Muitos estão caminhando para um estado depressivo”, acrescentou a fonte.

O cenário político instável, a guerra civil e as consequências deixadas pelo terremoto que assolou o Haiti em 2010, matando 240 mil pessoas e deixando 1,5 milhões de desabrigados, a tempestade tropical Isaac que em 2012 causou perdas agrícolas em torno de 254 milhões de dólares e colocou 1,6 milhões de habitantes em situação de emergência são fatores que impulsionaram e obrigaram milhares de haitianos a buscarem novas oportunidades em países como o Brasil.

De acordo com um dos haitianos, que está há sete meses em Sinop e que deixou esposa e três filhos no país de origem, é comum famílias inteiras somarem suas finanças e contribuírem para enviar um único representante ao Brasil com o objetivo e a esperança de que esse familiar possa trabalhar e ajudar os parentes financeiramente. “As pessoas não tem noção da situação de miséria e desespero que vive o Haiti, de como é difícil ter que viver longe da família, com a qual mal conseguimos nos comunicar. Não viemos para outro país a passeio, como turistas, também não queremos que nos vejam como coitados ou aproveitadores. Nosso único objetivo é conseguirmos trabalhar dignamente, com os direitos que nos foram atribuídos respeitados para que possamos ajudar nossos familiares que ficaram no Haiti e que contam e esperam por essa ajuda”, ressalta o haitiano.

Oficialmente, a União reconhece os haitianos como refugiados. Ao adentrarem o país eles recebem carteira de trabalho e número de CPF, o que lhes garante direitos trabalhistas. Em Sinop, o grupo divide residências. Em algumas casas somente um indivíduo possui renda. “Moramos em quatro homens e somente eu possuo renda e ainda assim de diárias que faço como soldador. Tem meses que não consigo mandar nada para minha família, porque tenho que pagar o aluguel e surge uma despesa anormal com remédios ou outro fator. Temos uma situação em que 12 homens dividem uma quitinete com apenas dois quartos”, relata o haitiano.

Posicionamento

Após os relatos e reivindicações, a diretoria da OAB/Sinop foi conferir in loco a situação de moradia de parte do grupo, como informa o presidente da Subseção, Felipe Guerra. “Visitamos duas residências, inclusive onde moram 12 pessoas e podemos constatar a situação que nos foi relatada. Essas reinvindicações chegaram à OAB/Sinop e entendemos que é uma situação humanitária. O Brasil ofereceu refúgio, abrigo e apoio ao povo haitiano e a União deve assistência a esse povo. Assim como recebemos milhares de turistas de braços abertos também temos que receber de forma digna essas pessoas que vivenciam uma situação tão delicada e complexa”.

Sobre a questão trabalhista, a diretoria da Subseção adiantou que os haitianos são muito discretos ao citar nomes de empregadores e empresas por receio de represálias. “Sou obrigado a afirmar que eles têm certa razão com relação à essa postura, mas claro que em momento oportuno essas informações irão chegar ao Ministério do Trabalho, que deverá tomar as decisões cabíveis”, observa o advogado.

No dia 14 de outubro, a OAB/Sinop irá realizar uma reunião com representantes das secretarias municipais de Saúde, Assistência Social, pastorais, empresas privadas, parceiros da Subseção, igrejas entre outras instituições. “Vamos expandir essa situação a segmentos que, acreditamos, também abraçarão a causa e poderão ajudar de alguma forma. Os primeiros contatos feitos já revelam esse apoio. Após a reunião teremos respostas mais concretas para apresentar ao grupo. Sobre o pedido de regularização documental estamos finalizando um documento que será encaminhado para o Conselho da Seccional de Mato Grosso e também ao Conselho Federal da OAB”, destaca Guerra.

O presidente da OAB/Sinop ressalta a importância da assistência aos haitianos em Sinop. “Em todo o país são cerca de 60 mil haitianos. A porta de entrada deles é pelo Acre e na sequência tomam diversos destinos dentro do Brasil. Em Sinop, ainda vivenciamos uma situação que pode ser solucionada, com conscientização de empregadores e da sociedade, porém se não dermos a atenção devida a essa realidade agora, poderemos ter em médio prazo uma situação muito mais complexa e de difícil assistência. O que eles buscam é simples, direitos que lhes são assegurados pela própria União e condições dignas de vivência para que possam alcançar seus objetivos, entre eles e, o principal, que é ajudar os familiares que ficaram em seu país de origem”, frisa o advogado.

Fonte: Midia News

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