Cenário econômico em 2016 ainda deve ser marcado pela apatia

06/01/2016 18:24

Todos os prognósticos inicialmente traçados pela equipe econômica do governo foram, literalmente, atropelados pela instabilidade dos últimos meses

O tumulto do cenário político brasileiro acabou por comprometer o desenrolar da economia brasileira ao longo de 2015, que prometia ser complicado por si só por conta da necessidade de se controlar a inflação e ajustar as contas públicas.

“2015 já se sabia que seria um ano difícil pela necessidade de conter inflação, principalmente depois que governo decidiu dar tarifaço no fim do ano passado, e justamente a razão do tarifaço é a necessidade de ajustar as contas públicas”, explica Fernando Sampaio, sócio-diretor da LCA Consultores. “O segundo fator que sinalizava 2015 ruim, é a necessidade de ajuste das contas públicas. O ajuste das contas públicas e o combate à inflação foram dois fatores recessivos, mas a potência foi muito reforçada pela queda da confiança, seja da confiança entre consumidores e empresários, seja entre investidores internacionais que se traduz em risco Brasil”.

Segundo Mauricio Molan, economista-chefe do banco Santander no Brasil, em 2015 tinha-se o início do segundo mandato de Dilma Rousseff, com um ministro da Fazenda (Joaquim Levy) que faria ajustes e levaria o país a uma retomada no crescimento. “Na prática, não se teve condições políticas, a contração do PIB dificultou ajuste e a economia continuou piorando em um ciclo vicioso. A expectativa foi totalmente frustrada, e você termina o ano com uma condição fiscal e ambiente político ruim”.

Para os economistas consultados, as incertezas continuarão a pesar no cenário econômico brasileiro em 2016, pelo menos durante o primeiro trimestre – embora os fatores de influência acabem oscilando com maior ou menor intensidade. Confira abaixo os prognósticos dos economistas para alguns indicadores macroeconômicos em 2016:

PIB (Produto Interno Bruto): Sampaio diz que dificilmente o PIB não será negativo, uma vez que o carry over (carregamento estatístico de um período para o outro) deve ficar em torno de 3,5%. “O carry over faz diferença para a gente entender o que falamos em alguns números de atividade econômica. Se nossa projeção de 2015 estiver correta, a economia começará 2016 1,8% abaixo da média vista em 2015”.

Mauricio Molan, do Santander, também projeta PIB negativo, na ordem de -2%. “Em algum momento você vai parar de cair, vai se estabilizar e fazer oscilações entre dados positivos e negativos. A queda deve ser de -2%, com alguns trimestres positivos e outros negativos. Interrompe a queda, mas provavelmente não vai ter nenhum crescimento”.

“Na atividade econômica, reafirmamos nossa estimativa para o desempenho do PIB de 2015 de retração de 3,5% e para 2016 queda de 2,6%”, diz a Austin Ratings. “Se nossas projeções forem concretizadas, o ano de 2015 será o pior resultado desde 1990 (-4,35%), bem como será o primeiro biênio de retração econômica desde a década de 1930”.

Inflação – Molan acredita que a inflação apurada pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) deve apresentar uma queda substancial em relação ao fechamento de 2015, e encerrar o próximo ano em torno de 7%.”Vejo analistas com projeção igual ou acima do que estimamos para o ano que vem, mas achamos que vai reduzir. A contração do mercado de trabalho está forte e a recessão também, e agora você tem fatores que jogam contra, como o cambio, que continua se deteriorando ainda mais e provavelmente vai ter um impacto inflacionário mais forte”.

Em relatório, a equipe do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos do banco Bradesco explica que o fato de a inflação encerrar 2015 acima de 10,5% tem um papel importante na formação de preços do ano que vem. “Por exemplo, o salário mínimo sofrerá um reajuste elevado (cerca de 11%). Mas a indexação também está presente em diversos preços administrados, em aluguéis, e mesmo de maneira implícita em serviços (manicure, cursos, consertos) e outros itens da cesta de consumo das famílias”, dizem.

Taxa Selic – Para Sampaio, da LCA, a taxa básica de juros não deve apresentar mudanças, seguindo em 14,25% até o fim de 2016. Por outro lado, Molan acredita em uma taxa Selic de 13% para o fim do ano.

“O BC está sinalizando alta de juros, que deve aumentar no começo do ano. Contudo, em uma análise mais detalhada, vemos que a inflação vai cair no ano que vem, mas as expectativas estão piorando. Não é uma decisão em função de dados objetivos, mas para controlar as expectativas. Com a inflação corrente mais controlada, as expectativas também se controlam”, diz o economista do banco Santander.

Dólar – Para Molan, a cotação deve se estabilizar entre R$ 4 e R$ 4,20.”No ajuste real da taxa de câmbio – quando você ajusta pela inflação -, (a cotação) está em um nível compatível com uma melhora importante das contas externas. Não vejo a necessidade de um ajuste mais forte, e por isso acreditamos em uma estabilização na casa de R$ 4”.

Na visão dos economistas do banco Bradesco, por conta da forte correlação do câmbio com a percepção de risco aferida pelo CDS (Credit Default Swap) de 5 anos, haverá alguma acomodação do risco na sequência da definição do processo de impeachment ao longo do ano novo, qualquer que venha a ser o seu desfecho. “Assim, nosso cenário é o de que o risco Brasil, ao final de 2016, possa estar em torno de 350 pontos básicos o que seria coerente com uma taxa de câmbio em torno de R$3,80/US$ ao final do ano que vem. Se o risco país se mantiver no patamar de 500 pontos básicos, o cenário de câmbio para o final de 2016 se deslocaria para R$ 4,00/US$”.

Balança comercial – Na visão de Sampaio, da LCA, o comércio exterior deve fechar o novo ano com um superávit de US$ 38,8 bilhões. “A única coisa boa para a atividade econômica é a desvalorização cambial, que melhora as condições de competição com os produtos estrangeiros”.

Para Molan, a depreciação cambial vai gerar um impulso no processo de substituição de importações e ajudar a atividade econômica. “Vemos dois fatores promissores: o impacto do câmbio na troca de importação, mais do que qualquer impacto em exportação, que é mais lento”. A queda da taxa de inflação também vai ajudar no componente de expectativa, diz o economista. “A recuperação sustentável requer, na nossa visão, exige uma sinalização mais robusta, mas tais fatores devem impedir queda”, diz Molan, que projeta um superávit comercial na ordem de US$ 37 bilhões para o próximo ano.

Contas Externas – Para Agostini, o saldo de transações correntes ao fim de 2016 deve atingir US$ 55 bilhões negativos, menos do que o projetado para 2015 (em torno de US$ 60 bilhões), mas o comparativo ante o PIB deve apresentar piora. “Em 2015 estamos com 3,3%, e ano que vem em 3,7% – em termos relativos existe piora, pois falamos de uma desvalorização do câmbio de 10% se considerar o fim de ano”.

De acordo com o banco Bradesco, uma notícia favorável é a expectativa de redução do déficit em conta corrente ao longo do ano.O déficit do balanço de pagamentos medido pelo critério clássico (que é o único relevante) saiu de US$ 91,3 bilhões de dólares (quase 4% do PIB) no final de 2014 para um pouco abaixo de US$ 50,0 bilhões (nossa estimativa é US$ 48,9 bilhões, 2,7% do PIB) em 2015”, diz o banco. Esse ajuste em grande parte pode ser explicado pela forte contração das importações (US$ 231 bilhões para US$ 172 bilhões, na mesma base de comparação) e pela redução do déficit da conta de serviços e rendas, especialmente na conta de viagens e de lucros e dividendos.

“Para 2016, acreditamos que o ajuste externo deve continuar impulsionado pela queda das importações (-9%) e recuperação das exportações (+6,5%), que resultarão numa forte melhora de saldo comercial que saltará para US$ 44 bilhões em 2016, compatível com um déficit em conta corrente bastante próximo de zero (de US$ 5,1 bilhões equivalente a -0,3% do PIB). Trata-se, na nossa visão, do mais brutal ajuste de balanço de pagamentos da história em um período de dois anos”, pontuam os economistas do Bradesco.

Contas Públicas – “Na parte fiscal, projetamos um déficit de US$ 64,9 bilhões, quase 1,1% do PIB, enquanto a dívida líquida pode chegar a 42% do PIB”, explica Alex Agostini. “O cenário econômico de contas públicas continua bem ruim, e o governo tem pouca margem de manobra, e  na que tem não deve mexer”.

Segundo Sampaio, da LCA, a projeção aponta um resultado primário de -1,5% do PIB no próximo ano, revertendo o superávit de 0,3% em 2015. “O desempenho péssimo da arrecadação não é surpresa pois a arrecadação é pró-cíclica, e reage mais proporcionalmente quando PIB cresce e vice versa. Teve corte de gastos, mas queda de receita foi tão forte que anulou o impacto sobre o superávit primário”, explica. “Quanto ao ajuste fiscal: a gente tem uma ilusão parece não tão complicado pois já aconteceu várias vezes, mas é muito difícil. Das ocasiões que o Brasil conseguiu fazer ajuste no meio da recessão, contamos com mercado internacional tendo ajuste forte que levou a aumento das exportações, isso aconteceu em 1984 na saída da recessão dos anos 80, no que houve durante período Itamar Franco – tinha crise por falta de dólar, que não está presente nessa crise”.

 

por Tatiane Correia em JornalGGN
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