BC decide cortar juros

02/03/2016 17:46

Inflação, câmbio, pressão política, cenário externo, está tudo em jogo. A questão é quando o BC vai começar a fazer os necessários cortes nas taxas de juros.

O Banco Central decide hoje à noite o rumo da taxa básica de juros da economia, atualmente em 14,25%. É praticamente consenso que ela será mantida nesse patamar, até pelo menos junho. Depois, os movimentos devem ser de corte. A questão é: quando o BC vai começar o afrouxamento?

Os economistas consultados no Boletim Focus acreditam, na mediana, que o primeiro corte aconteça em 2017, em 0,50 ponto percentual. O mercado de juros futuros, porém, começou a incorporar nesta semana em suas expectativas um corte já no segundo semestre deste ano.

Vale observar que as expectativas quanto à política monetária brasileira estão tão voláteis quanto o preço das commodities. No começo do ano o mercado acreditava que o BC ainda subiria um pouco mais os juros antes de parar – era o que a própria autoridade monetária indicava até a véspera do Copom (Comitê de Política Monetária) de janeiro.

Depois do BC voltar atrás em sua comunicação, a aposta passou a ser que o próximo movimento seria de corte, com o Copom cedendo às pressões da recessão, iniciando um ciclo de ajuste mesmo com a inflação ainda em patamar elevado.

Segundo o Boletim Focus mais recente, a Selic deve cair dos atuais 14,25% para 12,50% até o fim de 2017. Já a inflação não chega no centro da meta nem no ano que vem. Apesar da desaceleração estimada para o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) de 10,71% em 2015 para 6% no próximo ano, o patamar previsto ainda é perigosamente alto, encostando no teto da meta, e tem viés negativo.

“As primeiras divulgações de inflação do ano foram acima das expectativas e mostrou que a inércia inflacionária ainda é um grande desafio”, observa João Pedro Ribeiro, analista do banco Nomura, após resultados acima do esperado no IPCA de janeiro (1,27%) e parcial de fevereiro (1,42%).

De acordo com Luciano Rostagno, estrategista-chefe do Banco Mizuho do Brasil, ao cortar as taxas de juros o BC sinalizará que “sucumbiu às pressões políticas” e a economia poderá passar por um repeteco do que foi visto em 2012, quando a Selic foi cortada antes de ancorar as expectativas de inflação, levando – entre outros fatores – ao posterior descontrole das previsões do IPCA.

“Estamos caminhando para esse cenário. O BC sucumbe à pressão política, corta juros e a inflação continua elevada e sem nunca convergir para o centro da meta. Esse é o cenário mais provável. Dessa forma, a inflação deve se manter alta, mas a mudança também não ajuda o PIB a crescer”, diz Rostagno.

Nelson Marconi, professor da FGV/EESP (Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas), no entanto, não vê o risco de repetirmos 2012. “O cenário é bem diferente. Hoje temos inflação mais alta e recessão. Não acredito que nem BC nem Fazenda vão tomar essa atitude”, avalia.

O professor da FGV diz acreditar que os cortes só vão começar quando começarmos a vislumbrar uma desaceleração da inflação, o que deve acontecer em breve dados os menores ajustes dos preços administrados, um câmbio mais estável e uma menor pressão de preços de serviços. “O risco para isso é se tivermos uma maior deterioração da crise política, com o governo não conseguindo aprovar nada de fiscal e da reforma da Previdência, o que tem impacto no câmbio e acelera a inflação”, avalia.

Cortes antes de 2017

Com a contínua deterioração econômica, que deve ter registrado no ano passado o maior tombo da série histórica, operadores de mercado e alguns economistas acreditam que o BC pode dar início ao afrouxamento monetário ainda neste ano, especialmente se a inflação mostrar desaceleração de pelos menos dois pontos percentuais. A inflação oficial do país acumula alta de 10,84% em 12 meses até fevereiro, conforme resultados parciais.

“Acreditamos que a capacidade do Banco Central para cortar a taxa ainda neste ano está vinculada à queda da inflação daqui em diante comparada à expectativa do BC de recuo de dois pontos percentuais”, afirma o analista do banco Nomura.

Para o economista-chefe do Itaú Unibanco, Ilan Goldfajn, a Selic deve ser mantida no patamar atual de 14,25% até a reunião de julho devido às elevadas taxas de inflação, mas começar a ser reduzida a partir de agosto. A aposta de Goldfajn é em três cortes de 0,50 ponto percentual (pp), encerrando 2016 em 12,75%.

O risco para esse cenário, segundo o Itaú, está em uma eventual depreciação mais intensa do real frente ao dólar. O economista-chefe do banco avalia que há “riscos substanciais” que poderiam causar a maior deterioração da moeda brasileira, como a desaceleração global e a política fiscal doméstica.

A consultoria BBH (Brown Brothers Harriman) observa que há rumores de que o PT esteja pressionando a presidente Dilma Rousseff a abandonar a austeridade e seguir políticas pró-crescimento, o que incluiria corte na taxa de juros.

André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, acredita que a taxa pode ser reduzida em outubro diante da desaceleração da inflação em 12 meses prevista para o primeiro trimestre, aumentando a taxa de juros real. A percepção de que a Selic está em seu limite e a situação expansionista da política monetária global também corroboram para a perspectiva de Perfeito.

“Apontamos com relevância adicional este último motivo. Está evidente que há hoje em dia um grau de coordenação maior entre os bancos centrais e isso impõe limites para a atuação até por aqui, e não vemos acaso na ‘mudança de tom’ do BC coincidir com outras medidas similares em outros Bancos Centrais”, explica Perfeito.

Em meio à mudança de aposta de alguns economistas, passando de estabilidade para corte de taxa de juros e alívio do cenário internacional, as taxas dos juros futuros recuaram no primeiro dia de reunião do Copom.

“O mercado está começando a migrar para o próximo passo do Copom. Há apostas de que haja cortes na Selic no próximo semestre e nos últimos dias os vencimentos mais longos estão queimando essa gordura e caindo. Não é meu cenário-base, mas há probabilidade de corte de juros no segundo semestre”, diz Bernard Gonin, analista macroeconômico e gestor de renda fixa da Rio Gestão de Recursos.

Neste contexto, a taxa de juros negociada na BM&F (Bolsa de Mercadorias e Futuros) com vencimento em janeiro de 2017 caiu de 14,18% na segunda-feira, para 14,02% ontem. O contrato do juro para janeiro de 2018 recuou de 14,57% para 14,30%.

 

Por Thais Folego e Weruska Goeking  em O Financista