Entrevista – Ainda há esperança na políticia

10/04/2016 10:25

Em Freakonomics, Booker diz ”Opinião – Ainda há esperança na política”. “As pessoas não podem esperar que a política do país mude a menos que as pessoas mudem antes”.

Nessa época turbulenta em que a política parece estar de cabeça para baixo, Cory Booker se mantém firme e forte. Durante mais de sete anos ele foi prefeito de Newark, Nova Jersey, uma das cidades mais pobres do país, e, segundo quase todos os pontos de vista, fez um excelente trabalho. Em 2013, Booker foi eleito senador dos EUA, onde é conhecido por seus esforços de união bipartidária e sua incansável defesa de uma reforma da justiça criminal. Ele também é visto como uma ótima escolha para o cargo de vice na chapa de Hillary Clinton.

Booker vem de uma família negra de classe média que vivia em Harrington Park, uma cidade predominantemente branca em Nova Jersey. Seus pais estavam entrem os primeiros executivos negros a trabalhar na IBM; seu pai no setor de vendas, sua mãe no de marketing. Atualmente, Booker, de 46 anos, é um dos dois afro-americanos no Senado.

Stephen Dubner conversou com ele enquanto o senador viajava para divulgar seu livro, “United: Finding Common Ground and Advancing the Common Good” (Unidos: Em busca de similaridades e do desenvolvimento do bem comum, em tradução livre), revelando um pouco mais sobre sua infância em Nova Jersey, as relações raciais nos Estados Unidos e os rumores de que pode concorrer à vice-presidência. A seguir, alguns trechos editados de nossa conversa.

Em “United”, você se refere aos seus pais como “mentores constantes, meus primeiros e melhores professores”. Seu livro são as memórias de alguém que foi criado em um lar extremamente amoroso e com a presença de seu pai e sua mãe. Até que ponto você acredita que isso foi determinante para seu sucesso?

Booker – Devo tudo que sou a isso e à comunidade onde cresci – onde me tornei um jogador de futebol americano de alto nível porque os homens e mulheres dessa pequena cidade de Nova Jersey trabalhavam o dia todo e ainda assim dedicavam tempo para nos treinar. Sem falar nas pessoas do meu bairro que me acolhiam e me alimentavam enquanto eu fazia a lição de casa, sempre que meus pais, ambos trabalhando em tempo integral, não podiam voltar para casa a tempo. Portanto, sob muitos aspectos sou aquilo que meu pai disse: o resultado de uma conspiração de amor. Ele me contou muitas vezes que negros e brancos, cristãos e judeus ajudaram a tirar minha família da pobreza. Não por meio de leis, discursos ou campanhas, mas porque americanos comuns se comprometeram aos ideias do nosso país e mostraram amor, gentileza e decência.

Mas, não posso deixar de lembrar que meus pais nunca hesitaram em me mostrar a miséria, a intolerância, a escuridão da vida americana e me contar as histórias dos desafios que ainda estavam diante de nós. Nunca quis maquiar ou diluir nossa história ou nosso presente. Ser um americano esperançoso não quer dizer que você precisa ignorar os desafios.

Não é impressionante que a questão racial nos EUA e em outros países ainda trate de brancos ou negros, ao invés de brancos e negros? O presidente Obama é filho de mãe branca e, no entanto, raramente é visto como meio branco. Como você enxerga o tema e a forma como costumamos falar de questões raciais.

Booker – Como seria ótimo poder dizer que não existem brancos e não existem negros. Que todos temos tons diferentes da mesma cor, que somos todos iguais. Mas vivemos em uma sociedade em que vivenciamos instituições muito diferentes dependendo da raça de cada um. Existem estudos fascinantes feitos em lugares como a Universidade de Harvard onde basta mudar a foto em um currículo para que a pessoa consiga um emprego. Não falar sobre raça nos Estados Unidos, não confrontar essas coisas, dizer que não se trata de um divisão entre brancos e negros, que é um problema americano, em que todos estão envolvidos por conta dos valores da nossa nação – destino comum, igualdade perante a lei –, para mim não passa de uma falácia.

Você apoia a nomeação de Hillary Clinton como candidata democrática à presidência dos EUA e tem feito campanhas ao seu lado. Seu nome também foi cotado como possível candidato a vice-presidente. Em uma escala de 1 a 10, qual é a chance de você aceitar uma oferta para concorrer como vice-presidente?

Booker – É bobagem gastar tempo com hipóteses como essa. Estamos envolvidos em uma luta e vou fazer o possível para ajudá-la a vencer e me concentrar nas verdadeiras urgências da minha vida, como ser um ótimo senador e aprovar leis em prol de melhorias na infraestrutura de Nova Jersey, além da reforma na justiça criminal.

Posso te dizer porque odeio política e talvez você me diga porque devo odiar um pouco menos? Me parece que a maioria das pessoas que se envolve com política tem grandes prioridades e quer fazer o máximo possível de coisas positivas. No entanto, a forma como o sistema funciona não privilegia a maioria desses políticos que, depois de eleitos, começam a defender mais interesses privados do que públicos. A política é menos podre do que imaginamos?

Booker – Você usou uma palavra muito forte: “odiar”. Muitas vezes digo que o cinismo é o refúgio dos covardes, que é um estado de espírito danoso que nos impede de ver possibilidades e esperança em meio a tantos problemas. Muitas vezes isso nos libera de ter qualquer engajamento. Permitimos que nossa incapacidade de fazer tudo mine nosso desejo de fazer alguma coisa para resolver o problema. Quando vejo ceticismo em relação à política, o que sempre digo é que as pessoas não podem esperar que a política do país mude a menos que as pessoas mudem antes.

Stephen J. Dubner é coautor, com Steven D. Levitt, de 'Freakonomics: O Lado Oculto e Inesperado de Tudo Que Nos Afeta' e 'Super Freakonomics: Resfriamento Global, Prostitutas Patriotas e Por que os Homens-Bomba Deveriam Fazer Seguro de Vida'.
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