14/04/2018 10:50
”Não teremos futuro se não formos capazes de aproveitar os cérebros das nossas crianças, de mantê-los aqui em plena atividade e de trazer de volta nossos cientistas que emigraram para outros países…”
Em 1995, nasceram 3,1 milhões de crianças no Brasil. Em 2017, 30 mil delas continuam analfabetas por não terem entrado ou terem abandonado a escola antes de aprender a ler. Cerca de 2,6 milhões concluíram o ensino fundamental. Apenas 2 milhões terminaram o ensino médio, e destas não mais do que 600 mil adquiriram conhecimento suficiente para enfrentar os desafios da sociedade do conhecimento onde viverão, falando línguas estrangeiras, dominando a matemática, informática, geografia, história, literatura, filosofia.
Pouco mais de 720 mil (49%) estão no ensino superior e, considerando a atual taxa de evasão/abandono nesse nível educacional, não chegará a 355 mil (11,5%) o número daquelas 3,1 milhões de crianças que, até o ano de 2022, concluirão a faculdade. As avaliações mostram que a qualificação profissional desses graduados deixa muito a desejar. O aumento do número de vagas não teve correspondência no crescimento do número e da qualidade do ensino médio.
Apenas 17 mil (0,55%), no máximo, farão cursos de pós-graduação e terão condições de se tornarem alguns dos raros cientistas de que o Brasil tanto carece. Desses nascidos em 1995, o Brasil não terá mil como cientistas de nível internacional. A perversidade dessa pirâmide é suficiente para mostrar o despreparo do Brasil para ingressar com eficiência no século XXI, no qual a economia global é baseada no conhecimento. Ainda pior: boa parte dos nossos raros talentos científicos está emigrando para países onde poderá desenvolver melhor suas atividades profissionais e terá melhores condições de vida para si e para suas famílias.
Entre o nascimento e a vida adulta, o Brasil afoga milhões de seus cérebros na infância e adolescência e está provocando a fuga dos poucos que conseguem avançar até o último nível do conhecimento formal e do exercício da atividade científica. A dificuldade criada por esses dois fatos, afogamento e fuga de cérebros, mostra uma sociedade imediatista nos propósitos e sem vocação para o desenvolvimento intelectual.
Os brasileiros se revoltariam se tomassem conhecimento de que nossos governos estão omissos diante da destruição de parte de nossas minas, deixando que países estrangeiros levem uma parte de nossos minérios. Entretanto, nenhuma indignação é manifestada e nada é feito para impedir essa outra realidade.
Assistimos passivamente ao afogamento e à fuga sem ao menos percebermos que estamos perdendo nosso ouro do século XXI: o conhecimento, a ciência, a tecnologia e a cultura que nossos cérebros poderiam criar. Permitimos que levem a verdadeira e permanente riqueza: a inteligência de nossas crianças que deixamos de desenvolver e o conhecimento acumulado por nossos doutores que vão para o exterior.
Não teremos futuro se não formos capazes de aproveitar os cérebros de todas as nossas crianças, de mantê-los aqui em plena atividade e de trazer de volta nossos cientistas que emigraram para outros países, dando-lhes todas as condições de trabalho.
Por Cristovam Buarque