Opinião – Nossos heróis serão demitidos?

25/06/2020 14:11

Artista fazem ato em homenagem às vítimas da covid-19 e aos profissionais de saúde que estão na linha de frente do combate à pandemia: ”Depois da pandemia, mais uma crise, agora no sistema de saúde”, afirma Brito

Notícias de ontem apresentaram números, divulgados pelo presidente do Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Laboratórios de São Paulo, Francisco Balestrin: o setor, em todo o país, está atravessando a pandemia com uma perda de receita de R$ 6 bilhões ao mês, basicamente pela queda em 60% das ocupações, em consequência do adiamento ou cancelamento de cirurgias eletivas, internações e tratamentos.

O mesmo sindicato aponta para uma provável consequência: a demissão em torno de 10% da atual força de trabalho. Ou seja: 350 mil pessoas.

Os números, assustadores, apontam para um dos tantos problemas que o Brasil enfrentará nos próximos meses. Desde muito, as vozes mais qualificadas do sistema de saúde, público e privado, alertam para problemas como o subfinanciamento do SUS; graves lacunas em sua gestão; uma distribuição equivocada de profissionais, equipamentos e instalações pelo país; um modelo superado de relação entre o setor público e privado; a fragilidade da estrutura jurídica e dos mecanismos de incentivo à inovação; a dependência brasileira em insumos e equipamentos estratégicos;  o terreno minado em que se transformaram as regras sobre planos de saúde;  a falta de prioridade para prevenção; os índices elevados de comorbidades em nossos adultos; a falta de planejamento para a administração das consequências do envelhecimento da população.

Os meses de pandemia tristemente confirmaram o acerto de cada uma destas advertências, transformando-as em tragédia com as mortes de milhares de brasileiros, muitas delas evitáveis. E no aplauso comovido da população ao heroísmo dos profissionais de saúde, obrigados a superar as fragilidades do sistema e os erros das autoridades.

Em semanas, esperemos, a pandemia perderá força, diminuirá sua presença no cotidiano. De novo vamos adiar a necessidade de repensar, discutir, atualizar, modificar o sistema de saúde?

Para os que pensam, com razão, em homenagens às vítimas e aos heróis da pandemia, fica a sugestão: não permitam que o Brasil silencie, passada a urgência, sobre o sistema de saúde.

Médicos, entidades de profissionais e de pacientes, empresas e instituições públicas honrarão os sacrifícios vividos nas últimas semanas se, ao menos, alguma coisa mudar até a próxima epidemia.

 

 

 

 

Por Antônio Britto Filho, 67 anos, é jornalista, executivo e político brasileiro. Foi deputado federal, ministro da Previdência Social e governador do Estado do Rio Grande do Sul.

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