12/01/2021 11:39
Proteção de dados deve ser cultural
Brasil tem muito o que melhorar
lvez daqui a alguns anos percamos de vista a relevância do ano de 2020 para a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados no Brasil. Apesar de já previsto na Lei 13.709, de 2018, esse evento foi uma verdadeira conquista, após diversas idas e vindas, atos normativos prevendo adiamentos, e muita incerteza. Ao final, a LGPD entrou em vigor efetivamente em 18 de setembro de 2020, tendo sida adiada a vigência das normas sancionadoras para agosto de 2021.
Outro fato importante foi a criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados. Depois de muita espera, finalmente em 6 de novembro foi publicado ato de nomeação dos Diretores da ANPD, incluindo seu diretor-presidente. A expectativa em torno dos trabalhos e produção da ANPD é muito elevada. Além disso, em decisão de 7 de maio de 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu o assento constitucional do direito fundamental à autodeterminação informativa e à proteção de dados pessoais.
Neste ano também foram dados os primeiros passos em direção a uma legislação de proteção de dados para fins de segurança pública e persecução criminal, com a finalização dos trabalhos de Comissão de Juristas da Câmara dos Deputados, propondo um projeto chamado de LGPD Penal.
Por todos esses fatores, o ano de 2020 foi decisivo para a demarcação normativa e jurisprudencial do direito à proteção de dados pessoais no País.
Esses eventos também significaram e sinalizaram transformações culturais no sentido de maior conscientização dos brasileiros sobre a relevância da proteção da privacidade e de dados pessoais, o que pode ser percebido pelas diversas manchetes de vazamentos de dados pessoais atrelados a grandes empresas, que ocuparam a consciência coletiva na esfera pública. Durante a crise sanitária, o tema foi bastante ventilado na imprensa e nas redes sociais, tendo em vista a preocupação com o uso de dados pessoais de saúde para desenvolvimento de políticas sanitárias e monitoramento da evolução da Covid-19.
No segundo semestre do ano, uma das notícias de maior impacto de vazamento de dados pessoais, e que também está atrelada à pandemia, diz respeito aos cerca de 16 milhões de brasileiros que tiveram diagnóstico suspeito ou confirmado de Covid-19, e que tiveram seus dados pessoais e médicos expostos na internet durante quase um mês por causa de um vazamento de senhas de sistemas do Ministério da Saúde.
Esse traço cultural também é observado nas iniciativas de conformação à nova legislação, tanto no setor privado, quanto no setor público, com a publicação de diversas portarias, resoluções e provimentos para adequação dos órgãos públicos aos mecanismos de governança e procedimentos exigidos pela Lei.
Tudo indica que 2021 será também um ano decisivo para a consolidação da proteção de dados pessoais no Brasil, tendo em vista o início dos trabalhos na LGPD e possíveis questionamentos sobre a constitucionalidade de legislações que possam conflitar com o direito fundamental à autodeterminação informativa. A corrida final das entidades públicas e privadas para se adequar à LGPD antes da entrada em vigor das normas sancionadoras abre também a perspectiva de um ambiente mais favorável no País à privacidade e à autonomia informativa dos cidadãos.
Juliana Abrusio é diretora do Instituto Legal Grounds for Privacy Design.
Juliano Maranhão é diretor do Instituto Legal Grounds for Privacy Design.
Ricardo Campos é Instituto Legal Grounds for Privacy Design.